terça-feira, 4 de setembro de 2012

Doença Celíaca (1)


 um problema de saúde pública universal (1)

Definição


A Doença Celíaca (DC) é uma enfermidade autoimune em decorrência de uma intolerância permanente ao glúten da dieta contido no trigo, cevada e centeio. A DC apresenta uma característica extremamente peculiar em relação às outras enfermidades autoimunes, porque para que ela ocorra é necessário que exista a contribuição de um fator ambiental claramente identificável (o glúten) associado à presença, no paciente, de um Antígeno de Histocompatibilidade (HLA – human leukocytes antigen) dominante, DQ2 ou DQ8. Classicamente ela se apresenta com diarréia crônica e parada do ritmo de crescimento pondero-estatural nos primeiros anos da vida (Figuras 1-2-3 & 4), além de vômitos e distensão abdominal.

Figura 1- Gráfico de crescimento pondero-estatural da paciente portadora de Doença Celíaca por ocasião do diagnóstico.

Figura 2- Paciente portadora de Doença Celíaca por ocasião do diagnóstico evidenciando grande irritabilidade (uma das características típicas dos quadros floridos da enfermidade), distensão abdominal, hipotrofia da musculatura da raiz das coxas e edema tibial.

Figura 3- Paciente portadora de Doença Celíaca evidenciando hipotrofia da musculatura glútea e edema tibial por hipoproteinemia.
Figura 4- Paciente portadora de Doença Celíaca evidenciando grande irritabilidade, distensão abdominal, hipotrofia da musculatura glútea e edema tibial por hipoproteinemia.


O diagnóstico baseia-se nas alterações morfológicas da mucosa do intestino delgado, as quais embora não sejam patognomônicas, são altamente características, levando a graus variados de atrofia vilositária, infiltrado linfocitário intra-epitelial e hiperplasia das glândulas crípticas (Figura 5).
Figura 5- Material de biópsia de intestino delgado de paciente portador de Doença Celíaca evidenciando atrofia vilositária total, hiperplasia das glândulas crípticas e aumento dos linfócitos intra-epiteliais.

Vale ressaltar que os sintomas e as lesões morfológicas do intestino delgado são totalmente reversíveis com a introdução de uma dieta isenta de glúten (Figuras 6-7 & 8).
 Figura 6- Gráfico de crescimento pondero-estatural da paciente após introdução da dieta isenta de glúten.

 Figura 7- Paciente portadora de Doença Celíaca em franca recuperação clínica e nutricional após alguns meses de introdução da dieta isenta de glúten; é notório o ar de alegria e felicidade da criança.
Figura 8- Material de biópsia de intestino delgado de paciente portador de Doença Celíaca 6 meses após início de dieta isenta de glúten. As vilosidades intestinais encontram-se digitiformes, as glândulas crípitcas normais e o infiltrado linfo-plasmocitário da lâmina própria discreto.

É importante enfatizar que até há alguns anos a DC era considerada rara em determinadas regiões do mundo, inclusive no Brasil, sendo potencialmente mais prevalente na Europa. Entretanto, mais recentemente, a partir da década de 1980, com a descoberta dos marcadores sorológicos, o rastreamento da DC pode ser inicialmente realizado utilizando-se estes testes, os quais apresentam elevadas taxas de sensibilidade e especificidade, tais como os anticorpos anti-endomíseo e o anticorpo anti-transglutaminase tecidual da classe IgA. Com o advento desses métodos rápidos de rastreamento sorológico ocorreu um significativo aumento no conhecimento da DC, o que possibilitou, por sua vez, também, que se estabelecesse o diagnóstico de DC em um número crescente de indivíduos, até então, aparentemente assintomáticos. Estes avanços diagnósticos possibilitaram tornar conhecidas inúmeras outras manifestações clínicas da DC, evidenciando outras variedades sintomáticas, e não mais aquelas apenas relacionadas com o trato digestivo. A DC tem sido descrita também associada com outras múltiplas enfermidades auto-imunes, como por exemplo, tireoidite autoimune e diabetes tipo I. Há também fortes evidências de uma ocorrência aumentada de DC em crianças portadoras de dermatite herpetiforme, defeitos no esmalte dentário, deficiência de IgA, síndrome de Down, síndrome de Turner e nos familiares de primeiro grau dos pacientes portadores de DC. Uma série de estudos tem demonstrado que a prevalência da DC pode estar presente também entre 5 a 13% dos irmãos dos pacientes. Tomando-se por base inúmeros estudos realizados na Europa e nos Estados Unidos, a prevalência da DC entre as crianças de dois a quinze anos na população geral é de 3 a 13 para cada 1.000 crianças, ou aproximadamente 1:300 a 1:80 crianças. No Brasil, contrariamente às previsões do passado a DC, à semelhança dos países da Europa e dos Estados Unidos, sua prevalência, embora com variação na dependência geográfica dos estudos realizados, também se configura com níveis compatíveis a um problema de saúde pública que deve ser altamente  valorizado (Quadros 1 e 2).  


Quadro 1- Prevalência da DC em vários locais do globo terrestre.

 Quadro 2- Prevalência da DC em populações de baixo risco

Nenhum comentário: