terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Minha História de vida e minha História vivida na EPM/UNIFESP (40)

A consolidação da tradição em Pesquisa: Expandindo as fronteiras do “Tratado de Tordesilhas” da ciência (parte 1)

1- A associação Clínica, Microbiologia e Biologia Celular:  uma feliz proposta de trabalho que resultou em vultosa produção do conhecimento de alta qualidade

Já no ano seguinte de haver retornar de Buenos Aires, aonde havia realizado minha especialização em 1973, estabeleci um estreito vínculo com a Disciplina de Microbiologia chefiada pelo Prof. Luiz Rachid Trabulsi. Prof. Trabulsi era um pesquisador de grande prestigio, internacionalmente reconhecido como uma das maiores autoridades mundiais no campo das enterobactérias, em especial no que dizia respeito às cepas enteropatogênicas de Escherichia coli. Este agente enteropatogênico conhecido sob a designação abreviada de EPEC era um dos mais importantes agentes causadores de diarreia aguda em lactentes provenientes de famílias de baixa renda, especialmente dentro do primeiro ano de vida, e também em unidades neonatais devido ao alto grau de contaminação cruzada transmitida pelas mãos dos profissionais de saúde, ao manusearem os recém-nascidos, decorrente da higienização inadequada. As cepas de EPEC eram altamente virulentas, causavam persistência da diarreia associada a intolerâncias alimentares e altas taxas de mortalidade. Este era o panorama mais frequentemente vivenciado em nossas enfermarias de Pediatria naqueles anos e representavam um enorme desafio a ser enfrentado para o manejo exitoso desses casos. Em virtude dos interesses comuns que ambas as áreas do conhecimento encerravam, da minha parte a atuação como clínico e a do Prof. Trabulsi, a Microbiologia, nos levaram à produção de um ciclo virtuoso. De fato, esta associação foi se tornando cada vez mais intensa e resultou na criação do “Clube da Flora”, em fevereiro de 1975. A finalidade primordial deste relacionamento foi a de estabelecer uma colaboração recíproca entre os docentes de ambas as Disciplinas, com o objetivo precípuo de discutir e aprofundar os conhecimentos sobre os agentes enteropatogênicos e suas repercussões fisiopatológicas sobre o hospedeiro. No período compreendido entre 1977 e 1994 foram publicados 17 trabalhos em revistas indexadas, fruto desta profícua associação. A materialização desta comunhão de esforços está definitivamente selada nos inúmeros trabalhos de investigação, publicados nos mais importantes periódicos de pesquisa nacionais e internacionais, tais como: Jornal de Pediatria, Revista Paulista de Pediatria, Revista Paulista de Medicina, Arquivos de Gastroenterologia, Brazilian Journal of Medicine and Biology Research, Revista do Instituo de Medicina Tropical de São Paulo, entre as nacionais; Malnutrition in Chronic Infantile Diarrhea, Bacterial Diarrheal Diseases, Revista Médica do Chile e Infection and Immunity, entre as internacionais. Além disso, há também que se considerar as várias teses de Mestrado e Doutorado resultantes este trabalho associativo, a saber: Tânia Viaro, Lenora Gandolfi Schimitz, Marly de Almeida Pedra, Aristides Schier Cruz, Arelis Lleras e Eriberto Fernandez Jaramillo, teses de Mestrado; Fernando Fernandes, Maria Ceci do Vale Martins e Lenora Gandolfi Schimitz, teses de Doutorado. Concomitantemente aos ganhos científicos oriundos destes novos conhecimentos adquiridos, pudemos acima de tudo, pois era essa a meta primordial, oferecer os melhores cuidados assistenciais aos nossos pacientes, que ficaram comprovados pela drástica diminuição das taxas de mortalidade e também pelo menor tempo de duração da enfermidade (Figura 1).


Figura 1- Da esquerda para a direita Eriberto Fernandez, Prof. Trabulsi e eu em Valdivia, Chile, em 1992, durante um Simpósio sobre Agentes Enteropatogênicos.

