quarta-feira, 3 de julho de 2013

Fibrose Cística do Pâncreas: a abordagem para o século XXI (1)



Introdução

Em 2011, o Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition publicou a íntegra de um simpósio realizado em Minneapolis, Minnesota intituladoA 21st-Century approach to cystic fibrosis: optimizing outcomes across the disease spectrum, organizado por Joel R. Rosh, Arthur B. Atlas, Willian F. Balistreri, David C. Whitcomb e Julie Messick, renomados experts neste campo do conhecimento, para discutir aspectos de relevância para os profissionais que dão assistência à saúde a pacientes portadores de Fibrose Cística (FC). Foram abordados os aspectos de maior importância quanto ao diagnóstico da FC, as complicações hepatobiliares, suas consequências e o manejo da enfermidade pancreática. A seguir, passo a transcrever os tópicos de maior interesse médico-científico discutidos no referido simpósio.



Visão geral da Fibrose Cística

A FC é a doença genética potencialmente fatal mais frequente nos caucasianos, e afeta aproximadamente 30 mil indivíduos nos Estados Unidos. A FC é uma enfermidade autossômica recessiva causada por mutações em um gene do cromossoma 7. Este gene, que foi identificado pela primeira vez em 1989, codifica a proteína reguladora transmembranosa FC (CFTR) a qual funciona como um canal de monofosfato de adenosina cíclico (cAMP)-cloro. A CFTR está localizada na membrana apical das células epiteliais secretoras e absortivas pertencentes às vias respiratórias, pâncreas, fígado, intestino, glândulas sudoríparas e vasos deferentes. Alguma lesão neste gene encontra-se presente em praticamente todos os indivíduos que apresentam a síndrome clínica da FC. A mutação mais comum, é a delta 508, e está presente em mais de dois terços dos cromossomas da FC nos indivíduos, universalmente (Imagem 1).



Atualmente, foram descritas mais de 1.600 mutações do gene CFTR. Estas mutações foram organizadas em 6 classes de acordo com a disfunção das mutações do CFTR, na tentativa de auxiliar a relação entre o genótipo e o fenótipo. Entretanto, em virtude do grande número de mutações torna-se extremamente difícil predizer os efeitos do genótipo FC sobre a expressão clínica da doença. As mutações Classe I são caracterizadas por um defeito da síntese protéica, enquanto que as mutações das Classes II e III estão relacionadas com defeitos no tráfego e no processamento da proteína, respectivamente. As mutações Classe IV resultam em condutância anormal e as mutações Classe V estão associadas com uma divisão anormal do mRNA, e consequentemente acarretando uma capacidade menor de funcionamento normal do CFTR na superfície apical. Mutações Classe VI produzem uma proteína funcional que é instável na superfície da membrana apical. Enfermidade mais grave pode ser antecipada quando ocorrem as mutações Classes I, II, III e VI, as quais provocam pouco ou nenhum funcionamento da CFTR na membrana apical. Enfermidade de moderada intensidade pode estar associada com as mutações Classes IV e V posto que alguma função da CFTR permanece em atividade (Figura 1).

As manifestações clínicas da FC surgem em virtude da disfunção dos sistemas de órgãos que expressam a CFTR, posto que o transporte iônico defeituoso acarreta um entupimento dos ductos e outras estruturas, usualmente devido à presença de secreções muito espessas e muco pegajoso (Figura 2).

A doença pulmonar permanece como a primeira causa de morbidade e mortalidade nos pacientes com FC e está caracterizada por ciclos progressivos de infecção e inflamação com evolução para falência respiratória (Figura 3).


A ausência do funcionamento normal da CFTR (a qual é abundantemente expressa no epitélio intestinal), pode acarretar o desenvolvimento de obstrução intestinal, insuficiência pancreática e doença hepática. Cerca de até 20% dos recém-nascidos com FC apresentam íleo meconial e aproximadamente 85% deles sofrem de insuficiência pancreática. A maioria dos pacientes desenvolve sinais e sintomas de insuficiência pancreática durante o período de lactente, enquanto que alguns outros ainda permanecem com função pancreática inicialmente adequada, antes de desenvolver a perda progressiva desta função durante o período pré-escolar. A perda da atividade enzimática do pâncreas e a redução das concentrações de sais biliares no lumem intestinal acarretam má absorção dos nutrientes da dieta (particularmente as gorduras), cuja manifestação ocorre por diarreia, esteatorréia e failure to thrive. Além do envolvimento respiratório e da doença pancreática, outros sinais e sintomas da FC incluem desequilíbrio eletrolítico, pólipos nasais e dos seios da face, prolapso retal e complicações reprodutoras.  

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