segunda-feira, 13 de junho de 2011

Um Consenso Global Baseado em Evidências a respeito da Definição da Doença do Refluxo Esofágico na população Pediátrica (3)

12. Estudos populacionais em Pediatria sobre os sintomas de refluxo são insuficientes e são prioritários para futuras pesquisas.
Concordância: 100% (A+, 75%; A, 25%; Grau: não aplicável).


Uma série de estudos dá uma indicação da prevalência da DRGE na população pediátrica, mas várias metodologias e definições têm sido usadas. Usando um banco de dados de atenção primária do Reino Unido, a incidência estimada do RGE entre 2 e 19 anos de idade foi de 0,47 e 0,77 por 1000 pessoas-ano no sexo masculino e no feminino, respectivamente (37). Em outro estudo, uma revisão de prontuários realizada em serviços de atenção à saúde, primários e terciários, revelou uma incidência de RGE de 0,9 por 1000 pessoas-ano em lactentes e crianças menores de 5 anos de idade (38).

Um estudo nos Estados Unidos utilizando um questionário apropriado (11), envolvendo 1286 adolescentes, de 14 a 18 anos de idade, estudantes do ensino médio, revelou que pirose ocorreu diariamente ou algumas vezes por semana em 0,7 e 3,3%, respectivamente; regurgitação teve uma prevalência similar e disfagia ligeiramente inferior. No entanto, nenhum estudo englobou ainda uma amostragem da população pediátrica geral usando uma definição padronizada para a DRGE. Por conseguinte, estudos populacionais consistentes, levando em consideração as definições padrão da DRGE, são prioritários para futuras pesquisas clínicas.

CONDIÇÕES QUE PREDISPÕEM A DRGE GRAVE E CRÔNICA


13. O paciente pediátrico com alterações do sistema nervoso central tem risco aumentado para a DRGE.
Concordância: 100% (A+, 62,5%; A, 12,5%; A- 25%; Grau: alto).


14. Atresia esofágica está associada com risco aumentado para a DRGE.
Concordância: 100% (A+, 75%; A, 12,5%; A-, 12,5%; Grau: alto).

15. Fibrose cística está associada com risco aumentado para a DRGE.
Concordância: 100% (A+, 75%; A, 12,5%; A-, 12,5; Grau: Alto).


Determinados distúrbios subjacentes predispõem os pacientes pediátricos à DRGE mais grave e crônica, e suas complicações (Figura 2) (39-46).

Estas incluem alterações neurológicas importantes, tais como paralisia cerebral, doenças genéticas como a síndrome Cornelia de Lange e síndrome de Down; anomalias esofágicas congênitas, tais como, atresia esofágica corrigida ou hérnia diafragmática congênita e doenças pulmonares crônicas, tais como, a fibrose cística.

Por outro lado, crianças saudáveis e adultos com hérnia hiatal ou com uma forte história familiar da DRGE, esôfago de Barrett ou adenocarcinoma esofágico também têm uma maior prevalência da DRGE crônica com complicações (40,47,48). Embora os dados disponíveis na Pediatria sejam escassos, em adultos, obesidade e aumento de peso também estão associados com um significativo aumento na prevalência da DRGE grave, esôfago de Barret e adenocarcinoma do esôfago (49,50).

Figura 2- Condições predispondo pacientes pediátricos a DRGE grave e crônica

. Alterações neurológicas
. Anomalias congênitas esofágicas (por ex: atresia esofágica, hérnia diafragmática congênita)
. Fibrose cística
. Hérnia hiatal
. Obesidade
História familiar de DRGE grave ou de esôfago de Barret ou de adenocarcinoma esofágico

Síndromes sintomáticas da DRGE
Síndrome Típica de Refluxo



16. Pirose em crianças escolares é definida como uma sensação de queimação na região retroesternal.
Concordância: 100% (A+, 50%; A, 37,5%; A-, 12,5%; Grau: não aplicável).



17. Pirose em adolescentes é definida como uma sensação de queimação na região retroesternal.
Concordância: 100% (A+, 87,5%; A, 12,5%; A-, 12,5%; Grau: não aplicável).



Pirose é definida como a percepção de uma sensação desconfortável de queimação atrás do esterno que pode ser qualificada como dor (1).
Temas a respeito da confiabilidade dos relatos estão registrados nos comentários sob as afirmações de 3 a 6.


18. A síndrome típica do Refluxo é caracterizada por pirose com ou sem regurgitação.
Concordância: 100% (A+, 87,5%; A, 12,5%; A-, 12,5%; Grau: não aplicável).



