terça-feira, 14 de julho de 2015

Síndrome do Intestino Irritável e Sensibilidade ao Glúten não Celíaca: uma complexa relação e possível sobreposição de duas entidades clínicas (Parte 3)

SII e SGNC: uma relação complexa

A SII ao que tudo indica representa uma cesta na qual estão misturadas várias entidades clínicas cujas manifestações clínicas são muito similares entre si. Desta forma, é possível considerar que alguns indivíduos portadores da SGNC sejam tipicamente casos de SII e vice-versa, ou seja, um subgrupo de pacientes com SII possam, na verdade, serem portadores da SGNC. Este cenário tem sido ressaltado nos indivíduos portadores da SII subtipo Diarreia, particularmente naqueles em cujo genótipo esteja presente o complexo genético DQ2 e/ou DQ8. Neste grupo de pacientes foi demonstrado que a ingestão de grãos contendo glúten aumentou a permeabilidade intestinal através da ruptura das junções firmes do epitélio intestinal, embora sem afetar sua estrutura histológica nem tampouco o trânsito intestinal. Fritscher-Ravens e cols. (17) demonstraram em um grupo de 36 pacientes portadores da SII a ocorrência de uma nítida relação com a ingestão de glúten, muito embora tenham sido excluídas DC e AT. Estes autores demonstraram a existência de rupturas nas junções firmes e infiltração de células imunológicas nos enterócitos em 22 dos 36 pacientes estudados. A maioria destes pacientes (13/22) reagiu ao trigo, enquanto que os outros reagiram ao leite, soja e fungos. É importante assinalar que a exclusão destes alimentos agressores reduziu os sintomas clínicos em média de 74% durante um período de 1 ano de acompanhamento.

A análise da epidemiologia da SII indiretamente estima a frequência da SGNC. No nordeste da Europa, a prevalência da SII na população adulta em geral é de 16-25%. Em uma série de pacientes com SII, a frequência de SGNC, em estudo duplo-cego, placebo-controlado foi de 28% (18).

Um amplo estudo realizado por Carroccio e cols. (19), em 2012, revelou que 30% dos indivíduos com sintomas compatíveis da SII de acordo com os critérios de Roma II sofriam de sensibilidade ao trigo e/ou a múltiplos alimentos. Assim, se for levado em consideração este estudo, uma proporção consistente de pacientes com SII é afetada pela SGNC, o que faz crer que a prevalência desta síndrome na população geral parece ser maior que a da DC, que é cerca de 1%, na maioria dos países do mundo ocidental, inclusive no Brasil. Entretanto, a prevalência da SGNC na faixa etária pediátrica ainda é desconhecida.

Vasquez-Roque e cols. (20), em 2013, demonstraram que pacientes não celíacos portadores da SII com predominância da variante diarreia, podem desenvolver sintomas gastrointestinais após a ingestão de glúten. Estes pacientes ao receberem uma dieta contendo glúten apresentavam maior número de evacuações por dia, particularmente aqueles cujo genótipo era HLA-DQ2 e/ou DQ8. A dieta contendo glúten mostrou-se associada com aumento da permeabilidade do intestino delgado e significativa diminuição na expressão da zonula ocludens 1 da mucosa colônica. Estes efeitos foram significativamente maiores nos pacientes HLA-DQ2 e DQ8 positivos. Por outro lado, pacientes que receberam dieta contendo glúten versus aqueles que receberam dieta isenta de glúten, não apresentaram alterações significativas sobre o trânsito gastrointestinal ou na morfologia do intestino delgado. Os autores concluíram que o glúten provoca ruptura da barreira de permeabilidade intestinal nos pacientes com SII com diarreia, particularmente naqueles HLA-DQ2 e DQ8 positivos. As alterações na barreira de permeabilidade intestinal permitiram oferecer explanações mecânicas a respeito das observações de que a retirada do glúten da dieta pode provocar alívio dos sintomas nos pacientes portadores de SII com diarreia (Figura 10).




Figura 10- Representação esquemática da evolução dos pacientes antes e após a retirada do glúten da dieta evidenciando alívio dos sintomas em especial a diarreia.

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