Arquivos de
Gastroenterologia 2013; 50: 226-30
Prevalência de Má Absorção à Frutose utilizando o teste do Hidrogênio no
ar expirado
Adriana Chebar Lozinsky*, Cristiane
Boé*, Ricardo Palmero**, Ulysses Fagundes-Neto***
Introdução
A frutose é um carboidrato monossacarídeo encontrado na natureza
em sua maior parte como
constituinte da sacarose. Tem sido cada vez mais utilizada na dieta ocidental
na forma de adoçante em produtos industrializados, por ser alternativa mais
barata que a sacarose. Sua presença é comumente observada em refrigerantes,
doces e principalmente em sucos de frutas naturais e artificiais (1). A frutose
é transportada através do epitélio intestinal por um mecanismo facilitador
denominado GLUT 5 (transportador facilitador de hexose), o qual apresenta alta
afinidade pela frutose, que carrega este monossacarídeo através da membrana
apical do enterócito (2). Este mecanismo possui capacidade limitada de absorção
deste carboidrato. A frutose pode também
ser absorvida quando ingerida em associação com a glicose, sendo então
arrastada pelo mecanismo da draga do solvente, pelas junções firmes dos
enterócitos (3). Entretanto, quando a concentração da frutose em um determinado
alimento encontra-se em excesso em relação àquela da glicose, condição esta
muito frequentemente verificada em sucos de frutas, principalmente nos sabores
maçã, uva e pêra, alguns indivíduos podem desenvolver má absorção à frutose
(4-5). Estes indivíduos apresentam sintomas que incluem flatulência, diarréia,
dor e distensão abdominal. Para se estabelecer o diagnóstico da má
absorção/intolerância à frutose a anamnese deve incluir uma detalhada história
dietética associada à investigação laboratorial que pode ser realizada por meio
do teste do hidrogênio no ar expirado, o qual é realizado após ingestão de
sobrecarga de frutose (6). Nesta circunstância, o monossacarídeo não absorvido
no intestino delgado, é fermentado pelas bactérias colônicas resultando na
produção de gases como metano, dióxido de carbono e hidrogênio, além de ácidos
graxos voláteis de cadeia curta, tais como ácido acético, butírico e
propiônico. O hidrogênio, por sua vez, atravessa a mucosa colônica, passa para
a circulação sistêmica e, finalmente, é eliminado pela expiração. A confirmação
diagnóstica se complementa quando ocorre alívio dos sintomas depois da retirada
da frutose da dieta.
O objetivo do presente
estudo é descrever a prevalência de má absorção à frutose utilizando o teste do
hidrogênio no ar expirado em pacientes com transtornos digestivos e/ou
nutricionais.
Casuística e Métodos
A)
Pacientes
Foram investigados 43
pacientes de forma consecutiva, de ambos os sexos, atendidos no ambulatório de
Gastroenterologia Pediátrica da EPM-UNIFESP, com queixa de transtornos
digestivos e/ou nutricionais, tais como: dor abdominal crônica e recorrente,
diarréia, vômitos e baixo ganho pôndero-estatural, no período compreendido de setembro
de 2010 a
fevereiro de 2012.
Todos
os pacientes foram submetidos ao Teste do Hidrogênio (H2) no ar expirado com
sobrecarga oral dos seguintes carboidratos, a saber: glicose, frutose, lactose
e lactulose, como parte rotineira da investigação da função
digestivo-absortiva.
Além destes testes outros
exames laboratoriais pertinentes para cada caso específico foram realizados.
B) Teste do Hidrogênio no
ar expirado com sobrecarga oral de carboidrato
B.1) Procedimento
Os testes foram realizados
individualmente para cada carboidrato e em dias subsequentes.
Para a realização do teste os pacientes foram
mantidos em jejum de 8 horas, sendo permitida a ingestão de pequenas
quantidades de água; para os lactentes o período mínimo de jejum foi de 6
horas. Os testes foram realizados pela manhã, após o jejum noturno e lavagem
bucal com antisséptico apropriado.
Os carboidratos foram administrados por via oral em solução aquosa a
10%, nas seguintes doses: Lactose 2g∕Kg (máximo 25g), Glicose 1g∕Kg, (máximo
12g), Frutose 1g/Kg (máximo 12g) e Lactulose 20g.
