segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Reações de Fermentação: aquilo que vale a pena saber a respeito delas (Parte 2)

Ulysses Fagundes Neto
Diretor Médico do IGASTROPED
(www.igastroped.com.br)

Fermentação Alcoólica

O termo fermentação vem do latim “fervere”, que significa ferver.
Foi Pasteur, há pouco mais de um século, quem demonstrou que a fermentação alcoólica é realizada por micro-organismos na ausência de oxigênio. Atualmente, por fermentação alcoólica entende-se um conjunto de reações bioquímicas provocadas por micro-organismos chamados leveduras, que atacam fundamentalmente os carboidratos da uva (glicose e frutose), transformando-os principalmente em álcool etílico e gás carbônico. Na superfície da casca da uva, existe uma grande quantidade destes fungos. O bagaço da uva não é liso, sua epiderme é recoberta por uma matéria cerosa chamada previna, que retém os micro-organismos. Na previna, junto às leveduras úteis, encontram-se diversos outros micro-organismos, sendo alguns deles desfavoráveis do ponto de vista técnico, como é o caso da bactéria acética (Figura 10).
Figura 10- Fase inicial do processo de vinificação.
O processo de fermentação alcoólica caracteriza-se como uma via catabólica, na qual há degradação das moléculas do carboidrato (glicose ou frutose), no interior da célula dos micro-organismos (levedura ou bactéria) até a formação de etanol e CO2, acarretando liberação de energia química e térmica.
O piruvato (proveniente da glicólise) sofre descarboxilação em uma reação irreversível catalisada pela enzima piruvato descarboxilase. É uma reação de descarboxilação simples e não envolve a oxidação do piruvato. A piruvato descarboxilase requer Mg2+ e possui uma coenzima firmemente ligada, a tiamina pirofosfato (TPP), que é um cofator essencial para a piruvato-descarboxilase. Esse cofator irá proporcionar estabilidade à reação de troca de carga negativa.
Por meio da ação da álcool-desidrogenase, o acetaldeído é reduzido a etanol, com o NADH, derivado da atividade da gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase, fornecendo o poder redutor. Portanto, os produtos finais da fermentação alcoólica são:

Glicose + 2ADP + 2 Pi = 2 etanol + 2 CO2 + 2 ATP + 2 H2O

É importante ressaltar que, como a quantidade de NADH é limitada e ele é necessário estar presente na sua forma oxidada (NAD+) na glicólise e, consequentemente, na continuação do processo de produção de energia, o NADH tem que ser oxidado. Essa é a importância da realização da fermentação.
O CO2 produzido na descarboxilação do piruvato pelas leveduras é o responsável pela carbonatação caraterística do champanhe e da cerveja, assim como pelo crescimento da massa do pão e do bolo (Figura 11).
Figura 11– Fermentação alcoólica na produção do pão.
O processo de fabricação da cerveja, cujos subprodutos álcool etílico e CO2 (gás carbônico) são obtidos a partir do consumo de açúcares presentes no malte, é realizado através da cevada germinada. Este é o mesmo processo usado no preparo da massa do pão e do bolo, onde as leveduras ou fungos consomem o carboidrato obtido do amido da massa do trigo, liberando CO2 (gás carbônico), o que aumenta o volume da massa.
A enzima álcool-desidrogenase está presente em muitos organismos que metabolizam o álcool, incluindo o ser humano. No fígado humano esta enzima catalisa a oxidação do etanol, quer ele seja ingerido quer ele seja produzido por micro-organismos intestinais, com a concomitante redução do NAD+ para NADH.
As leveduras que se destacam como produtoras do etanol são as espécies do gênero Saccharomyces, Schizosaccharamyes, Pichia e outras (Figura 12).
Figura 12 - Saccharomyces cerevisiae
Os critérios tecnológicos que fazem com que uma levedura seja utilizada comercialmente na fermentação alcoólica são o alto rendimento e a elevada produtividade, ou seja, rápida conversão de açúcar em álcool, com baixa produção de componentes secundários. A espécie mais importante de levedura alcóolica é a Saccharomyces cerevisiae, que possui um largo espectro de utilização, sendo empregada na produção de pães, bebidas alcoólicas, etanol, etc. Sua biomassa pode ser recuperada como subproduto da fermentação e transformada em levedura seca, que se constitui em matéria-prima para a fabricação de ração animal ou suplemento vitamínico para o ser humano.
A bactéria Zymomonas mobilis, que inicialmente foi isolada em mostos fermentadores de cidra, sucos fermentados de palmeiras, em cervejarias e engenhos de aguardente, apresentou habilidades promissoras de transformar açúcares em etanol e gás carbônico, em condições comparáveis a aquelas exibidas pelas leveduras. Zymomonas mobilis apresenta alto rendimento, tolerância a altas concentrações de glicose, habilidade de crescer em total anaerobiose, características que potencializam seu emprego em escala industrial.
Mecanismo da fermentação alcoólica
Atualmente a indústria enológica vai se direcionando cada vez mais para a utilização de fermento selecionado (leveduras selecionadas), no processo de vinificação (Figura 13).
Figura 13
A fermentação alcóolica ocorre devido ao fato de que as células do levedo produzem a energia que lhes é necessária para sobreviver, através de dois fenômenos de degradação da matéria orgânica: 1- a respiração que necessita do O2 do meio ambiente, ou 2- a fermentação que ocorre na ausência de O2.

