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quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Doença Celíaca (3)


 Um problema de saúde pública universal (3)


Manifestações Clínicas

A DC pode afetar qualquer grupo etário e determinar uma multiplicidade de manifestações clínicas, isto é, apresenta um amplo espectro de sintomas que podem ser tanto digestivos quanto extra-digestivos, circunstância esta que provavelmente possa explicar um retardo no diagnóstico.

As formas de apresentação da DC são: 1) Clássica: neste caso predominam as manifestações digestivas e a consequente síndrome de má absorção; 2) Atípica ou Monossintomática: atualmente é a forma mais habitual de apresentação. Os sintomas digestivos são escassos ou ausentes com predomínio das manifestações extra-digestivas; 3) Silente ou Assintomática: os pacientes não costumam apresentar quaisquer sintomas, porém, apresentam sorologia positiva e atrofia vilositária na mucosa duodenal. Nesta circunstância, a DC é detectada em estudos populacionais, em familiares de pacientes portadores de DC, em indivíduos de alto risco para DC, ou ainda, naqueles pacientes que foram submetidos à endoscopia digestiva alta por motivos não relacionados à DC, mas que vieram a apresentar atrofia vilositária da mucosa duodenal (Figura 1).

Figura 1- Tipos clínicos propostos para apresentação da DC por Gasbarrini e cols. Dig Dis 2008; 26: 121-27.



A- Gastrointestinais


As manifestações clínicas da DC são extremamente variáveis e dependem muito da idade do paciente. A forma clássica de apresentação da DC nas crianças consiste no surgimento de sinais e sintomas do trato digestivo que se iniciam entre os 6 e 24 meses de vida, depois da introdução do glúten na dieta. Nos quadros típicos os lactentes e pré-escolares apresentam queixa de diarréia crônica, anorexia, distensão abdominal, dor abdominal, ganho ponderal insuficiente ou mais freqüentemente perda de peso, parada do ritmo de crescimento e vômitos (Figuras 2-3-4 & 5).


Figura 2- Paciente com DC no momento do diagnóstico.


Figura 3- Uma das nossas primeiras pacientes com DC. Notar o aspecto extremamente entristecido da menina, além do evidente agravo do estado nutricional.


Figura 4- Nossa paciente evidenciando nítida hipotrofia da musculatura da região glútea e das coxas.



Figura 5- Nossa paciente após alguns meses de dieta isenta de glúten evidenciando nítida recuperação clínica e nutricional.



Desnutrição grave, ou até mesmo caquexia (Figura 6), podem ocorrer nos casos em que o diagnóstico é muito retardado. Alterações do comportamento, em especial irritabilidade intensa, costumam também estar presentes.



Figura 6- Pacientes com DC por ocasião do diagnóstico em franco estado de caquexia.



A forma Clássica de apresentação passou a ser considerada como “a parte visível do iceberg da DC”, tamanho o grau de variabilidade das manifestações clínicas desta enfermidade, que pode ser desde Monossintomática ou mesmo apenas Assintomática (silente ou latente) (Figura 7).

Figura 7- O "iceberg" da DC, ou seja, a porção visível representaria apenas 1/3 dos casos, os 2/3 restantes estariam submersos.


É importante ressaltar que nas crianças maiores, escolares e adolescentes, as manifestações clínicas costumam ser mais sutis, o que pode ser um fator de retardo no diagnóstico. Os sintomas digestivos podem incluir dor abdominal, diarréia, e até mesmo constipação, flatulência e excessiva produção de gás. Cerca de 2 a 8% dos escolares e adolescentes geralmente apresentam baixa estatura e retardo constitucional da puberdade. Ter conhecimento da curva de crescimento pondero-estatural é uma informação da mais alta valia para se poder verificar se ocorreu parada do crescimento ou mesmo diminuição da velocidade do crescimento, a qual resulta em uma mudança para baixo no percentil da curva do crescimento.

Atualmente raramente os pacientes apresentam as manifestações daquilo que se convencionou denominar de “crise celíaca”, a qual era vista com mais freqüência em passado não muito remoto. A “crise celíaca” se caracteriza por diarréia aquosa explosiva, distensão abdominal importante, hipotensão, letargia e desidratação com grave associação de distúrbios eletrolíticos, em especial hipopotassemia. Este tipo de manifestação, de instalação aguda, coloca o paciente em alto risco de vida e tem sido responsável pela causa direta de morte desta enfermidade.



B- Manifestações Extra-intestinais



Muitos pacientes recentemente diagnosticados com DC podem inicialmente se apresentar com sintomas não digestivos.

