A2. Dor Abdominal Relacionada às AFGs (continuação)
6- Dor Abdominal Funcional da Infância e
7- Síndrome da Dor Abdominal na Infância
Nestas duas entidades uma limitada, porém, razoável investigação laboratorial de rastreamento para descartar algumas enfermidades de origem orgânica deve incluir hemograma completo, velocidade de hemosedimentação, proteína C reativa, urina tipo I e cultura. Outros perfis bioquímicos, tais como, hepáticos e renais, bem como exames diagnósticos (cultura de fezes, parasitológico de fezes e teste do Hidrogênio no ar expirado para detectar má absorção aos caboidratos) também são recomendáveis dependendo dos sintomas predominantes referidos pelo paciente, do grau de limitação funcional ou mesmo da intensidade da ansiedade familiar.
Para a caracterização diagnóstica da Dor Abdominal Funcional da Infância devem ser incluídas todas as seguintes manifestações:
1. As manifestações clínicas devem ocorrer pelo menos uma vez por semana durante pelo menos 2 meses.
2. A dor abdominal pode ser episódica ou contínua.
3. Não há evidência de processos inflamatórios, anatômicos metabólicos ou neoplásicos que possam explicar os sintomas.
Para a caracterização diagnóstica da Síndrome da Dor Abdominal Funcional da Infância a dor abdominal deve estar presente em pelo menos 25% do tempo e 1 ou mais dos seguintes sintomas devem estar incluídos:
1. Alguma perda da capacidade funcional diariamente.
2. Algum sintoma somático adicional, tal como dor de cabeça, dores nos membros e/ou dificuldade para dormir, deve estar presente.
Em minha opinião levando-se em consideração os muitos anos de experiência profissional intensamente por mim vividos nesta especialidade, entendo que estas duas entidades rotuladas pelo Comitê de experts de forma individualizada, representam nada mais do que uma discreta variante da Síndrome do Intestino Irritável. Ao meu ver esta dicotomia da classificação traz mais confusão do que esclarecimento diagnóstico.
B. Constipação e Incontinência Fecal
1- Constipação Funcional
O termo Constipação Funcional é utilizado para designar todas as crianças nas quais a constipação não apresenta uma etiologia orgânica. Estima-se que a incidência da constipação esteja presente entre 0,3% a 8% da população pediátrica e representa de 3% a 5% das visitas ao consultório do Pediatra generalista. Entretanto, representa uma taxa de até 25% das consultas ao Gastropediatra. Pesquisas clínicas têm demonstrado que uma história familiar positiva para constipação está presente entre 28% a 50% das crianças portadoras de constipação, e mais ainda, tem sido descrita uma incidência mais elevada em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos. O pico da incidência costuma ocorrer durante o treinamento do controle esfincteriano, entre os 2 e os 4 anos de idade, com maior prevalência entre os meninos. É importante ressaltar que a ocorrência de escape fecal (a passagem involuntária de material fecal na forma semi-líquida sujando a roupa íntima) é uma das manifestações clínicas mais comuns na criança com constipação funcional de longa duração e está presente em cerca de 85% dos casos. Esta situação profundamente desagradável é uma causa de grande desconforto social para criança e mesmo para seus familiares. A existência do escape fecal é um importante marcador para estabelecer a gravidade da constipação e também funciona como um bom monitoramento para avaliar a eficácia do tratamento.
A queixa de evacuação dolorosa tem sido considerada um valoroso dado da história clínica como um fator causal do comportamento de retenção das fezes. A presença de um grande bolo fecal palpável na fossa ilíaca esquerda antes da criança ter evacuado, ou até mesmo após uma evacuação que freqüentemente obstrui o vaso sanitário, é um sinal marcante da constipação. A evacuação dolorosa dessa massa fecal provoca grande temor na criança e acarreta um desejo de evitar a exoneração fecal posteriormente.