Como anteriormente assinalado, em virtude de a fermentação alcóolica corresponder a uma baixa produção de energia, a levedura necessita transformar muito açúcar em álcool, para poder assegurar suas necessidades energéticas. Nessas condições a capacidade de multiplicação da levedura é baixa. Por outro lado, o rendimento da transformação do açúcar em álcool é grande em relação ao peso da levedura. A composição exata do açúcar foi determinada por Gay-Lussac. É ainda de sua autoria a equação que descreve a fermentação alcóolica:
C6H12O6 (glicose) = 2 C2H5OH (álcool etílico) + 2 CO2  

Ou seja, para cada 180g de glicose, resultam 92g de álcool etílico e 88g de CO2. Esta reação, apesar de representar a parte fundamental do processo não é, porém, completa, pois outras substâncias se formam além do álcool etílico e CO2.
A proporção de álcool contida no vinho é medida em graus alcoólicos, segundo o princípio de Gay-Lussac. Assim, por exemplo, quando se diz que um vinho tem 11ºGL significa que contém 11% do seu volume em álcool, ou seja, que em 100 ml do vinho considerado, 11 ml são álcool puro (anidro) (Figura 14).
 Figura 14- Representação esquemática das fases da produção do vinho.

Produção de etanol

Depois da água, o álcool é o solvente mais comum, além de representar a matéria-prima de maior uso no laboratório e na indústria química.  Na biossíntese do etanol são empregadas linhagens selecionadas de Saccharomyces cerevisae, que realizam a fermentação alcoólica, a partir de um carboidrato fermentável. É muito importante que a cultura da levedura possua um crescimento vigoroso e uma elevada tolerância ao etanol, pois desta forma a fermentação irá apresentar um grande rendimento final. 

O etanol, em altas concentrações, é inibidor e a tolerância das leveduras é um ponto crítico para uma produção elevada deste metabólito primário. A tolerância ao etanol varia consideravelmente de acordo com as linhagens de leveduras. De modo geral, o crescimento cessa quando a produção atinge 5% de etanol (v/v), e a taxa de produção é reduzida a zero, na concentração de 6 a 10% de etanol (v/v).   
O etanol pode ser produzido a partir de qualquer carboidrato fermentável pela levedura, a saber: sacarose, sucos de frutas, milho, melaço, beterrabas, batatas, malte, cevada, aveia, centeio, arroz, sorgo, entre outros (necessário hidrolisar os carboidratos complexos em açúcares simples fermentáveis, pelo uso de enzimas da cevada ou fúngicas, ou ainda pelo tratamento térmico do material acidificado).

Material celulósico, como madeira e resíduos da fabricação da pasta de papel podem ser utilizados. Por causa da grande quantidade de resíduos de material celulósico disponível, a fermentação direta desses materiais quando hidrolisados por enzimas celulolíticas pode ser de grande importância econômica.
Culturas mistas de Clostridium thermocellum e Clostridium thermosaccharolyticum podem ser usadas. Hemiceluloses e celuloses são hidrolisadas em monossacarídeos (hexoses e pentoses) por essas bactérias e os monossacarídeos são fermentados diretamente a etanol.
O etanol é também usado como combustível, e, no Brasil, a maior parte da produção de etanol é destinada para a indústria de combustíveis. Essa preferência é pelo fato de o etanol não produzir dióxido de enxofre quando é queimado, ao contrário da gasolina que polui a atmosfera.  
A produção de etanol feita a partir da cana-de-açúcar obedece aos seguintes procedimentos:  

1.   Moagem da cana: A cana passa por um processador, nessa etapa obtém-se o caldo de cana, também conhecido como garapa que contém um alto teor de sacarose, cuja fórmula é: C12H22O11.  

