Fatores
relacionados com a capacidade de se alimentar
Experiências
de incapacidade de alimentação devido a enfermidades, lesões ou desenvolvimento
retardado, podem levar a um prejuízo na capacidade da alimentação. Retardo no
desenvolvimento do sistema nervoso, inibindo a alimentação, pode se tornar
evidente em qualquer momento nos primeiros anos de vida, durante períodos de
mudanças na anatomia orofaríngea e na coordenação neuromuscular, mudanças de
texturas e transições dos utensílios para se alimentar e/ou beber. Prejuízos
específicos no funcionamento sensor, motor, oral e faríngeo, podem também
inibir a capacidade de se alimentar. Além disso, experiências orais alteradas
devido a lesões físicas, deficiências da função neurológica, função ou
estrutura oral anormal, e/ou experiências alimentares adversas ou limitadas,
também podem causar prejuízo na capacidade de se alimentar.
O
prejuízo da função sensorial oral inibe e/ou limita a aceitação e a
tolerância de líquidos e das texturas dos alimentos esperados para uma
determinada idade; este prejuízo pode estar associado com características
específicas dos líquidos e das texturas dos alimentos, tais como, sabor, temperatura, tamanho do bolus, viscosidade, textura ou aparência. A
hipossensibilidade é geralmente caracterizada pela falta de percepção do
alimento no interior da boca, a limitação da formação do bolus, a perda
do alimento pela boca, aumento do tamanho do bolus e engasgos ou recusa
de líquidos e texturas dos alimentos que não fornecem adequado estímulo
sensorial. Estas crianças, caracteristicamente buscam um aumento do tamanho do bolus
ou de sabores exagerados, temperaturas e texturas. Hipersensibilidade está
geralmente caracterizada por engasgos com texturas especificas ou tamanho do bolus,
excessiva mastigação e variedade de ingestão. Estas crianças buscam caracteristicamente
sabores amenos, finamente granulados, bolus pequenos e alimentos na
temperatura ambiente.
O
prejuízo da função oral motora limita o controle do bolus,
manipulação e/ou o trânsito de líquidos ou sólidos; este fator pode ser
caracterizado por ingestão ineficiente, alimentação confusa, baixo controle de
líquidos e alimentos, formação e propulsão do bolus de forma lenta ou
ineficaz, engasgos durante a formação do bolus, e a existência de
resíduos pós deglutição.
Embora
o clínico possa avaliar as fases orais visualmente, a avaliação das estruturas
faríngeas e suas funções requerem avaliação instrumental, utilizando a
deglutição de bário modificado ou a avaliação da deglutição com o endoscópio de
fibra ótica. Um prejuízo na sensação faríngea, inibe a proteção aérea e eficaz
da deglutição; ela está geralmente associada com deglutição retardada e incoordenada
durante o trânsito faríngeo, pouca percepção da localização do bolus,
presença de resíduo faringiano após a deglutição e aspiração silenciosa. Uma característica
clínica de deficiência sensorial, pode incluir deglutição audível e ausência na
tentativa de eliminar o resíduo após a deglutição.
O
prejuízo da função motora faríngea inibe os movimentos faríngeos. Ele pode ser
evidenciado pela redução da força da coordenação dos constritores faríngeos,
elevação laríngea e fechamento da prega vocal. Os sintomas podem incluir
múltiplos esforços para deglutir o bolus, inabilidade para eliminar o
resíduo faríngeo e ineficiente proteção das vias áreas.
Disfunção
baseada na capacidade de se alimentar
A
capacidade de se alimentar na infância, para ser totalmente funcional,
necessita ser segura, apropriada para a idade e eficaz. A disfunção em
quaisquer destas áreas constitui uma deficiência da alimentação.
Alimentação
oral não segura pode apresentar sufocação, aspiração e sinais
cardiorrespiratórios adversos (apneia e bradicardia) durante as alimentações
orais ou outros eventos adversos no momento da refeição (engasgos, vômitos,
fadiga, recusa alimentar).
