Ulysses Fagundes Neto
Este artigo baseia-se em uma revisão sobre Alergia Alimentarpublicada no J Allergy Clin Immunol 2018; 141:41-58, escrito porScott H. Sicherer e Hugh A. Sampson.
Diagnóstico
É
muito importante ter-se em mente uma boa compreensão dos transtornos clínicos e
seus respectivos sintomas a respeito das AAs para se poder alcançar um
diagnostico apropriado. Os guias clássicos de conduta classificam as reações adversas
aos alimentos, imunologicamente mediadas, de acordo com os presumíveis
mecanismos fisiopatológicos primários, muito embora eles possam apresentar
algumas variações. AAs são definidas diferentemente de outras reações adversas aos
alimentos porque elas envolvem uma resposta imunológica. Portanto, reações
adversas à alimentos, tais como, intolerância (intolerância à lactose), ou
tóxicas (envenenamento alimentar), ou farmacológicas (cafeína), não se
caracterizam como AAs. Em geral, no que concerne às AAs, existem mecanismos
fisiopatológicos IgE-mediados, não-IgE mediados (mediados por células) ou
mistos (IgE-mediados e mediados por células).
Determinar
se a causa presumível dos sintomas é atribuível à AA, e a qual alimento ou a quais
alimentos, trata-se de uma tarefa altamente desafiadora e, deve-se também considerar
que determinadas reações/sintomas podem ser equivocadamente confundidas com AA.
Por exemplo, o envenenamento pela ingestão da toxina escombroide, a qual se
encontra presente na carne apodrecida de peixe, cuja toxina desencadeia
sintomas similares à liberação de histamina, ou respostas neurológicas, tal
como a que ocorre na síndrome auriculotemporal, causada por alimentos que deflagram
salivação excessiva e também resultam em vaso dilatação reflexa da face, ou a rinite
gustatória, causada por alimentos picantes que resultam em rinorreia, todas estas
reações podem mimetizar manifestações equivalentes a AA. É também notório que
asma e rinite crônicas não devem ser tipicamente atribuíveis a reações
alérgicas induzidas por alimentos. Inúmeras vezes certos alimentos são
excluídos da dieta das crianças que sofrem de dermatite atópica, sem que haja
uma clara indicação para tal, em virtude de uma falsa suspeição de que determinados
alimentos tenham contribuído para o surgimento da lesão cutânea. Nestas
circunstâncias tal conduta que pode causar consequências nefastas do ponto de
vista nutricional, social e possivelmente imunológico para o paciente, o que se
torna um fator negativo para uma abordagem diagnóstica criteriosa. Indiscutivelmente,
alimentos podem ser reais deflagradores de AA, mas muitos outros deflagradores
adicionais existem, incluindo irritantes, infecções e alergenos ambientais.
Indiscutivelmente
o “teste” elementar mais importante para o diagnóstico da AA, está
fundamentalmente baseado na história clínica. Para se estabelecer o
diagnóstico, a história clínica deve ser avaliada no contexto acerca do
conhecimento da epidemiologia e das manifestações clínicas da AA, e, deve-se
também levar em consideração a compreensão de que transtornos que apresentam
manifestações clínicas similares podem ser confundidos com AA. Por exemplo,
consideremos uma criança de 3 anos de idade que apresenta queixa de urticária
generalizada que foi deflagrada 15 minutos após a ingestão de amendoim. Caso nós
tenhamos o devido conhecimento de que esta criança tem rotineiramente tolerado
a ingestão de grandes quantidades de amendoim, que ela não é atópica, e que
apresenta, no momento do exame, sintomas típicos de uma infecção viral e que a
urticária vem persistindo há 7 dias, nós deveremos concluir que os sintomas não
estão relacionados com a ingestão de amendoim, mas ao contrário, muito
provavelmente a urticária está relacionada à infecção viral. Por outro lado,
caso a história clínica permita saber que a criança apresentou dermatite
atópica, e, também, alergia ao ovo anteriormente à ingestão do amendoim, e que esta
foi sua primeira ingestão e que a urticaria foi tratada com anti-histamínicos e
não cedeu, nós já deveremos estar altamente convencidos da existência de alergia
ao amendoim. Essas conclusões estão baseadas na compreensão das probabilidades
anteriores, tendo por princípio os riscos epidemiológicos e os detalhes da
história clínica relatada; no primeiro caso, testes laboratoriais são
desnecessários de serem realizados, enquanto que no último caso, estes testes
devem provavelmente ser confirmatórios para alergia ao amendoim. Alguma informação
diagnóstica adicional deve ser obtida pela seleção apropriada e respectiva interpretação
dos testes, tais como, Prick-test, mensuração
de IgE específica e/ou teste de provocação oral, os quais devem ser
interpretados dentro do contexto da epidemiologia, fisiopatologia e história
clínica associadas com os cenários clínicos criteriosamente considerados (Figura
3).
Figura
3- Critérios de abordagem diagnóstica da AA.
Para
uma melhor avaliação crítica da abordagem diagnóstica da AA, a tabela abaixo discrimina
os dados mais confiáveis e as possíveis falhas concernentes ao diagnóstico de
AA (Tabela 1).
Manuseio das AA e recomendações
educacionais
A
Tabela 2, traz uma série de recomendações educacionais quanto ao manuseio e
prevenção da AA.
A
Figura 4 especifica as células envolvidas nos processos de dessensibilização,
remissão e tolerância das AAs.
FIG 4. Cells involved in
desensitization, remission, and tolerance. There are overlaps between the
states of desensitization and sustained unresponsiveness (remission); thus far,
there are no distinctive biomarkers to show which state starts at which time
period. Mast cells and basophils play a role in desensitization. Direct in vivo evidence has been
demonstrated in murine models, and human findings suggest comparable
associations. Similarly, ‘‘remission’’ and ‘‘tolerance’’ are overlapping, and
thus far, there are no clear biomarkers. Tolerogenic DCs, Treg cells, Breg
cells, and effector cell/Treg and Breg cell ratios are present during remission
and long-term tolerance. Distinct mechanisms responsible for the immune
response shifting from a state of remission into long-term tolerance are not
known. cAMP, Cyclic AMP; CTLA-4, cytotoxic T lymphocyte–associated protein 4; LAP, latency-associated
peptide; PD-1, programmed cell death 1.
Conclusões
Está
bem estabelecido que a prevalência de AA é alta, alcançando até 10% da
população pediátrica, e, inclusive tem aumentado nas ultimas décadas. Inúmeros
fatores de risco genéticos e ambientais têm sido identificados. Análises
detalhadas quanto a via da sensibilização, a caracterização do alergeno e a
resposta imunológica, fornecem maiores facilidades para o diagnóstico e o
tratamento. O diagnóstico depende de uma combinação de conhecimentos quanto a
epidemiologia e a fisiopatologia associados com a história clínica fornecida
pelo paciente e os resultados dos testes laboratoriais. Entretanto, vale
ressaltar que ainda é desconhecida a completa compreensão da causa do aumento
da prevalência da AA, assim como é necessário desenvolver melhores abordagens
diagnósticas e, também maximizar a segurança e a qualidade de vida do paciente
durante o manuseio da AA. Torna-se também tarefa essencial a busca incessante
de novas e melhores opções terapêuticas.
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