19. Pirose e regurgitação em adolescentes e pré-adolescentes com desenvolvimento cognitivo suficiente para relatar seus sintomas de forma confiável são sintomas característicos da Síndrome Típica do Refluxo Gastroesofágico.
Concordância: 100% (A +, 62,5%; A, 37,5%. Grau: não aplicável).



Esta afirmação somente se aplica para crianças e adolescentes que são capazes de relatar de forma confiável seus sintomas. Os dados sugerindo que pirose e regurgitação são preditivos da DRGE são derivados de estudos realizados com adultos (1) e crianças (10, 51, 52).


20. Síndrome típica do Refluxo não pode ser diagnosticada em lactentes e em crianças que não tem desenvolvimento cognitivo para relatar sintomas de forma confiável.
Concordância: 75% (A+, 37,5%; A, 37,5%; A-, 12,5%; Grau: não aplicável).



Os problemas com relação à confiabilidade dos relatos de sintomas em crianças abaixo dos 8 anos de idade estão descritos no comentário da afirmação 1 e em outros locais deste documento.
Essa afirmação reflete aqueles pontos de vista anteriormente mencionados, porém, deve-se levar em consideração o amplo espectro da votação final registrada, que mostrou as diferenças de opinião dentro do próprio grupo, quanto à capacidade de se confiar na informação dos sintomas fornecidas por cuidadores de crianças menores de 8 anos de idade, as quais não possuem a capacidade de expressão verbal suficientemente confiável versus a necessidade de realização de testes invasivos para o diagnóstico da DRGE nessa faixa etária.

A confiabilidade (precisão, consistência interna, teste - reteste e concordância entre observadores) de cada item e da validade geral (tanto para o diagnóstico quanto avaliativos, para o rastreamento de alterações ao longo do tempo) com relação às informações prestadas pelos cuidadores, pode ser testada através da validação de questionários destinados a avaliar a DRGE. Considerando-se que, como anteriormente afirmado, a magnitude do conjunto dos sintomas pode ser empregada para definir o RGE, esses instrumentos têm sido desenvolvidos para investigar crianças (9,30); muito embora, deve-se levar em conta que em apenas um estudo um padrão-ouro objetivo foi utilizado para estabelecer a validade diagnóstica (12).

A validade diagnóstica dos questionários para os sintomas da DRGE continua a ser problemática devido à ausência de padrões-ouro objetivos que sejam genéricos para o diagnóstico da DRGE, em especial nas faixas etárias mais jovens. Na falta de um meio de validação diagnóstica universalmente reconhecido, estes instrumentos, no entanto, podem ser usados para uma quantificação confiável dos sintomas a partir da anamnese e do seguimento dos pacientes ao longo do tempo (8). Definitivamente, mais trabalhos nesta área-chave são necessários.


21. O RGE em crianças escolares e adolescentes é a causa mais comum de pirose.
Concordância: 87,5% (A+, 37,5%; A, 50%; D-, 12,5%; Grau: baixo).

22. Pirose em crianças escolares e adolescentes pode ter um número de causas não relacionadas ao refluxo. A prevalência destas é desconhecida.
Concordância: 100% (A+, 50%; A, 37,5%; A-, 12,5%; Grau: alto).



Existe uma evidência convincente de que o refluxo ácido é a causa mais comum de pirose em adultos (1). Refluxo fracamente ácido, refluxo não ácido, gás e refluxo duodeno-gástrico também podem ser causas de pirose em adultos e crianças (53,54). Outras causas de pirose em pacientes adultos e pediátricos incluem: esofagite eosinofílica, pirose funcional, infecções do esôfago e doença de Crohn (55-57).


23. Em adolescentes neurologicamente saudáveis a Síndrome Típica do Refluxo pode ser diagnosticada baseada nos sintomas característicos, sem a necessidade de testes diagnósticos adicionais.
Concordância: 87,5% (A+, 12,5%; A, 62,5%; A-, 12,5%; D-, 12,5; Grau: baixo).


A Síndrome Típica do Refluxo em adultos foi definida com base nos sintomas, isto é, testes diagnósticos adicionais não são necessariamente requeridos (1). Um diagnóstico baseado em sintomas da Síndrome Típica do Refluxo pode ser estabelecido em adolescentes e em crianças maiores de 8 anos de idade que tenham habilidades cognitivas para relatar os sintomas com confiabilidade.