Capacidade
retardada para se alimentar pode estar presente quando a
criança é incapaz de consumir líquidos e alimentos com textura apropriados para
a idade. A criança pode requerer uma modificação da comida ou do líquido, desde
a sua forma original, como por exemplo, amassando os sólidos até a formação de
um purê. Essas crianças podem apresentar deficiência no uso dos utensílios de
alimentação ou mesmo em se auto alimentar.
Alimentação
oral ineficiente pode ser representada por duração
prolongada da comida na cavidade bucal ou ingestão oral inadequada.
Fatores
Psicossociais
Fatores
íntimos relacionados à criança, o cuidador e o ambiente da alimentação, podem
afetar de forma adversa o momento da refeição e definitivamente contribuir para
a ocorrência e/ou perpetuação do transtorno alimentar.
Prejuízos
psicossociais
Fatores
psicossociais da criança e/ou do cuidador podem contribuir
para a disfunção alimentar.
Fatores
do desenvolvimento resultando em retardo das habilidades
motoras, linguagem, socialização e do conhecimento podem contribuir para o
surgimento do transtorno alimentar.
Problemas
mentais e de saúde comportamental da criança, do cuidador, ou
em ambos podem influir de forma adversa no comportamento alimentar.
Influências
sociais incluindo as interações criança-cuidador e expectativas
culturais no momento do contexto da refeição podem impactar no comportamento da
criança a respeito da alimentação.
Fatores
ambientais podem contribuir para o desenvolvimento de
transtornos alimentares. Durante as refeições um meio ambiente de distração, como
por exemplo, o uso de televisão ou outros aparelhos eletrônicos, ou o ato de
recorrer a artifícios tais como, alimentar a criança somente quando ela estiver
sonolenta ou mesmo adormecida, podem ser um fator inadvertido para causar
comportamento inadequado.
Disfunção
psicossocial
Transtorno
alimentar pode ocorrer como resultado dos prejuízos acima descritos e
geralmente se manifestam das seguintes formas, a saber: (As Figuras 3-4-5-6-7
abaixo ilustram os diferentes tipos de Transtornos Alimentares em decorrência
de fatores psicossociais).
Aversões
aprendidas durante a refeição que resultam quando
uma criança sofre repetidamente desconfortos físicos ou emocionais durante as
refeições.
Figura
3
Estresse
ou angústia da criança e/ou cuidador são expressas como
emoções negativas decorrente das refeições.
Figura
4
Comportamentos
disruptivos, tais como empurrar o prato de comida para
longe (recusa), agressividade contra o cuidador, escapar do ambiente da
refeição ou mesmo recusar a se auto alimentar.
Figura
5
Hiperexigência
na
seleção da comida e a recusa em provar novos alimentos a despeito da criança
ter habilidade para comer uma dieta mais diversa.
Figura
6
Estratégias
inapropriadas utilizadas pelo cuidador com o intuito de
melhorar o estado nutricional da criança.
Figura
7
Conclusões
A despeito
de que nem todas as crianças que sofrem de transtornos alimentares apresentem
deficiências em todos os 4 domínios anteriormente referidos, a avaliação
inicial de cada um destes domínios é fortemente recomendada. Esta conduta deve
ser realizada porque os mesmos sinais e sintomas apresentados podem render recomendações
complementares de domínio específicas, necessárias para o sucesso do tratamento,
em promover a melhor forma da função desejada.
Por
meio da utilização de uma terminologia consistente, detalhada e
interdisciplinar que consiga englobar ambos, o prejuízo fisiológico e a função,
essas definições têm o potencial para facilitar a colaboração interdisciplinar,
promover um currículo educacional para o treinamento dos profissionais da
saúde, e permitir a comparação dos desfechos entre os estudos (pesquisas) e os
programas clínicos. Esta proposta, por sua vez, pode levar ao reconhecimento do
diagnóstico específico dos subtipos de transtornos alimentares, proporcionando
assim implicações no possível êxito terapêutico e no respectivo
prognóstico.
Referências
Bibliográficas
1-
Godoy PS & cols. -JPGN 2019;68:124-29.
2-
Jadcherla
S – Am J Clin Nutr 2016;103:622-28.
3-
Becker
P & cols. – Nutr Clin Pract 2015;30:147-61.
4- Chandran JL & cols. – Int J Eat Disord 2015;48:1176-9.
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