É necessária a obtenção de uma história clínica detalhada do hábito intestinal desde o nascimento, identificar o momento que surgiu o problema, investigar as características das fezes (freqüência, consistência, calibre e volume), saber da presença de sintomas associados (dor à evacuação, dor abdominal, presença de sangue nas fezes ou no papel higiênico e escape fecal), comportamento de retenção, problemas urinários e deficiências neurológicas. Em algumas circunstâncias o escape fecal é confundido com diarréia pelos familiares em virtude do seu aspecto ser líquido ou semi-líquido. É importante realizar a inspeção clínica da região perineal e peri-anal para excluir defeitos da medula espinhal. O toque retal deve sempre ser realizado após ter sido obtida a confiança da criança.
Para a caracterização diagnóstica da Constipação Funcional devem ser incluídas 2 ou mais das seguintes manifestações clínicas em uma criança de pelo menos 4 anos de idade:
1. Duas ou menos evacuações por semana.
2. Pelo menos 1 episódio de escape fecal por semana.
3. História de postura de retenção ou retenção consciente excessiva das fezes.
4. História de evacuação dolorosa ou fezes endurecidas.
5. Presença de bolo fecal no reto.
6. História de fezes de grande calibre que obstrui o vaso sanitário.
7. Estas manifestações devem ocorrer pelo menos uma vez por semana durante pelo menos 2 meses antes do diagnóstico.
2- Incontinência Fecal Não Retentora
A incontinência fecal não retentora se caracteriza pela evacuação completa do conteúdo do reto em local inapropriado, fora do vaso sanitário, por uma criança acima dos 4 anos de idade e que não apresenta evidências de retenção fecal.
A incontinência fecal tem sido relatada ocorrer em cerca de 3% das consultas da especialidade, sendo a prevalência mais alta nas crianças entre 5 a 6 anos de idade (4,1%) do que nos adolescentes entre 11 e 12 anos (1,6%); além disso tem sido mais freqüentemente descrita entre meninos do que em meninas pertencentes a famílias de nível sócio-econômico mais vulnerável.
Para a caracterização diagnóstica da Incontinência Fecal Não Retentora devem ser incluídas todas as seguintes manifestações nas crianças acima dos 4 anos de idade e que perdurem por pelo menos 2 meses:
1. Evacuação completa em locais inapropriados ao contexto social pelo menos uma vez por mês.
2. Não há evidência de processos inflamatórios, anatômicos metabólicos ou neoplásicos que possam explicar os sintomas.
3. Não há evidência de retenção fecal.
As AFGs continuam a ser um grande dasafio para o clínico, quer seja na compreensão dos mecanismos fisiopatológicos deflagradores dos sinais e sintomas, bem como na própria abordagem terapêutica dos mesmos. Muitas questões referentes aos mecanismos íntimos da fisiopatologia, tais como as interações entre o sistema nervoso central, o sistema nervoso entérico e o sistema imunológico, um melhor conhecimento do comportamento biopsicosocial dos pacientes e eventuais propostas terapêuticas ainda permanecem obscuras. Faz-se necessário, portanto, que esforços sejam concentrados em trabalhos de pesquisa para a aquisição de maiores esclarecimentos a respeito de um problema que afeta um grande número de crianças e adolescentes em todo o universo.
Os Comitês de experts de ambos os grupos etários considerados, - lactentes e pré-escolares - escolares e adolescentes -, conscientes das limitações existentes quanto às deficiências dos conhecimentos acima referidos, fazem recomendações para que os pesquisadores da área realizem pesquisas, cujos desenhos de estudo possam contemplar as lacunas científicas ainda pendentes. Entretanto, a iniciativa de propor uma classificação das AFGs em Pediatria, o que ocorreu pela primeira vez com a elaboração dos critérios de Roma II, e que avançou sobremaneira com os critérios de Roma III, constituiu-se em um passo extremamente importante para estabelecer parâmetros diagnósticos e possivelmente melhores compreensões sobre os seus transtornos fisiopatológicos, até o presente desconhecidos. Esperamos, portanto, com entusiasmo a chegada para dentro em breve dos critérios de Roma IV. Da minha parte, assim que novos conhecimentos cientificamente comprovados e de significativa importância clínica estejam disponíveis na literatura médica, retornarei a discutir este fascinante capítulo da Gastropediatria.
