Adriana
Chebar Lozinsky*, Cristiane Boé*, Ricardo
Palmero**, Ulysses Fagundes-Neto***
*Residente
de 4º ano da Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Pediatria da
Escola Paulista de Medicina - Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP).
**
Biomédico da Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Pediatria
EPM-UNIFESP.
***Doutor
em Gastroenterologia e Pediatria pela EPM-UNIFESP, Professor Titular da
Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Pediatria da EPM-UNIFESP.
Introdução
A frutose é um carboidrato monossacarídeo
encontrado na natureza em sua maior parte como constituinte da
sacarose. Tem sido cada vez mais utilizada na dieta ocidental na forma de
adoçante em produtos industrializados, por ser alternativa mais barata que a
sacarose. Sua presença é comumente observada em refrigerantes, doces e
principalmente em sucos de frutas naturais e artificiais (1). A frutose é
transportada através do epitélio intestinal por um mecanismo facilitador
denominado GLUT 5 (transportador facilitador de hexose), o qual apresenta alta
afinidade pela frutose, que carrega este monossacarídeo através da membrana
apical do enterócito (2). Este mecanismo possui capacidade limitada de absorção
deste carboidrato. A frutose pode também ser absorvida quando
ingerida em associação com a glicose, sendo então arrastada pelo mecanismo da
draga do solvente, pelas junções firmes dos enterócitos (3). Entretanto, quando
a concentração da frutose em um determinado alimento encontra-se em excesso em
relação àquela da glicose, condição esta muito frequentemente verificada em
sucos de frutas, principalmente nos sabores maçã, uva e pêra, alguns indivíduos
podem desenvolver má absorção à frutose (4-5). Estes indivíduos apresentam
sintomas que incluem flatulência, diarréia, dor e distensão abdominal. Para se
estabelecer o diagnóstico da má absorção/intolerância à frutose a anamnese deve
incluir uma detalhada história dietética associada à investigação laboratorial
que pode ser realizada por meio do teste do hidrogênio no ar expirado, o qual é
realizado após ingestão de sobrecarga de frutose (6). Nesta circunstância, o
monossacarídeo não absorvido no intestino delgado, é fermentado pelas bactérias
colônicas resultando na produção de gases como metano, dióxido de carbono e
hidrogênio, além de ácidos graxos voláteis de cadeia curta, tais como ácido
acético, butírico e propiônico. O hidrogênio, por sua vez, atravessa a mucosa
colônica, passa para a circulação sistêmica e, finalmente, é eliminado pela
expiração. A confirmação diagnóstica se complementa quando ocorre alívio dos
sintomas depois da retirada da frutose da dieta.
O
objetivo do presente estudo é descrever a prevalência de má absorção à frutose
utilizando o teste do hidrogênio no ar expirado em pacientes com transtornos
digestivos e/ou nutricionais.
Casuística e Métodos
A) Pacientes
Foram
investigados 43 pacientes de forma consecutiva, de ambos os sexos, atendidos no
ambulatório de Gastroenterologia Pediátrica da EPM-UNIFESP, com queixa de
transtornos digestivos e/ou nutricionais, tais como: dor abdominal crônica e
recorrente, diarréia, vômitos e baixo ganho pôndero-estatural, no período
compreendido de setembro de 2010 a fevereiro de 2012.
Todos
os pacientes foram submetidos ao Teste do Hidrogênio (H2) no ar expirado com
sobrecarga oral dos seguintes carboidratos, a saber: glicose, frutose, lactose
e lactulose, como parte rotineira da investigação da função
digestivo-absortiva.
Além
destes testes outros exames laboratoriais pertinentes para cada caso específico
foram realizados.
B) Teste do Hidrogênio no ar expirado
com sobrecarga oral de carboidrato
B.1) Procedimento
Os
testes foram realizados individualmente para cada carboidrato e em dias
subsequentes.
Para
a realização do teste os pacientes foram mantidos em jejum de 8 horas, sendo
permitida a ingestão de pequenas quantidades de água; para os lactentes o
período mínimo de jejum foi de 6 horas. Os testes foram realizados pela manhã, após
o jejum noturno e lavagem bucal com antisséptico apropriado.
Os
carboidratos foram administrados por via oral em solução aquosa a 10%, nas
seguintes doses: Lactose 2g∕Kg (máximo 25g), Glicose 1g∕Kg, (máximo 12g),
Frutose 1g/Kg (máximo 12g) e Lactulose 20g.