Há fortes evidências que a Dermatite Herpetiforme representa a manifestação dermatológica da DC (Figura 8), posto que a maioria destes pacientes também apresenta concomitantemente alterações morfológicas da mucosa intestinal compatíveis com a DC, mesmo na ausência de manifestações gastrointestinais. Tanto as lesões de pele quanto a morfologia da mucosa intestinal são reversíveis com a utilização de uma dieta isenta de glúten.


Figura 8



Defeito do Esmalte Dentário envolvendo a dentição definitiva tem sido descrito em cerca de 20% a 70% das crianças com DC, podendo mesmo ser a primeira manifestação da enfermidade (Figura 9); portanto, nestes casos, a suspeita diagnóstica de DC deve ser primariamente levantada pelo dentista.


Figura 9



Artrite envolvendo o esqueleto axial e periférico tem sido relatada em até 25% dos casos de DC; a artrite tem sido descrita como aguda e não erosiva que geralmente cede com a introdução de uma dieta isenta de glúten.

Osteoporose e diminuição da densidade mineral óssea têm sido relatadas em pacientes com DC não tratada, as quais se revertem com o uso de dieta isenta de glúten.

Baixa estatura pode ser uma das formas de apresentação da DC, tendo sido identificada em 8% a 10% dos pacientes.

Anemia por deficiência de ferro, refratária ao tratamento por via oral, é a causa mais freqüente de manifestação não digestiva da DC; cerca de 8% a 11% das causas inexplicadas de anemia ferropriva associadas ou não a deficiência de ácido fólico se devem a DC.

Afecções neurológicas e psiquiátricas incluindo depressão, ansiedade, irritabilidade, neuropatia periférica, ataxia cerebelar, enxaqueca e epilepsia devido a calcificações intracranianas (Figura 10) têm sido descritas em associação à DC.


Figura 10



Na Tabela 1, abaixo, estão discriminadas as principais manifestações extra-intestinais da DC



A) Manifestações que apresentam grande ou moderada evidência de DC


Dermatite herpetiforme

Hipoplasia do esmalte dentário (dentição definitiva)

Osteopenia/Osteoporose

Baixa estatura

Puberdade ratardada

Anemia ferropriva refratária a tratamento oral com ferro



B) Manifestações que apresentam evidência menos intensa

Hepatite

Artrite

Epilepsia com calcificações occipitais





Na Tabela 2, abaixo, estão discriminadas associações que apresentam prevalência aumentada com DC

Diabete tipo 1

Tireoidite autoimune

Síndrome de Down

Síndrome de Turner

Síndrome de Williams

Deficiência seletiva de IgA

Parentesco de primeiro grau

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Colte Alérgica: Manifestações Clínicas, Diagnóstico e Tratamento (4)

Manifestações Clínicas

A manifestação clínica mais intensa e exuberante é a diarréia sanguinolenta associada a cólicas, as quais estão presentes em cêrca de 90% dos pacientes. Geralmente os sintomas apresentam-se de início insidioso instalando-se na imensa maioria dos casos nos primeiros 6 meses de vida, mais particularmente ainda nos primeiros 3 meses. O sangue costuma ser "vivo" misturado às fezes, e, em algumas circunstâncias pode haver apenas sangramento retal em decorrência do processo inflamatório que afeta a mucosa colônica, tratando-se, portanto, de uma lesão interna. O sangramento costuma ser intermitente e de escassa quantidade; somente em raras situações pode haver perda importante de sangue, acarretando anemia aguda. É importante fazer a diferenciação diagnóstica com o sangramento da fissura anal, pois nesta condição, em geral, trata-se de sangue rutilante "em fio de linha" que recobre as fezes, posto que a fissura é uma lesão anal externa.

Em alguns casos, especialmente quando o lactente está recebendo aleitamento natural o sangramento pode não ser visível a "olho nú", e isto é o que se denomina sagramento "oculto", o qual é detectado através de método imunoenzimático em fezes recém eliminadas.

Regurgitação e vômitos também podem estar presentes com frequência muito variável entre 20 e 100% dos pacientes, o que pode ser um fator de interpretação equivocada da Doença do Refluxo Gastroesofágico. A maioria dos pacientes apresenta uma constelação de sintomas adicionais que inclui inquietação e irritabilidade, particularmente logo após o início da mamada, o que pode levar a uma interpretação equivocada de cólica do lactente, entretanto, o estudo anátomo-patológico da mucosa retal revela aspectos claramente inflamatórios com acentuada infiltração eosinofílica, que é característica da proctocolite alérgica.