6- Dor Abdominal Funcional da Infância e
7- Síndrome da Dor Abdominal na Infância
Nestas duas entidades uma limitada, porém, razoável investigação laboratorial de rastreamento para descartar algumas enfermidades de origem orgânica deve incluir hemograma completo, velocidade de hemosedimentação, proteína C reativa, urina tipo I e cultura. Outros perfis bioquímicos, tais como, hepáticos e renais, bem como exames diagnósticos (cultura de fezes, parasitológico de fezes e teste do Hidrogênio no ar expirado para detectar má absorção aos caboidratos) também são recomendáveis dependendo dos sintomas predominantes referidos pelo paciente, do grau de limitação funcional ou mesmo da intensidade da ansiedade familiar.
Para a caracterização diagnóstica da Dor Abdominal Funcional da Infância devem ser incluídas todas as seguintes manifestações:
1. As manifestações clínicas devem ocorrer pelo menos uma vez por semana durante pelo menos 2 meses.
2. A dor abdominal pode ser episódica ou contínua.
3. Não há evidência de processos inflamatórios, anatômicos metabólicos ou neoplásicos que possam explicar os sintomas.
Para a caracterização diagnóstica da Síndrome da Dor Abdominal Funcional da Infância a dor abdominal deve estar presente em pelo menos 25% do tempo e 1 ou mais dos seguintes sintomas devem estar incluídos:
1. Alguma perda da capacidade funcional diariamente.
2. Algum sintoma somático adicional, tal como dor de cabeça, dores nos membros e/ou dificuldade para dormir, deve estar presente.
Em minha opinião levando-se em consideração os muitos anos de experiência profissional intensamente por mim vividos nesta especialidade, entendo que estas duas entidades rotuladas pelo Comitê de experts de forma individualizada, representam nada mais do que uma discreta variante da Síndrome do Intestino Irritável. Ao meu ver esta dicotomia da classificação traz mais confusão do que esclarecimento diagnóstico.
B. Constipação e Incontinência Fecal
1- Constipação Funcional
O termo Constipação Funcional é utilizado para designar todas as crianças nas quais a constipação não apresenta uma etiologia orgânica. Estima-se que a incidência da constipação esteja presente entre 0,3% a 8% da população pediátrica e representa de 3% a 5% das visitas ao consultório do Pediatra generalista. Entretanto, representa uma taxa de até 25% das consultas ao Gastropediatra. Pesquisas clínicas têm demonstrado que uma história familiar positiva para constipação está presente entre 28% a 50% das crianças portadoras de constipação, e mais ainda, tem sido descrita uma incidência mais elevada em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos. O pico da incidência costuma ocorrer durante o treinamento do controle esfincteriano, entre os 2 e os 4 anos de idade, com maior prevalência entre os meninos. É importante ressaltar que a ocorrência de escape fecal (a passagem involuntária de material fecal na forma semi-líquida sujando a roupa íntima) é uma das manifestações clínicas mais comuns na criança com constipação funcional de longa duração e está presente em cerca de 85% dos casos. Esta situação profundamente desagradável é uma causa de grande desconforto social para criança e mesmo para seus familiares. A existência do escape fecal é um importante marcador para estabelecer a gravidade da constipação e também funciona como um bom monitoramento para avaliar a eficácia do tratamento.
A queixa de evacuação dolorosa tem sido considerada um valoroso dado da história clínica como um fator causal do comportamento de retenção das fezes. A presença de um grande bolo fecal palpável na fossa ilíaca esquerda antes da criança ter evacuado, ou até mesmo após uma evacuação que freqüentemente obstrui o vaso sanitário, é um sinal marcante da constipação. A evacuação dolorosa dessa massa fecal provoca grande temor na criança e acarreta um desejo de evitar a exoneração fecal posteriormente.
É necessária a obtenção de uma história clínica detalhada do hábito intestinal desde o nascimento, identificar o momento que surgiu o problema, investigar as características das fezes (freqüência, consistência, calibre e volume), saber da presença de sintomas associados (dor à evacuação, dor abdominal, presença de sangue nas fezes ou no papel higiênico e escape fecal), comportamento de retenção, problemas urinários e deficiências neurológicas. Em algumas circunstâncias o escape fecal é confundido com diarréia pelos familiares em virtude do seu aspecto ser líquido ou semi-líquido. É importante realizar a inspeção clínica da região perineal e peri-anal para excluir defeitos da medula espinhal. O toque retal deve sempre ser realizado após ter sido obtida a confiança da criança.