As
amostras de ar expirado foram obtidas em jejum e a cada 15 minutos de intervalo
de tempo durante a primeira hora e a cada 30 minutos de intervalo de tempo por
1 hora adicional, após a ingestão da solução contendo o respectivo carboidrato,
totalizando 2 horas para cada exame.
B.2) Critérios de avaliação
diagnóstica
No caso dos testes terem sido
realizados com sobrecarga de frutose, glicose e lactose, considerou-se má
absorção quando ocorreu incremento >20 partes por milhão (ppm) de H2 em
relação ao jejum; considerou-se intolerância, caso durante o exame e∕ou
até 8 horas após o mesmo, o paciente viesse a apresentar distensão abdominal,
dor abdominal, diarréia e/ou vômito.
Por outro lado, no caso do teste
realizado com sobrecarga de lactulose considerou-se sobrecrescimento bacteriano
no intestino delgado quando houvesse incremento >20 ppm de H2 no ar expirado
em relação ao jejum, nos primeiros 60 minutos após a ingestão do carboidrato.
C) Definições
Os diagnósticos clínicos dos
transtornos funcionais foram caracterizados de acordo com os critérios de Roma
III (7), a saber:
1-
Síndrome do intestino irrtitável (SII)
Desconforto
abdominal ou dor, pelo menos um episódio por semana com duração de 2 meses
anterior ao diagnóstico, associados a 2 ou mais dos seguintes sintomas:
-
alívio com a evacuação;
-
início do quadro associado à mudança na frequência das evacuações;
-
início do quadro associado à mudança no formato das fezes;
-
nenhuma evidência da coexistência de processo inflamatório, neoplásico,
anatômico ou metabólico que pudesse explicar os sintomas.
2-
Dor abdominal funcional (DAF)
Dor
abdominal caracterizada por ao menos um episódio por semana ou de forma
contínua com duração de 2 meses anterior ao diagnóstico, cuja manifestação não
apresentasse qualquer evidência de coexistência de processo inflamatório,
neoplásico, anatômico ou metabólico que pudesse explicar os sintomas.
3-
Baixa estatura (BE)
O
diagnóstico clínico de baixa-estatura foi caracterizado quando a estatura para
a idade encontrava-se abaixo de -2 desvios padrões, utilizando-se como
referência o z-score (8).
4-
Doença celíaca (DC)
O
diagnóstico de doença celíaca foi caracterizado segundo os critérios da ESPGHAN
(9).
Foi
obtido consentimento formal dos pais dos pacientes para a realização dos testes
diagnósticos.
O
presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética da EPM/UNIFESP.
Referências:
1- Mishkin D, Sabrauskas L, Yalovsky M et al. Fructose
and sorbitol malabsorption in ambulatory patients with functional dyspepsia:
comparison with lactose maldigestion/malabsorption. Dig Dis Sci 1997; 42;
2591-8.
2- Jones HF, Butler
RN, Brooks DA. Intestinal fructose transport and malabsorption in humans. Am J
Physiol Gastrointest Liver Physiol 2011; 300: g202-6.
3- Shi X, Schedl HP, Summers RM et al. Fructose
transport mechanisms in humans. Gastroenterology 1997; 113: 1171-9.
4- Lifshtz F, Ament ME,
Kleinman RE, Klish W, Lebenthal E, Pearman J et al. Role of juice carbohydrate malabsorption in chronic
nonspecific diarrhea in children. J Pediatr 1992; 120: 825-9.
5- Baker SS, Cochrane WJ, Greer FR et al. The use
and misuse of fruit juice in Pediatrics. Pediatrics 2001; 107: 1210-13.
6- Duro D, Rising R, Cedillo M, Lifshitz F.
Association between infantile colic and carbohydrate malabsorption from fruit
juice in infancy. Pediatrics 2002; 109: 797-805.
7- Rasquin A, Di Lorenzo C,
Forbes D et al. Childhood
functional gastrointestinal disorders: child/adolescent. Gastroenterology 2006;
130: 1527-37.
8- World Health
Organization. Physical status: the use and interpretation of anthropometry.
Geneve: WHO; 1995.
9- Husby S, Koletzko S, Korponay-Szabo IR et al. Coeliac
disease diagnosis: ESPGHAN 1990 criteria or need a change? Results of a
questionnaire. J Pediatr Gastroenterol Nutr 2012; 54: 15-9.
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