segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Dor abdominal recorrente na infância: resumo das avaliações de tratamento de três revisões sistemáticas (Parte 1)



Prof. Dr. Ulysses Fagundes Neto

Introdução

A dor abdominal recorrente (DAR) é um problema comum na prática pediátrica, com prevalência estimada que varia de 2% a 41%. Entre 4% e 25% das crianças em idade escolar sofrem de DAR intermitentemente, o que é bastante para interferir em suas atividades de vida diariamente. A DAR está associada com afastamentos escolares, internações hospitalares e em determinadas ocasiões até mesmo intervenções cirúrgicas desnecessárias.  A dor abdominal geralmente está associada com outros sintomas, tais como: cefaleia, dores nos membros, palidez e vômitos, os quais podem persistir até a vida adulta. A DAR pode causar significativa ansiedade nos pais e cuidadores, os quais se sentem sobrecarregados pelo receio da coexistência de enfermidades mais graves, ou mesmo por se sentirem incapazes para aliviar os sintomas apresentados pela criança.

A DAR nas crianças representa um grupo de transtornos funcionais gastrointestinais que apresentam uma etiologia não esclarecida. O último consenso da Fundação Roma sugere que esses transtornos estão relacionados com os seguintes eventos fisiopatológicos, a saber: alteração da motilidade do trato digestivo, hipersensibilidade visceral, alteração da função imunológica e da mucosa, alteração da microbiota intestinal e alteração nos processos envolvendo o sistema nervoso central (Figuras 1-2-3-4).


Figura 1- Manifestações clínicas decorrentes da intolerância a determinados carboidratos da dieta que podem estar presentes nos transtornos funcionais gastrointestinais.


Figura 2- Representação esquemática dos diversos mecanismos fisiopatológicos envolvidos nos transtornos funcionais.


Figura 3- Representação esquemática dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos na Síndrome do Intestino Irritável.


Figura 4- Representação esquemática do eixo Sistema Nervoso Central-Trato Digestivo, destacando a grande importância das relações cognitivas e emocionais entre ambos sistemas do nosso organismo, o trato digestivo se constituindo no chamado “Segundo Cérebro”.

A Fundação Roma sugere que a DAR é “o produto de interações de fatores psicossociais e alterações fisiológicas do trato digestivo tendo como via o eixo cérebro/intestino”. Para o propósito desta revisão sistemática a DAR foi utilizada como um termo “guarda-chuva” para descrever o que atualmente se refere como “transtornos funcionais de dor abdominal” de acordo com a nova classificação de Roma IV: dispepsia funcional, síndrome do intestino irritável, enxaqueca abdominal e dor abdominal funcional.

Até o presente momento não existe um consenso ou guias de conduta a respeito das intervenções oferecidas aos pacientes, e, consequentemente, o tratamento da DAR permanece sem uma definição consistente.  Esta revisão sistemática tem por objetivo avaliar a eficácia das intervenções dietéticas, farmacológicas e psicológicas nas crianças em idade escolar que sofrem de DAR.

Métodos

A revisão sistemática foi conduzida de acordo com os princípios gerais publicados pela Cochrane e foi relatada segundo os critérios estabelecidos pelas Revisões Sistemáticas de Meta-Análises.

Critérios de Inclusão

Crianças com idades de 5 a 18 anos com DAR ou um transtorno funcional gastrointestinal relacionado com dor abdominal, conforme a definição dos critérios de Roma III, foram incluídas. O efeito primariamente avaliado foi a dor, segundo os seguintes parâmetros: intensidade, frequência, duração, ou a proporção dos participantes que referiram significativo alívio da dor. Os estudos foram agrupados de acordo com a sua duração, da seguinte forma: seguimento de curto prazo (0-3 meses), médio prazo (3-6 meses) e longo prazo (6 ou mais meses). Os seguintes desfechos secundários foram analisados: desempenho escolar, comportamento social ou psicológico, qualidade de vida diária, e outros adventos adversos.

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