quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Colite Ulcerativa de grau moderado: revisão do manejo terapêutico (Parte 1)



Prof. Dr. Ulysses Fagundes Neto

O número de fevereiro de 2019 da revista Gastroenterology apresenta uma publicação de Siddharth Singh e cols. intitulada: AGA Technical Review on the Management of Mild-to-Moderate Ulcerative Colitis, cujo resumo abaixo encontra-se transcrito:

Introdução

A Colite Ulcerativa (CU) é uma enfermidade inflamatória intestinal que provoca incapacitação crônica e que geralmente perdura ao longo de toda a vida. Trata-se de uma enfermidade cuja incidência continua a aumentar e a maioria dos pacientes apresenta um curso de grau leve a moderado, geralmente mais ativa no momento do diagnóstico, e posteriormente com variáveis períodos de remissão; cerca de 14 a 17% dos pacientes podem sofrer um curso mais agressivo. Além de um significativo impacto na qualidade de vida, devido aos sintomas debilitantes a CU está também associada com o risco aumentado de câncer colo-retal. De uma maneira geral, cerca de 2/3 dos pacientes com CU, têm a doença limitada ao reto ou ao cólon esquerdo no momento do diagnóstico, e, aproximadamente ¼ dos pacientes com CU limitada, ela se estende com o passar do tempo, usualmente dentro dos primeiros 10 anos a partir do diagnóstico, com riscos mais elevados caso a enfermidade não seja adequadamente controlada.

Nas coortes populacionais mais de 90% dos pacientes são tratados com 5-aminossalicilatos (5-ASA), dentro do primeiro ano do diagnóstico, para o manejo da CU, e, no seguimento de longo termo, 60 a 87% dos pacientes continuam utilizando 5-ASA; somente 50% dos pacientes recebem corticoesteróides durante o curso da sua enfermidade, sendo que o uso de terapia com imunosupressores (20%), e, biológicos (5-10%), apresentam taxas ainda mais baixas. Embora considerável atenção tenha sido dada ao manejo de pacientes com CU moderada a grave, com alto risco de colectomia, a maioria dos pacientes com CU apresenta atividade da enfermidade de leve a moderada com baixo risco de colectomia. O manejo exitoso de pacientes com CU, baseia-se nos seguintes pontos, a saber: o acurado risco de estratificação, com identificação preditiva precoce do curso, moderado versus grave, um escalonamento terapêutico apropriadamente agressivo, e, um  rigoroso monitoramento dos pacientes que apresentam alto risco de colectomia; e um manejo ótimo dos pacientes com baixo risco de colectomia com atividade da enfermidade de leve a moderada, com a expectativa de que um controle ótimo irá reduzir o risco da progressão da enfermidade e suas respectivas complicações.

Objetivos 

O objetivo deste trabalho de revisão focaliza as opções de tratamento para o manejo de pacientes ambulatoriais com CU, que apresentam atividade de leve a moderada, cuja maioria deles apresenta baixo risco para colectomia.  A classificação da atividade da CU de leve a moderada é vagamente baseada nas pontuações dos critérios de Trulove-Witts e da Mayo Clinic, a saber: pacientes com menos de 4-6 evacuações diárias, discreto a moderado sangramento retal, ausência de sintomas clínicos e baixos agravos inflamatórios baseados nas avaliações bioquímicas e endoscópica, e ausência de aspectos sugestivos de alto grau de gravidade da enfermidade (ausência de úlceras endoscópicas profundas, altos agravos inflamatórios, hospitalizações repetidas e dependência de corticoesteróides). A extensão da enfermidade baseou-se na classificação de Montreal, como se segue: extensa (estendendo-se além da flexura esplênica), cólon esquerdo (até a flexura esplênica) e proctite. Foram endereçadas as seguintes questões para serem respondidas, a saber:

1) eficácia e tolerabilidade comparativas entre diferentes regimes terapêuticos orais com 5-ASA (sulfasalazina, 5-ASAs tais como Balsalazida e Olsalazida, e mesalamina) para indução e manutenção da remissão nos pacientes com CU extensa de grau leve a moderado.

2) eficácia e tolerabilidade comparativas entre regimes terapêuticos com diferentes doses de mesalamina (baixa - {menor que 2g/dia} versus padrão {2-3g/dia} versus  alta – {maior que 3g/dia}; uma vez ao dia versus  múltiplas vezes ao dia, oral versus  retal versus oral + retal), para indução e manutenção da remissão nos pacientes com CU extensa de grau leve a moderado. 

3) eficácia e tolerabilidade comparativas no uso da 5-ASA retal e formulações com corticoesteróides para indução e manutenção da remissão nos pacientes com proctosigmoidite ou proctite ulcerativa.

4) papel da budesonida no manejo dos pacientes com CU de leve a moderada.

5) papel das terapêuticas alternativas, tais como, probióticos e curcumina no manejo da CU de leve a moderada.         