Para a caracterização diagnóstica da Constipação Funcional devem ser incluídas 2 ou mais das seguintes manifestações clínicas em uma criança de pelo menos 4 anos de idade:
1. Duas ou menos evacuações por semana.
2. Pelo menos 1 episódio de escape fecal por semana.
3. História de postura de retenção ou retenção consciente excessiva das fezes.
4. História de evacuação dolorosa ou fezes endurecidas.
5. Presença de bolo fecal no reto.
6. História de fezes de grande calibre que obstrui o vaso sanitário.
7. Estas manifestações devem ocorrer pelo menos uma vez por semana durante pelo menos 2 meses antes do diagnóstico.
2- Incontinência Fecal Não Retentora
A incontinência fecal não retentora se caracteriza pela evacuação completa do conteúdo do reto em local inapropriado, fora do vaso sanitário, por uma criança acima dos 4 anos de idade e que não apresenta evidências de retenção fecal.
A incontinência fecal tem sido relatada ocorrer em cerca de 3% das consultas da especialidade, sendo a prevalência mais alta nas crianças entre 5 a 6 anos de idade (4,1%) do que nos adolescentes entre 11 e 12 anos (1,6%); além disso tem sido mais freqüentemente descrita entre meninos do que em meninas pertencentes a famílias de nível sócio-econômico mais vulnerável.
Para a caracterização diagnóstica da Incontinência Fecal Não Retentora devem ser incluídas todas as seguintes manifestações nas crianças acima dos 4 anos de idade e que perdurem por pelo menos 2 meses:
1. Evacuação completa em locais inapropriados ao contexto social pelo menos uma vez por mês.
2. Não há evidência de processos inflamatórios, anatômicos metabólicos ou neoplásicos que possam explicar os sintomas.
3. Não há evidência de retenção fecal.
As AFGs continuam a ser um grande dasafio para o clínico, quer seja na compreensão dos mecanismos fisiopatológicos deflagradores dos sinais e sintomas, bem como na própria abordagem terapêutica dos mesmos. Muitas questões referentes aos mecanismos íntimos da fisiopatologia, tais como as interações entre o sistema nervoso central, o sistema nervoso entérico e o sistema imunológico, um melhor conhecimento do comportamento biopsicosocial dos pacientes e eventuais propostas terapêuticas ainda permanecem obscuras. Faz-se necessário, portanto, que esforços sejam concentrados em trabalhos de pesquisa para a aquisição de maiores esclarecimentos a respeito de um problema que afeta um grande número de crianças e adolescentes em todo o universo.
Os Comitês de experts de ambos os grupos etários considerados, - lactentes e pré-escolares - escolares e adolescentes -, conscientes das limitações existentes quanto às deficiências dos conhecimentos acima referidos, fazem recomendações para que os pesquisadores da área realizem pesquisas, cujos desenhos de estudo possam contemplar as lacunas científicas ainda pendentes. Entretanto, a iniciativa de propor uma classificação das AFGs em Pediatria, o que ocorreu pela primeira vez com a elaboração dos critérios de Roma II, e que avançou sobremaneira com os critérios de Roma III, constituiu-se em um passo extremamente importante para estabelecer parâmetros diagnósticos e possivelmente melhores compreensões sobre os seus transtornos fisiopatológicos, até o presente desconhecidos. Esperamos, portanto, com entusiasmo a chegada para dentro em breve dos critérios de Roma IV. Da minha parte, assim que novos conhecimentos cientificamente comprovados e de significativa importância clínica estejam disponíveis na literatura médica, retornarei a discutir este fascinante capítulo da Gastropediatria.
2 comentários:
Qual é o tratamento indicado no caso da incontinência fecal não retentora?
Inicialmnte é necessário certificar-se de que realmente se trata de incontinência fecal por meio da história clínica e descartar escape fecal. Uma vez caracterizada clinicamente é imperioso investigar a causa da incontinência fecal e o melhor método é por meio da manometria ano-retal. O tratamento irá depender da etiologia do processo.
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