Milena R. Macitelli & Ulysses Fagundes Neto
Doença
inflamatória intestinal
A Doença de Crohn é a causa mais frequente de doença granulomatosa no estômago.
Apesar do envolvimento gastroduodenal ser comum, raramente a doença é limitada
ao estômago e normalmente acomete porções mais distais do intestino.
Anormalidades macroscópicas e/ou histológicas estão presentes no esôfago,
estômago ou duodeno em até 80% das crianças com Doença de Crohn.
Gastrite Eosinofílica
Gastrite eosinofílica (GE) faz parte do conjunto das doenças eosinofílicas
gastrointestinais, tais como, esofagite eosinofílica, gastroenteropatia
eosinofílica e proctocolite eosinofílica. O diagnóstico pode ser quando na
presença de sintomas associados a infiltrado eosinofílico proeminente e
exclusão de outras causas do infiltrado.
Alguns pacientes têm histórico de asma, sensibilidade a alimentos, eczema,
alergias sazonais e atopia. Geralmente são secundárias a reações mistas IgE e
não-IgE mediadas com aumento de IL-5, IL-3 e fator estimulador de colônia de
granulócitos (todas citocinas proinflamatórias). A eosinofilia usualmente está
presente na mucosa, mas pode ser também mais profunda atingindo a muscular da
mucosa e até mesmo a camada serosa.
Os sintomas da GE dependem da gravidade e extensão do envolvimento. Em
lactentes e crianças pré-escolares as manifestações clínicas podem ser de failure
to thrive associada à recusa alimentar. Além disto, anemia devido a
sangramento oculto e hipoalbuminemia ocorrem com frequência.
No caso de haver envolvimento apenas da mucosa os sintomas são semelhantes a
outros tipos de gastrite, porém, em alguns casos podem ocorrer manifestações de
obstrução gástrica. Por outro lado, quando muscular da mucosa e/ou a camada
serosa estão envolvidas, dores abdominais e ascite podem estar presentes.
GE geralmente está associada a alérgeno específico e na infância os antígenos
mais comuns: proteína do leite de vaca, soja, ovo e trigo. A relação temporal
entre a ingestão de certo alimento e o surgimento dos sintomas característicos,
é fundamental para estabelecer o diagnóstico. Na imensa maioria dos casos o
aparecimento de irritabilidade, dor abdominal e vômitos ocorre após 1 a 2 horas
da ingestão do alimento agressor.
Deve-se levar em consideração que outras entidades tais como, Doença de Crohn,
infestação parasitária e infecções agudas/crônicas (ex: H. pylori)
podem estar acompanhadas de eosinofilia na mucosa, porém geralmente o
infiltrado é bem mais discreto do que o observado nas doenças alérgicas
(doenças eosinofílicas).
Achados endoscópicos
Quando presentes não são específicos, no entanto, os achados mais frequentes
são: friabilidade e eritema da mucosa, erosões, pregueado mucoso espesso e
lesões nodulares da mucosa ou pseudopólipos (especialmente no antro).
A mucosa, em alguns casos, pode apresentar-se macroscopicamente normal.
Figura 11- Esofagogastroduodenoscopia revelando gastrite antral difusa, com
múltiplas áreas focais de erosão da mucosa.
Figura 12- Fitas de eosinófilos, coradas de vermelho intenso, podem ser vistas
infiltrando a lâmina própria e a muscular da mucosa.
Achados histológicos
O achado mais significativo é o infiltrado eosinofilico na lâmina própria.
Ocasionalmente linfócitos, células plasmáticas e neutrófilos podem estar
presentes.
Figura 13- Biópsia antral revelando intensa infiltração eosinofílica na lâmina
própria.
Figura 14- Infiltrado eosinofílico permeando as glândulas gástricas, porém não
invadindo o lúmen das mesmas.
Tratamento
O pilar do tratamento da gastrite eosinofílica deve se basear na exclusão dos
possíveis alérgenos. Há um consenso internacional que advoga o uso de uma dieta
de eliminação dos 6 principais alérgenos, a saber: leite e derivados, soja,
trigo, ovo, peixe e frutos do mar, frutos secos (nozes, cacau, castanhas,
avelã, amendoim etc.) e eu também incluo o coco.
Nos casos mais graves deve-se usar inicialmente corticosteroides sistêmicos, e
também antagonistas de receptor de leucotrieno (Montelucaste).
É difícil a aplicação de esteroide tópico na mucosa gástrica, e da mesma forma,
preparações com Cromoglicato são dificilmente eficazes.
Estudo confirmou que na população dos EUA, a quantificação de eosinófilos
gástricos deve ser <38 a="" caso="" da="" eosin="" eosinofilica="" filos="" foi="" gastrite="" mm2.="" no="" o="" quantifica="">127 eosinófilos/mm2 ou 30 eosinófilos/CGA.38>
Gastrite induzida por anti-inflamatórios não esteroides (AINEs)
É do conhecimento geral que os anti-inflamatórios são as drogas mais prescritas
em todo o mundo. Apesar de serem indicadas como primeiro tratamento de diversas
doenças, seu uso deve ser limitado em virtude dos efeitos adversos sobre o TGI.
As drogas anti-inflamatórias podem resultar em danos à mucosa, podendo até
mesmo causar processos ulcerosos.