Na maioria das vezes não há uma clara percepção do agravo do crescimento pondero-estatural, porém, ao se instituir o tratamento correto nota-se nitidamente a ocorrência de uma rápida recuperação nutricional, com ganho pondero-estatural acelerado (Figuras 1 e 2).

Figura 1- Paciente no momento do diagnóstico da Colite Alérgica.


Figura 2- Paciente após a recuperação clínica e nutricional.
Diagnóstico

A suspeita diagnóstica se baseia no quadro clínico acima descrito, sendo necessário afastar as outras causas de Colite anteriormente referidas. Particularmente, na faixa etária dos lactentes menores de 6 meses, a maior preocupação é eliminar a possibilidade de infecção por um dos microorganismos invasores da mucosa colônica, o que pode ser constatado em primeiro lugar pelo aspecto clínico do paciente, posto que este não deve apresentar sinais de toxemia, prostração e febre, e definitivamente descartado pelo resultado da cultura de fezes que deve ser negativo para crescimento de bactérias enteropatogênicas invasoras.

Até pouco tempo atrás não havia um consenso internacional quanto a utilização de parâmetros clínicos objetivos para se estabelecer o diagnóstico definitivo da Colite Alérgica, fato este que trazia grandes controvérsias diagnósticas. Além disso, está bem definido que os testes cutâneos e/ou sorológicos não são aplicáveis nesta afecção, pois como se sabe estes testes tem validade diagnóstica quando está presente o mecanismo imunológico da hipersensibilidade imediata (mediada pela Ig E) o que não é o que se verifica quando se trata de Colite Alérgica. Aqui entra em jogo o mecanismo imunológico da reação antígeno-anticorpo em excesso de antígeno com fixação de complemento (conhecido como fenômeno de Arthus) resultando em uma vasculite, daí o sangramento quase sempre visível.

Na intenção de contornar esta dificuldade diagnóstica John Walker-Smith, pesquisador inglês de prestigio indiscutível, fez uma profunda revisão sobre o tema e propos, em 1995, os seguintes critérios para o diagnóstico de Colite Alérgica: 1- Clínica: presença de sangramento retal e cólicas em lactente sem agravo nutricional de maior intensidade; 2- Laboratorial: exclusão de causas infecciosas de colite; 3- Procedimento: endoscopia e/ou biópsia retal com características típicas de colite; 4- Prova terapêutica: desaparecimento dos sintomas após a eliminação do suposto alergeno da dieta do lactente ou da dieta da mãe (no caso de aleitamento natural); 5: Desencadeamento: não é necessário antes dos 9 a 12 meses de idade; 6- Procedimento: realização ou não de nova biópsia retal para caracterizar regressão das lesões na dependência do critério do médico assistente.

À colonoscopia a mucosa colônica encontra-se hiperemiada, friável com sangramento espontâneo à passagem do colonoscópio, podendo-se também observar pequenas ulcerações na mucosa (Figuras 3 e 4).


Figura 3- Visualização endoscópica das mucosas colônica e ileal evidenciando ulcerações macroscópicas, sangramento espontâneo e ingurgitamento vascular.


Figura 4- Imagem endoscópica da Colite Alérgica evidenciando ulcerações macroscópicas e grande fragilidade da mucosa com sangramento espontâneo.

À microscopia óptica observa-se solução de continuidade do epitélio colônico, intenso aumento do infiltrado linfo-plansmocitário e eosinofilico na lâmina própria, diminuição do conteúdo de muco das glândulas crípticas e inclusive até mesmo a existência de abscesso críptico (presença de polimorfonucleares no interior da glândula críptica) (Figuras 5 e 6).


Figura 5- Microfotografia de material de biópsia retal evidenciando lesões histopatológicas características de Colite: solução de continuidade do epitélio colônico, aumento acentuado do infiltrado linfo-plasmocitário na lâmina própria, com presença aumentada de eosinófilos, glândulas crípticas com diminuição de células produtoras de muco, e presença de abscesso críptico com infiltrado de neutrófilos.


Figura 6- Colite eosinofílica: eosinófilos infiltrando o epitélio e na lâmina própria da mucosa retal.

Após a cura há completa regeneração da mucosa colônica (Figura 7).


Figura 7- Material de biópsia do reto de paciente portador de Colite Alérgica em fase de recuperação; houve regeneração do epitélio, infiltrado linfo-plasmocitário na lâmina própria discreto e presença normal de muco nas glândulas crípticas.

No próximo encontro iremos mostrar nossa experiência a respeito da Colite Alérgica.