quarta-feira, 8 de julho de 2009

Afecções Funcionais Gastrointestinais: Um Problema Emergente e de Alta Prevalência (1)

Introdução

As Afecções Funcionais Gastrointestinais (AFG) constituem-se em um vasto grupo de entidades clínicas que se manifestam por meio de sintomas crônicos ou recorrentes e que, até o presente momento, não se tem conhecimento a respeito de apresentarem possíveis anormalidades estruturais ou bioquímicas. Por esta razão, representam um conjunto de síndromes altamente desafiadoras as quais freqüentemente deixam de ter um diagnóstico correto e estão associadas com elevadas taxas de morbidade. As AFG são responsáveis por mais de 50% das consultas em gastroenterologia pediátrica e de 2 a 4% das visitas aos consultórios dos pediatras generalistas (Nurko & Di Lorenzo, JPGN 47:679,2008). A qualidade de vida dos indivíduos afetados pelas AFG está significativamente mais comprometida que a da população geral, inclusive até mesmo em comparação com aqueles que padecem de asma ou enxaqueca. As crianças diagnosticadas com Dor Abdominal Funcional (DAF) ou Síndrome do Intestino Irritável (SII) sofrem mais episódios de dor abdominal ou mesmo outras dores somáticas, impotências funcionais e sintomas psiquiátricos do que as de grupos controles; além disso, têm também maior probabilidade de apresentarem persistência dos sintomas ao longo da vida adulta. Algumas investigações clínicas têm demonstrado uma associação entre DAF na infância e, a longo prazo, co-morbidades incluindo entre elas, depressão, ansiedade, doenças psiquiátricas, fobias sociais e queixas somáticas.
Mais recentemente, o interesse pelo estudo das AFG e seu reconhecimento pelos pediatras têm crescido de forma significativa. Estudos epidemiológicos cuidadosamente elaborados têm sido realizados, critérios diagnósticos têm sido propostos e validados, progressos evidentes têm sido conseguidos para uma melhor compreensão dos mecanismos patofisiológicos que são a causa básica destas diversas entidades clínicas, e abordagens terapêuticas mais baseadas em evidências estão sendo desenvolvidas. Tudo isso representam ações técnico-científicas que trarão enormes benefícios para os pacientes, em especial, para aliviar os seus sofrimentos. A importância de uma abordagem multidisciplinar nas AFG tem sido largamente estimulada e as afecções funcionais já deixaram de ser consideradas condições que carregavam o estigma de serem algo “da imaginação da cabeça da criança” ou aquela outra noção comumente externada “não há nada de errado com a criança”, para atualmente serem englobadas entre as síndromes, tais como a fibromialgia ou a enxaqueca, verdadeiramente legítimas e aceitas como manifestações de disfunções dos sistemas neuro-entérico ou nervoso central.
No nosso próximo encontro continuarei a discutir as mais variadas nuances e os novos conhecimentos deste excitante problema que afeta um sem número de crianças em todo o globo terrestre.

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