Ulysses
Fagundes-Neto & Jacy Alves Braga de Andrade
Discussão
CA é a manifestação clínica mais comum de
alergia alimentar, em especial à proteína do leite de vaca, entre os lactentes
no primeiro semestre de vida (13); sangramento retal é a queixa mais frequente,
usualmente acompanhada por irritabilidade intensa e desconforto durante a
amamentação (14,15). CA trata-se de uma reação imunológica não mediada por IgE
desencadeada por uma proteína ou várias proteínas da dieta. Está bem
estabelecido que o principal alérgeno da dieta nos primeiros meses de vida é o
leite de vaca secundado pela soja (16), porém outros alimentos também podem
desencadear alergia alimentar, tais como: leite de outros mamíferos, ovos,
trigo, peixe, frutos do mar, cacau, nozes e amêndoas, amendoim e coco. Estes
reconhecidos alérgenos alimentares ao fazerem parte da dieta da nutriz podem
ser veiculados pelo leite humano. Por esta razão, lactentes que estejam
recebendo aleitamento natural exclusivo e que apresentem predisposição genética
para alergia, também podem apresentar sintomas de CA, ainda que muitas vezes de
forma não florida (17,18). Kilshaw e Cant (19), por exemplo, demonstraram que a
beta-lactoglobulina do leite de vaca pode ser detectada em amostras de leite
humano entre 4 e 6 horas após a nutriz ter ingerido leite de vaca. Vale
enfatizar que todos os nossos 5 pacientes receberam aleitamento natural durante
um período de suas vidas e que 4 deles ainda estavam recebendo aleitamento
natural exclusivo quando os sinais de colite surgiram. A tentativa de eliminar os
principais alérgenos, da dieta da mãe, resultou exitosa em apenas 1 caso (VCA),
visto que nos outros 2 casos, as mães decidiram suspender a lactação por não
haverem conseguido levar adiante a adesão à dieta de exclusão. Inclusive a mãe
de (SVBP) decidiu, por algo tempo, submeter-se a dietas extremamente
restritivas, porém, ao ingerir doce de coco pela segunda vez, os sintomas de
colite recrudesceram em sua filha, o que a levou a suspender a lactação de
forma definitiva. Vale ressaltar que essa paciente ao atingir a idade de
receber dieta sólida (6 meses) foi introduzida uma dieta à base de mistura de
aminoácidos (Neocate semi-solid food). Entretanto, ao cabo de 1 semana
recebendo tal dieta, surgiram lesões eczematosas nos membros superiores e
inferiores, as quais desapareceram prontamente com a eliminação deste alimento.
Interessante notar, que sua prima (STBP) havia
feito anteriormente uso deste mesmo produto nutricional sem que houvesse
revelado quaisquer sintomas de alergia e/ou intolerância. Ficou confirmado
desta intercorrência que as manifestações de alergia podem ser amplas às mais
diversas proteínas heterólogas da dieta e cujas reações não obedecem a um
critério universal para todos os pacientes, ou seja, podem variar de indivíduo
para indivíduo (20).
No presente estudo foi possível demonstrar
claramente que esta manifestação de alergia é transitória conforme é referido
por outros autores (14,20,21), diferentemente de algumas intolerâncias/alergias
alimentares, tais como a doença celíaca, por exemplo, enfermidade autoimune, a
qual se trata de uma intolerância permanente ao trigo e derivados da dieta
(22). Neste estudo tivemos a oportunidade de acompanhar os 5 pacientes desde o
diagnóstico inicial até o momento em que foi realizado o desencadeamento com
sucesso após um longo período de evolução que perdurou entre os 11 e os 18 meses
de idade dos nossos pacientes. Até aonde nosso conhecimento alcança esta é a
primeira descrição da evolução clínica completa de pacientes portadores de CA
desde o diagnóstico até o exitoso momento do teste de provocação com o alimento
considerado mais alergênico, o leite de vaca. Vale assinalar, também, que todos
os 5 pacientes já toleravam perfeitamente todos os outros alimentos componentes
da dieta rotineira da nossa cultura alimentar, antes de ser realizado o teste
de provocação com leite de vaca.
As lesões colônicas macroscópicas revelaram os
mesmos aspectos característicos descritos por outros autores, porém em um deles
a lesão no colon direito simulando granuloma, não é um achado comum da CA (VCA).
Por esta razão, foi inclusive levantada a suspeita diagnóstica de doença de
Crohn, muito embora a idade precoce do paciente fosse um fator que contrariaria
esta hipótese. De qualquer forma foram solicitados os testes para investigar
doença inflamatória intestinal, os quais resultaram negativos, e a própria
evolução clínica do paciente demonstrou tratar-se realmente de colite alérgica.
Outro paciente (STBP), além das lesões características inflamatórias
apresentava também uma exuberância de nódulos linfóides visíveis
macroscopicamente, o que está de acordo com a experiência descrita por outros
autores (23). A análise microscópica das lesões coincidiu plenamente com nossa
experiência anteriormente descrita e confirma o que tem sido descrito na
literatura (5,12).
Atualmente é do reconhecimento geral que existe
uma predisposição genética para alergia a qual age em associação com um ou mais
fatores desencadeantes (24). Particularmente, no caso da alergia alimentar
alguns fatores que desempenham papel de importância no seu desencadeamento têm
sido descritos, tais como, dieta materna, dieta do lactente, prematuridade, ausência
de aleitamento natural exclusivo, deficiência de IgA secretora, deficiência da
barreira de permeabilidade intestinal (25,26,27) etc. Entretanto, a ocorrência
de CA em grupos familiares, como o verificado no presente estudo, parece
sugerir uma forte evidência de predisposição genética familiar. Casos de CA têm
sido raramente descritos entre irmãos ou parentes próximos. Nossos achados
confirmam os de Nowak-Wegrzyn (28), em 2003, que descreveu caso de CA provocada
pela proteína da soja em um par de gêmeos, bem como, os de Hill e Milla (10),
em 1990, que descreveram quadro de CA em 3 irmãos, em um grupo de 13 pacientes
com história de atopia em parentes de primeiro grau.
Em conclusão, tudo indica que a manifestação de
CA no primeiro semestre de vida apresenta globalmente um aumento na sua incidência;
foi confirmado em nosso estudo o caráter transitório desta enfermidade e, ao
mesmo tempo, enfatizada uma forte evidência de predisposição genética familiar
especificamente para seu desencadeamento.
Eu sou Sueli, tenho 11 meses, agora me sinto
muito bem, porém, quando eu era bem pequena meu coco tinha muito sangue e eu
sentia muitas cólicas. Espero que em pouco tempo eu já poderei comer de tudo,
inclusive tomar leite de vaca.
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