Introdução
Está definitivamente estabelecido que tem ocorrido um
significativo aumento no diagnóstico da Esofagite Eosinofílica (EEo) em todo
o globo terrestre, fazendo exceção, porém, o continente africano. As manifestações clínicas
apresentam grande variabilidade que incluem desde aversão alimentar e
desnutrição em lactentes e pré-escolares, a vômitos crônicos e dor abdominal em
escolares, e dor abdominal, disfagia e impactação dos alimentos em
adolescentes. Complicações, tais como estenose esofágica, tem sido descritas em
crianças e adultos. Fibrose sub-epitelial esofágica, uma precursora da
estenose, que pode afetar de forma significativa a qualidade de vida dos
pacientes com EEo, tem sido descrita em crianças com disfagia. O mecanismo da
fibrose sub-epitelial está diretamente relacionado com a eosinofilia e,
portanto, a eliminação desta complicação pode resultar em sua reversão.
Recentes evidências obtidas a partir de pacientes que apresentam EEo de longa
duração demonstram que a persistência dos sintomas, a despeito da resolução da
inflamação esofágica aguda por meio do uso de drogas anti-inflamatórias, ocorre
devido a uma deficiência funcional do esôfago em virtude da existência de um
prolongado período de inflamação não anteriormente detectado. Por esta razão, a
identificação e a eliminação de antígenos alimentares específicos, que provocam
inflamação da mucosa esofágica, oferecem ótima perspectiva para a manutenção
sustentada da remissão histológica.
No número de Agosto do Journal of Pediatric
Gastroenterology and Nutrition (JPGN) de 2011 há um excelente artigo “Invited
Commentary” escrito por Philip E. Putman, do Children’s Hospital Medical
Center, Cincinnati, Ohio sobre este tema tão atual e que desperta enorme
interesse (JPGN 53; 129-30). A seguir reproduzo os principais tópicos abordados
pelo autor.
Artigo
Nesta última década tem sido reconhecido um
significativo aumento da prevalência da EEo tanto na população adulta quanto na
pediátrica. Inicialmente, uma série de casuísticas descreveram as manifestações
clínicas, endoscópicas e histológicas desta entidade clínica. Em 2007, um grupo
multidisciplinar de experts (Gastroenterology 2007; 133: 1342-63) elaborou o
primeiro consenso de recomendações para o diagnóstico e tratamento da EEo, o
qual foi atualizado em Abril de 2011 (J Allergy Clin Immunol). Esses documentos
oferecem informações detalhadas a respeito do diagnóstico e das opções do
manejo terapêutico, mas não fornecem um algoritmo para o manejo individualizado
para pacientes a longo prazo.
O conceito diagnóstico atual é que EEo trata-se de um
processo inflamatório crônico imunologicamente mediado, restrito ao esôfago, o
qual na maioria das vezes é desencadeado pela exposição a antígenos
alimentares. A exclusão destes antígenos alimentares agressores resulta na
remissão da enfermidade, e a reexposição acarreta sua recidiva. Considerando-se
que o número e a natureza dos alergenos da dieta desencadeadores da EEo apresentam grande variabilidade entre os diferentes indivíduos, não é
possível propor um tipo padrão de dieta que atenda às todas necessidades, de
tal forma que se possa de uma maneira geral, eliminar os antígenos agressores e,
ao mesmo tempo, assegurar nutrição adequada para atender aos requerimentos
dietéticos necessários para todas as idades. A substituição da dieta rotineira
pela utilização de uma fórmula não alergênica à base de mistura de aminoácidos
atende este desafio, porém seu alto custo, sua baixa palatabilidade, as
consequentes dificuldades psicossociais, a cronicidade do processo patológico e
a frequente necessidade da utilização de alimentação por sonda naso-gástrica
representam grandes desafios para as famílias dos respectivos pacientes.
Uma alternativa para contornar o problema do uso das
dietas alimentares no manejo dietético da EEo foi a proposta da então
denominanda "dieta de eliminação de seis alimentos". Em 2006,
Kagalwalla e cols. (Clin Gastroenterol Hepatol 2006; 4: 1097-102), estudaram o
impacto desta dieta, a qual eliminava simultaneamente os seguintes alimentos:
leite e derivados, ovo, trigo, soja, peixe/frutos do mar e frutas oleaginosas (castanhas, nozes, avelã, cacau, amendoas, amendoim), sem levar em
consideração os resultados dos tradicionais testes alérgicos. Aproximadamente
75% das crianças apresentaram remissão da EEo durante o período em que estes
alergenos foram evitados. A vantagem gritante deste tipo de dieta em relação à dieta
elementar se dá pela preservação de uma porção significativa da dieta
rotineira, a qual pode ser completada nutricionalmente quando apropriadamente
manipulada por nutricionistas. Caso ocorra o sucesso terapêutico, fica bem
estabelecido que os alimentos agressores estão presentes no grupo de alergenos
alimentares supra citados. Para se saber quais antígenos são os verdadeiros
provocadores da inflamação deve-se então reintroduzí-los na dieta de forma
individual seguindo-se pela realização de biópsias endoscópicas, ao menos que
uma recidiva dos sintomas seja tão notória que requeira a imediata eliminação
deste alergeno da dieta. Desta forma um número relativamente pequeno de
endoscopias seria necessário para completar o processo desde a retirada inicial
dos alergenos da dieta até ser alcançada uma dieta definitivamente aceitável, o
que contrastaria com um número de biópsias endoscópicas, que seriam necessárias, caso toda a alimentação rotineira fosse suspensa durante a utilização da dieta
elementar.
Kagalwalla e cols. (J Pediatr Gastroenterol Nutr 2011;
53: 145-9), estabeleceram a frequência na qual alergenos isoladamente foram
responsáveis pela inflamação eosinofílica após a reintrodução dos mesmos. As
características clínicas dos pacientes estão descritas na Tabela 1.
Antígenos alimentares únicos foram identificados em 26
(72%), 2 alergenos em 3 (8%) e 3 alergenos em 3 pacientes (8%), como está
demostrado na Figura 1.
Os antígenos alimentares mais comumente identificados
foram: leite de vaca 25/34 (74%), trigo 8/31 (26%), ovo 4/24 (17%), soja 3/29
(10%) e amendoim 1/17 (6%) (Figura 2).
O leite de vaca foi o alimento que mais frequentemente causou EEo. Em relação aos outros 4 alimentos, o leite de vaca mostrou-se 8 vezes mais causador de EEo em comparação com o trigo, 14 vezes mais frequente em comparação com o ovo, 24 vezes mais frequente em comparação com a soja e 43 vezes em comparação com o amendoim, conforme está demonstrado na Tabela 2.
O fato dos pacientes terem reagido a 2 ou
mais alergenos alimentares é a razão que justifica a remoção de todos os 6
alimentos alergênicos simultaneamente no início do tratamento dietético. Caso
esses alimentos tivessem sido eliminados um a um, nenhuma das crianças que se
mostrou intolerante a mais de um alergeno, apresentaria remissão dos sintomas
porque haveria sempre, embora de forma alternada, a presença de pelo menos um
alimento alergênico na sua dieta. Em conclusão, a reintrodução seriada de alimentos
de forma individualizada, após a indução da remissão histológica com a
eliminação dos 6 alimentos supostamente alergênicos da dieta, permitiu
identificar o alergeno alimentar específico causador da EEo.
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