Infelizmente, em um dado momento ocorreu a aposentadoria do Prof. Trabulsi, e aí pareceria que a colaboração com a Disciplina de Microbiologia estaria sob o risco de findar. Entretanto, para minha alegria, não foi o que ocorreu, aliás, não somente não findou como inclusive se aprofundou, e, além disso, agregou-se mais uma colaboração de inestimável valor, pois envolveu também o setor da Microscopia Eletrônica. Foi a partir de 1994 que entraram nesta estória duas profissionais extremamente competentes e profundamente comprometidas com a produção do conhecimento. Tratam-se das Professoras Isabel Scaletsky e Edna Haapalainen, a primeira Microbiologista, discípula do Prof. Trabulsi, e a segunda expert em Biologia Celular. A partir desta nova composição eu pude voltar a exercer meus conhecimentos de biologia celular que estavam inativados desde que eu havia assumido a chefia do Serviço de Pediatria do Hospital Umberto Primo, por absoluta falta de tempo. Esta associação tornou-se ainda mais profícua que a anterior, posto que passamos a utilizar conjuntamente os recursos da investigação clínica, da microbiologia e da biologia celular. Passamos a trabalhar de forma integrada em busca de desvendar as interações dos agentes enteropatogênicos isolados dos nossos pacientes com diarreia aguda e persistente, especialmente as diferentes cepas enteropatogênicas de Escherichia coli com seus respectivos mecanismos fisiopatológicos de ação sobre o hospedeiro. Este empenho associativo gerou, no período compreendido entre 1995 e 2011, 35 trabalhos de alto valor de impacto, que resultou em publicações científicas nos mais prestigiosos periódicos da área, nacionais e internacionais, tais como: Revista da Associação Médica Brasileira, Arquivos de Gastroenterologia, Revista Paulista de Pediatria, Brazilian Journal of Medical and Biological Research, Brazilian Journal of Microbiology, entre as nacionais; Acta Paediatrica, Infection and Immunity, Journal of the American College of Nutrition, Journal of Clinical Microbiology, Lancet, Pediatrika,  Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition, Emerging Infectious Diseases, The Journal of Infectious Diseases, FEMS Microbiology Letters, entre as internacionais. Além disso, estas pesquisas também propiciaram a realização de teses de Mestrado e Doutorado de alunas de pós-graduação, sob minha orientação, a saber: Jacy Alves Braga, Jairo Cesar dos Reis, Cleide de Holanda Fernandes, Célia Regina Moreira, Sandra Martini Costa, Carlos Alberto Garcia Oliva, Jacira Omena Torres de Oliveira, teses de Mestrado; Cláudia Regina Nunes, Jairo Cesar dos Reis, Jacy Alves Braga, Célia Regina Moreira e Carlos Alberto Garcia Oliva, teses de Doutorado.

Ainda em colaboração com a Profa. Scaletsky, tivemos a oportunidade de desenvolver um extenso trabalho de campo para a pesquisa de agentes enteropatogênicos nas comunidades indígenas da etnia Guarani que habitam ao longo de todo nosso litoral de norte a sul, desde Angra dos Reis até a ilha do Cardoso, durante todo o ano 1996 (Figuras 2-3).


Figura 2- Profa. Isabel Scaletsky com o material de investigação no porta malas do meu carro, no início da nossa jornada no alto da serra de Angra dos Reis.


Figura 3- Vista do alto da serra do Mar na região de Angra dos Reis.

As aldeias dos Guaranis localizam-se em áreas de preservação ambiental, a maioria delas encontra-se no sopé da serra do Mar, aonde as reservas indígenas foram edificadas, totalmente cercadas pela imponência deste magnífico maciço da natureza, que proporciona um esplendoroso espetáculo representado pela exuberância da flora da Mata Atlântica, e com uma visão privilegiada da costa litorânea (Figuras 4-5-6-7-8-9).


Figura 4- Profa. Isabel ao adentrar a reserva indígena, área de preservação ambiental.


Figura 5- Vista desde a aldeia indígena de Angra dos Reis.


Figura 6- Um pouco da vegetação típica da Mata Atlântica.


Figura 7- Uma casa indígena e atrás a exuberância da Mata Atlântica.


Figura 8- Encontro com habitantes da aldeia de Angra dos Reis na sala de aula, aonde são ensinados português e guarani.

Vista das outras aldeias da etnia Guarani existentes ao longo do nosso litoral por nós visitadas, em Ubatuba, Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe (Figuras 9-10-11-12-13-14).  

Figura 9

Figura 10


Figuras 11 (A e B)

Figura 12
 
Figura 13

Figura 14


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