Deficiência congênita de Lactase:
enfermidade
extremamente rara, de origem autossômica recessiva, com incidência de 1:60.000
nascidos vivos, relatada em poucas crianças e potencialmente letal em épocas
que não existiam substitutos para o leite.
Recém-nascidos
afetados cursam com diarreia intratável logo que o leite humano ou fórmula
láctea contendo Lactose é introduzido; no caso de o diagnóstico não ser suspeitado
apresentam diarréia osmótica com perda de nutrientes que levam a desnutrição,
desidratação e acidose metabólica. Substâncias redutoras nas fezes são
facilmente detectadas e o pH fecal torna-se ácido. A resposta clínica ocorre
poucas horas após a retirada da Lactose da dieta e o desenvolvimento da criança
passa a ser normal. Vale enfatizar que esta deficiência enzimática é
permanente, e que, portanto, a Lactose deve ser evitada durante toda a vida.
A literatura
descreve dois tipos clínicos de deficiência congênita de Lactase:
Alactasia
congênita: manifesta-se
com o aparecimento de diarréia ácida, desidratação e acidose metabólica desde
os primeiros dias de vida, logo após a introdução da alimentação com leite,
seja ele materno ou não.
Intolerância
congênita à Lactose: quadro
clínico semelhante ao da alactasia congênita, acompanhado de lactosúria,
aminoacidúria e acidose renal, com predomínio de vômitos. Neste segundo tipo,
os sintomas desaparecem com a infusão da Lactose no duodeno, através do uso de
sonda pós-pilórica, sugerindo alguma alteração na permeabilidade gástrica. Caso
não seja rapidamente identificada e controlada com a utilização de fórmula
láctea isenta de Lactose, pode levar à morte, devido à ocorrência de
desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos graves.
Deficiência
de Lactase do desenvolvimento:
é caracterizada como deficiência relativa de Lactase observada entre prematuros
com menos de 34 semanas de gestação.
No trato gastrointestinal imaturo, a Lactase e outras dissacaridases são
deficientes até pelo menos a 34º semana gestacional. Melvin e cols.
investigando prematuros relataram o benefício da suplementação com Lactase e
fórmulas com baixo teor de Lactose; porém, por outro lado, também demonstraram
que o leite humano e fórmulas contendo Lactose não provocaram quaisquer efeitos
deletérios a curto ou longo prazo em recém-nascidos prematuros. Até 20% da Lactose
dietética pode atingir o cólon em recém-nascidos e crianças jovens. O
metabolismo bacteriano da Lactose diminui o pH fecal (abaixo de 6) provocando
um efeito benéfico, já que favorece a proliferação de microorganismos protetores
do trato digestivo (eg, Bifidobactérias
e espécies de Lactobacilos) ao invés
de favorecer o surgimento de agentes potencialmente patogênicos (espécies de Proteus, Escherichia coli e Klebsiella) em lactentes jovens. Agentes
antimicrobianos podem afetar negativamente esta colonização benéfica.
Manifestações clínicas da intolerância à Lactose
Nos indivíduos que apresentam deficiência de Lactase, além da baixa
atividade enzimática no intestino delgado ocorrem também vários outros fatores
envolvidos no desenvolvimento dos sintomas, incluindo a quantidade de Lactose ingerida,
sexo, idade, gravidez, sensibilidade visceral e anormalidades motoras do
intestino.
Os principais sintomas de intolerância à Lactose resultam da fermentação
bacteriana no cólon e incluem dor e distensão abdominal, flatulência, cólicas intestinais,
diarréia e em algumas ocasiões náuseas e vômitos; podem, também, diminuir a
motilidade gastrointestinal e, consequentemente, os indivíduos apresentarem
constipação, possivelmente como consequência da produção de metano.
Todos os sintomas citados são parcialmente dependentes da capacidade
funcional da atividade da Lactase e, acima de tudo, estão diretamente
relacionados com a quantidade de Lactose ingerida, ou seja, como se trata de
uma reação enzima-substrato, se houver excesso de substrato (Lactose) para ser
digerido pela enzima (Lactase), tais sintomas poderão surgir algumas horas após
a ingestão do leite. Portanto, é importante destacar que a intensidade dos
sintomas dependerá, estritamente, de uma relação diretamente proporcional entre
concentração de Lactose no alimento para a atividade da Lactase na mucosa
intestinal.
Dentre todos os sintomas acima referidos, indiscutivelmente, a diarréia
é o que apresenta maior risco para o paciente, em especial durante o período de
lactente, posto que o leite representa, parcialmente, a única ou pelo menos a
maior fonte alimentar da dieta nesta fase da vida. Nestas circunstâncias, caso
o diagnóstico não seja estabelecido rapidamente, a diarréia pode se tornar
crônica acarretando agravo nutricional que pode ser confundida com processo
infeccioso sistêmico. A Lactose não digerida permanece presente na luz do
intestino provocando fluxo de água e eletrólitos do organismo para o lúmen
intestinal, cujo volume de fluído acumulado supera a capacidade de reabsorção
de água pelo intestino grosso, sendo eliminado sob a forma de fezes líquidas. A
Lactose não digerida aumenta a pressão osmótica e promove afluxo de
água e eletrólitos para seu interior (aproximadamente, 5 gramas de
monossacarídeos ou 10
gramas de dissacarídeos retêm, osmoticamente, 100 mL de
água), e alcança o colon. Ao se
suspender a Lactose da dieta, o quadro diarréico cessará, portanto,
interrompida a causa, o efeito desaparecerá.
Dor abdominal crônica costuma ser um dos sintomas
predominantes de intolerância à Lactose. Mesmo o consumo de pequena quantidade
do carboidrato - 12 gramas
correspondem a um copo de leite de 250 mL - pode ser a causa deflagradora do
sintoma. Além disso, a Lactose não absorvida resulta em um importante substrato
para a flora bacteriana do intestino grosso. As bactérias aí prevalentes
metabolizam a Lactose produzindo ácidos graxos voláteis, os quais provocam uma
diminuição do pH fecal, tornando-o ácido (menor que 6), e gases (metano,
dióxido de carbono e hidrogênio), os quais causam flatulência.
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