A ação tópica dos AINEs causa hemorragia aguda e erosão 15 a 30 minutos após a
ingestão, primeiramente no antro. Vale referir que as lesões precoces são
geralmente assintomáticas e não tem significância clínica.
A presença sistêmica dos AINEs compromete a integridade da mucosa e pode
ocasionar ulceração grave da mucosa. Em crianças menores, a ulceração da
incisura gástrica, associada a sangramento gastrointestinal alto é uma típica
da lesão provocada por AINEs. O sangramento pode ocorrer após apenas 1 ou 2
doses da medicação ou com uso crônico.
Os seguintes achados histológicos se destacam: hiperplasia epitelial, depleção
de mucina, núcleos alargados, ectasia vascular e edema.
Figura 15- Lesão gástrica provocada por uso continuado de AINES.
Gastrite por Citomegalovirus (CMV)
A infecção por CMV ocorre com maior frequência em indivíduos
imunocomprometidos, como por exemplo: AIDS, transplante de órgão sólido ou
medula óssea. Nas crianças imunocompetentes, a infecção por CMV normalmente
está associada a Doença de Menetrier. A infecção tende a ocorrer no fundo e
corpo gástrico, acarretando espessamento da parede, ulceração, hemorragia e
perfuração.
Os principais achados histológicos são: inflamação aguda e crônica com edema,
necrose e inclusão citomegálica em células endoteliais e epiteliais, bem como
nas bases das úlceras e na mucosa adjacente as úlceras. O CMV usualmente afeta
as porções mais profundas da mucosa e a inflamação ativa pode ser focal ou
panmucosal.
O diagnóstico torna-se mais eficaz quando se faz cultura do vírus no material
da biópsia da mucosa. A detecção do vírus também pode ser realizada pela
técnica da imunohistoquímica.
O tratamento com Ganciclovir pode ser eficaz em pacientes imunossuprimidos,
porém a recorrência ocorre com frequência em 1 a 2 meses.
Doença granulomatosa crônica
Trata-se de uma deficiência imunológica rara que ocorre com maior frequência em meninos, acarretando o envolvimento granulomatoso da
parede gástrica.
A enfermidade pode cursar com sintomas gastrointestinais altos, bem como lesões
aftosas orais podem ocorrer, o que obriga a um diagnóstico diferencial de
Doença de Crohn. Em alguns casos pode surgir gastroenterite grave.
Não há achados endoscópicos típicos, geralmente a mucosa antral esta pálida e
espessada. A histologia pode revelar inflamação focal, crônica ativa do antro
com granulomas ou células gigantes multinucleares.
Outras gastrites granulomatosas raramente são processos primários. Geralmente
são decorrentes de alguma patologia de base, tais como: infecções, corpo
estranho, doenças imuno-mediadas, carcinoma, linfomas e infecção por H.
pylori.
Na maioria dos casos a aparência morfológica do granuloma não fornece claras
evidencias da causa. Em países desenvolvidos, a gastrite granulomatosa, com
exceção da secundária a Doença de Crohn, é rara. O diagnóstico diferencial
inclui tuberculose, histiocitose, reação a corpo estranho, dentre outras
doenças.
Gastrite granulomatosa idiopática isolada é uma reação crônica granulomatosa
limitada ao estômago, uma condição rara e deve ser diagnóstico de exclusão.
Quadro 3- Principais causas de gastrite granulomatosa
Gastrite de Henoch-Schönlein
A púrpura de Henoch-Schönlein também conhecida como púrpura anafilactóide ou
púrpura reumática, é a vasculite mais frequente em crianças e adolescentes.
Trata-se de uma doença multisistêmica que pode acometer vasos de pequeno e
médio calibres. Pode ocorrer em qualquer idade, entretanto, o pico de
incidência situa-se entre 4 e 6 anos.
A enfermidade pode envolver a pele, o trato gastrointestinal, rins e
articulações.
Os principais sintomas gastrointestinais são: cólica periumbilical, dor
epigástrica, náusea, vômitos e sangramento digestivo. Mais raramente pode
ocorrer hematoma intramural, intussuscepção, infarto intestinal, perfuração
intestinal, pancreatite, apendicite e colecistite.
Os achados endoscópicos mais característicos no estômago são: mucosa com
eritema ou hemorragia, edema de mucosa com erosões ou úlceras. Biópsias da
mucosa gástrica geralmente são muito superficiais para poder demonstrar as
alterações histológicas típicas, porém, pode ser vista vasculite semelhante à
da pele.
Gastrite induzida por exercício
Trata-se de entidade bem conhecida em atletas corredores de longas distâncias e
em geral cursa com anemia com ou sem sintomas gastrointestinais.
Os sintomas costumam ocorrem após o exercício físico e se manifestam por cólica
abdominal, dor epigástrica, náusea, refluxo gastresofágico e vômitos.
A lesão mucosa apresenta-se igualmente no antro, corpo e fundo gástrico.
Conclusão
Gastrite trata-se de uma denominação genérica envolvendo uma lesão da mucosa
gástrica decorrente de inúmeras etiologias. A endoscopia digestiva alta
associada à biópsia gástrica representa uma ferramenta de fundamental
importância para a investigação diagnóstica etiológica. O esclarecimento
diagnóstico de certeza torna-se extremamente importante para que se possa
propor o tratamento específico e adequado.