Resultados 

Questão 1: Em pacientes com CU extensa de leve a moderada, qual a dose de mesalamina é eficaz para induzir a remissão e sua manutenção?

Embora todas as doses de mesalamina são efetivas, o padrão e a dose elevada são mais eficazes do que as doses baixas para induzir a remissão e a manutenção. Considerando-se que a ausência de toxicidade dose/dependente e o risco potencial de controle sub ótimo da enfermidade, com dose baixa de mesalamina, a dose padrão deve ser a preferida como estratégia terapêutica quando esses medicamentos são utilizados. A magnitude dos benefícios com doses elevadas de mesalamina sobre a dose padrão foram pequenos, e esta estava associada com doses mais elevadas. Alta dose de mesalamina pode ser levada em consideração para a indução da remissão em um subgrupo de pacientes com alto risco de fracasso terapêutico antes de se subir no escalonamento para tratamento com drogas imunossupressoras, tais como nos pacientes virgens de tratamento, com atividade moderada da enfermidade, pacientes com respostas sub ótimas à dose padrão, e naqueles pacientes que necessitam do uso de corticoesteróides para alcançar a remissão. O benefício da continuidade de altas doses de mesalamina para a manutenção da remissão não está claramente comprovado, com grau de confiança moderado nas avaliações do apoio, como apenas um pequeno benefício, em relação à dose padrão de mesalamina.

Questão 2: Nos pacientes com CU extensa de leve a moderada, são os 5-Aminosalicilatos ligados ao diazo (Balsalazide, Olsalazine) eficazes para indução da remissão e sua manutenção? 

Baseados nas evidências existentes, os medicamentos 5-ASA ligados ao diazo são eficazes e constituem uma alternativa segura à mesalamina para o tratamento da maioria dos pacientes com CU de leve a moderada. A potencial superioridade observada nos 5-ASA ligados ao diazo sobre a mesalamina, deve ser observada com cautela, posto que a Olsalsazine, mas não a Balsalazide, apresenta efeito colateral dose/dependente, com diarreia secretora em até 20% dos pacientes, o que pode ser um fator limitante à sua tolerabilidade, especialmente para o tratamento de manutenção.

Questão 3: Nos pacientes com CU extensa de leve a moderada, é a sufasalazina eficaz para indução da remissão e sua manutenção? 
A sulfasalazina é metabolizada pela flora colônica em sulfapiridina e 5-ASA, as quais agem como agentes antiinflamatórios. A sulfasalazina é uma opção eficaz para a indução da remissão e da manutenção do tratamento, embora pode não ser tão eficaz quanto a dose padrão de mesalamina. A sulfasalazina especialmente em doses elevadas, pode não ser bem tolerada, o que limita a graduação da dose nos pacientes com respostas sub ótimas, enquanto a dose de mesalamina pode ser escalonada usualmente sem apresentar quaisquer eventos adversos. Consequentemente, a mesalamina pode ser a opção preferencial do tratamento para a maioria dos pacientes com CU de leve a moderada.  Entretanto, os pacientes que tenham tolerado e alcançado a remissão com a sulfasalazina toleram-na bem a longo prazo, e, portanto, podem ser mantidos com o mesmo esquema terapêutico. Além disso, a sulfasalazina pode ser benéfica nos pacientes que apresentam colite associada a artralgias posto que esta droga é eficaz no manejo da artrite reumatoide leve.

Questão 4: Nos pacientes com CU extensa de leve a moderada, é o tratamento combinado oral e retal com 5-ASA superior ao tratamento oral com 5-Aminosalicilato para a indução da remissão e sua manutenção?   

A otimização do tratamento com 5-ASA é um passo crítico antes de ser escalonado para o tratamento com drogas imunossupressoras nos pacientes com CU de leve a moderada. Com evidência de moderada qualidade para apoiar o benefício do tratamento combinado oral + retal com 5-ASA sobre a dose padrão 5-ASA, este regime terapêutico combinado trata-se de uma estratégia potencialmente eficaz para todos os pacientes com CU extensa de leve a moderada, particularmente naqueles cujo controle clínico com a terapia oral 5-ASA isolada mostra-se sub ótimo, ou mesmo naqueles pacientes que apresentam atividade moderada da enfermidade. Entretanto, alguns estudos têm demostrado uma baixa adesão ao tratamento retal e a maioria dos pacientes tem desejado reservar o tratamento retal como um auxiliar para ser utilizado durante os períodos de inflamação aguda.

Referências Bibliográficas
1)   Singh S. e cols. Gastroenterology 2019;158:769-808.
2)   Roda G e cols. Aliment Farmacol Ther 2017; 45:1481-92.
3)   Ng SC e cols. Lancet 2018; 390:2769-78.
4)   Frolkis AD e cols. Gastroenterology 2013; 145:996-1006.



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