24. A Doença do Refluxo não erosiva em pacientes pediátricos é definida pela presença de sintomas incômodos causados pelo refluxo do conteúdo gástrico e pela ausência de lesões da mucosa durante a avaliação endoscópica.
Concordância: 100% (A+, 12,5%; A, 75%; A-, 12,5%; Grau: não aplicável).



Sintomas associados ao refluxo não acompanhados por lesões da mucosa esofágica são denominados de DRNE (doença do refluxo não erosiva), em contraste com a DRE (doença do refluxo erosiva) (57, 58). A DRNE aparece em dois terços dos adultos com doença do refluxo (1). Adultos com a DRNE diferentemente daqueles com a DRE são predominantemente mulheres, com baixo índice de massa corporal, alta prevalência de transtornos gastrointestinais funcionais, hipersensibilidade ácida esofágica e baixa resposta aos inibidores da bomba de prótons (IBPs).

Adultos com a DRE apresentam mais frequentemente hérnia hiatal e maior exposição ácida e dismotilidade esofágica do que aqueles com a DRNE (55,57).

O diagnóstico da DRNE somente se aplica a adolescentes e crianças que tem habilidades cognitivas para relatar sintomas de forma confiável, isto é, aqueles com pelo menos 8 anos de idade. Portanto, existem poucos dados em Pediatria comparando a DRNE com a DRE com respeito a apresentação dos sintomas, prevalência, fisiopatologia e respostas à terapia (10, 52, 59). Várias alterações endoscópicas da mucosa esofágica são descritas em adultos com a DRNE usando a endoscopia de magnificação. Estas incluem: aumento da trama vascular, superfície mucosa com aparência de vilosidades (metaplasia intestinal), ilhas de epitélio escamoso abaixo da linha Z e estrias hiperemiadas (60). Existem poucos dados a respeito destes achados em crianças. O diagnóstico da DRNE não pode ser estabelecido ou descartado pela histologia (Vide também as afirmações 33 e 34, em relação à histologia).

25. Dor epigástrica em crianças escolares e adolescentes pode ser um sintoma maior da DRGE.
Concordância: 100% (A+, 75%; A-, 25%; Grau: moderado).



Em alguns estudos, os indivíduos puderam relatar dor epigástrica e dor abdominal (10, 15), mas estes termos não são nem sensíveis, nem específicos para o diagnóstico da DRGE. Mais estudos nesta área, particularmente em pacientes pediátricos com sintomas relacionados ao andar superior do abdome são necessários.


26. A DRGE em recém nascidos e lactentes pode estar associada a distúrbios do sono.
Concordância: 87,5% (A+, 25%; A, 25%; A-, 37,5%; D+, 12,5%; Grau: baixo).

27. A DRGE em crianças pré-escolares e escolares pode estar associada a distúrbios do sono.
Concordância: 100% (A+, 12,5%; A, 37,5%; A-, 50%; Grau: muito baixo).



28. A DRGE em adolescentes pode estar associada a distúrbios do sono.
Concordância: 100% (A+, 62,5%; A-, 37,5%; Grau: muito baixo).



Em estudo baseado em um questionário realizado com mais de 16.000 adultos em cinco países europeus, o refluxo noturno mostrou-se associado com obesidade (Índice de Massa Corporal > 30), sintomas de reatividade das vias aéreas e roncos (61). Em crianças são limitados os dados disponíveis para sustentar as relações entre a DRGE e os distúrbios do sono. Um relato de caso descreve laringoespasmo em uma menina de 8 anos de idade com asma que foi despertada durante o sono com distúrbios respiratórios e que mostrava queda do pH intraesofágico antes dos episódios de estridor (62). Otorrinolaringologistas consideram a DRGE como uma co-morbidade em crianças com Síndrome de Down que apresentam sintomas de obstrução das vias aéreas superiores, incluindo apnéia obstrutiva do sono (63). São necessários estudos adicionais a fim de confirmar esta relação de causa e efeito. Entre 50 crianças saudáveis com regurgitação ocasional, refluxo ácido no esôfago proximal mostrou-se fortemente associado com o despertar do sono, mas não está claro se o despertar levou a episódios de refluxo ou se o refluxo ácido foi o causador do despertar (64). Em crianças acima dos 36 meses de idade houve uma maior freqüência de despertar noturno entre 76 pacientes com pHmetrias anormais comparados com 3.102 controles (65). Em um estudo não controlado, o distúrbio do sono em 22 pacientes pareceu aumentar com o uso de agente pro-cinético (66). Em resumo, apesar de a DRGE estar associada a distúrbios do sono, a relação causa-efeito e o sentido de qualquer causalidade ainda precisam ser comprovadas.

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