As amostras de ar expirado
foram obtidas em jejum e a cada 15 minutos de intervalo de tempo durante a
primeira hora e a cada 30 minutos de intervalo de tempo por 1 hora adicional, após
a ingestão da solução contendo o respectivo carboidrato, totalizando 2 horas
para cada exame.
B.2) Critérios de avaliação
diagnóstica
No caso dos testes terem sido realizados com sobrecarga de frutose,
glicose e lactose, considerou-se má absorção quando ocorreu incremento >20
partes por milhão (ppm) de H2 em relação ao jejum; considerou-se intolerância, caso durante o
exame e∕ou até 8 horas após o mesmo, o paciente viesse a apresentar distensão
abdominal, dor abdominal, diarréia e/ou vômito.
Por outro lado, no caso do teste realizado com sobrecarga de lactulose
considerou-se sobrecrescimento bacteriano no intestino delgado quando houvesse incremento
>20 ppm de H2 no ar expirado em relação ao jejum, nos primeiros 60 minutos
após a ingestão do carboidrato.
C) Definições
Os diagnósticos clínicos dos transtornos funcionais foram caracterizados
de acordo com os critérios de Roma III (7), a saber:
1-
Síndrome do intestino irrtitável (SII)
Desconforto abdominal ou
dor, pelo menos um episódio por semana com duração de 2 meses anterior ao
diagnóstico, associados a 2 ou mais dos seguintes sintomas:
- alívio com a evacuação
- início do quadro
associado à mudança na freqüência das evacuações
- início do quadro
associado à mudança no formato das fezes
- nenhuma evidência da
coexistência de processo inflamatório, neoplásico, anatômico ou metabólico que
pudesse explicar os sintomas.
2-
Dor abdominal funcional (DAF)
Dor abdominal caracterizada
por ao menos um episódio por semana ou de forma contínua com duração de 2 meses
anterior ao diagnóstico, cuja manifestação não apresentasse qualquer evidência
de coexistência de processo inflamatório, neoplásico, anatômico ou metabólico
que pudesse explicar os sintomas.
3- Baixa estatura (BE)
O diagnóstico clínico de
baixa-estatura foi caracterizado quando a estatura para a idade encontrava-se
abaixo de -2 desvios padrões, utilizando-se como referência o z-score (8).
4- Doença celíaca (DC)
O diagnóstico de doença
celíaca foi caracterizado segundo os critérios da ESPGHAN (9).
Foi obtido consentimento
formal dos pais dos pacientes para a realização dos testes diagnósticos.
O presente trabalho foi
aprovado pelo Comitê de Ética da EPM/UNIFESP.
Referências Bibliográficas
1- Mishkin D, Sabrauskas L, Yalovsky M et al. Fructose
and sorbitol malabsorption in ambulatory patients with functional dyspepsia:
comparison with lactose maldigestion/malabsorption. Dig Dis Sci 1997; 42;
2591-8.
2- Jones HF, Butler
RN, Brooks DA. Intestinal fructose transport and malabsorption in humans. Am J
Physiol Gastrointest Liver Physiol 2011; 300: g202-6.
3- Shi X, Schedl HP, Summers RM et al. Fructose
transport mechanisms in humans. Gastroenterology 1997; 113: 1171-9.
4- Lifshtz F, Ament ME,
Kleinman RE, Klish W, Lebenthal E, Pearman J et al. Role of juice carbohydrate malabsorption in chronic
nonspecific diarrhea in children. J Pediatr 1992; 120: 825-9.
5- Baker SS, Cochrane WJ, Greer FR et al. The use
and misuse of fruit juice in Pediatrics. Pediatrics 2001; 107: 1210-13.
6- Duro D, Rising R, Cedillo M, Lifshitz F.
Association between infantile colic and carbohydrate malabsorption from fruit
juice in infancy. Pediatrics 2002; 109: 797-805.
7- Rasquin A, Di Lorenzo C,
Forbes D et al. Childhood
functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology 2006;
130: 1527-37.
8- World Health
Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry.
Geneve: WHO; 1995.
9- Husby S, Koletzko S, Korponay-Szabo IR et al. Coeliac
disease diagnosis: ESPGHAN 1990 criteria or need a change? Results of a
questionnaire. J Pediatr Gastroenterol Nutr 2012; 54: 15-9.
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