2.   Produção de melaço: O produto obtido no primeiro passo, a garapa, é aquecido para se obter o melaço, que consiste numa solução de aproximadamente 40% em massa, de sacarose. O açúcar mascavo é produzido quando parte dessa sacarose se cristaliza.  

3.   Fermentação do melaço: Neste momento, fermentos biológicos são acrescentados ao melaço, como por exemplo, o Saccharomyces, que é um tipo de levedura que faz com que a sacarose se transforme em etanol. A ação de enzimas é que realiza esse trabalho. Após esse processo, se obtém o mosto fermentado, que já contém até 12% de seu volume total em etanol.  

4.   Destilação do mosto fermentado: Nesta fase o produto, que no caso é o mosto, vai passar pelo processo de destilação fracionada e vai dar origem a uma solução cuja composição será: 96% de etanol e 4% de água. Existe uma denominação que é dada em graus, é o chamado teor alcoólico de uma bebida. No caso do etanol é de 96° GL (Gay-Lussac).

A cachaça é produzida da mesma forma que o álcool, com a única diferença, pois a coluna de destilação fracionada usada não precisa ser tão eficiente, podendo deixar passar mais água (em geral 60%, pois a cachaça tem teor alcoólico aproximadamente de 40º GL). A cachaça é considerada uma bebida alcoólica destilada (Figura 15).

Figura 15 –Processo de produção da cachaça.

Figura 16– Foto panorâmica de uma destilaria de cachaça.

Figura 17– Foto da cachaça recém produzida jorrando da bica de destilação.

Por outro lado, o vinho é uma bebida alcoólica não-destilada. O suco de uva sofre fermentação, após o que o líquido é filtrado e colocado em barris e garrafas. Pelo fato de não sofrer destilação, o sabor e o aroma de um vinho dependem muito do tipo de uva utilizado, pois as substâncias responsáveis pelo aroma e sabor da uva estarão presentes também no vinho, uma vez que não são separadas por destilação.
As bebidas não-destiladas apresentam teor alcoólico inferior ao das destiladas. Isso ocorre porque, quando o teor alcoólico chega a cerca de 15ºGL, os micro-organismos morrem e a fermentação se encerra. Na destilação, como o álcool é mais volátil que a água, o teor alcoólico aumenta.

Fermentação Malo-láctica
Muitos vinhos sofrem uma fermentação secundária, após a primeira que é a alcoólica.
Essa fermentação é provocada por bactérias lácticas, como por exemplo: Leuconostoc oinos, que transformam o ácido málico (dicarboxílico) em ácido láctico (monocarboxílico), de sabor mais aveludado, e em CO2. Em várias regiões do mundo, por motivos de origem climática, frequentemente são obtidos vinhos tintos com elevada acidez, que irão desta forma se beneficiar com essa segunda fermentação, posto que esta provoca uma redução na acidez (desacidificação biológica). Essa fermentação é normalmente desejável nos vinhos tintos, porém, nem sempre o é para os vinhos brancos.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Reações de Fermentação: aquilo que vale a pena saber a respeito delas (Parte 1)


Ulysses Fagundes Neto
Diretor Médico do IGASTROPED

Introdução

fermentação é um processo de obtenção de energia que ocorre sem a presença de oxigênio (O2), portanto, trata-se de uma via de produção de energia denominada anaeróbia. A fermentação compreende um conjunto de reações enzimaticamente controladas, através das quais uma molécula orgânica é degradada em compostos mais simples, liberando energia. Nesse processo, o aceptor final de elétrons é uma molécula orgânica. Essa via é muito utilizada por fungos, bactérias e células musculares esqueléticas do corpo humano, quando estas últimas estão em contração vigorosa e prolongada. A glicose é uma das substâncias mais empregadas pelos micro-organismos como ponto de partida da fermentação. É importante ressaltar que as reações químicas da fermentação são equivalentes às da glicólise, as quais ocorrem no fígado do organismo humano. A desmontagem da glicose é parcial e são produzidos resíduos de tamanho molecular maior que aqueles gerados na respiração aeróbia e o rendimento final da fermentação em produção de Adenosina Trifosfato (ATP) é baixo.

Na glicólise, cada molécula de glicose é desdobrada em 2 moléculas de ácido pirúvico, com liberação de hidrogênio e energia, por meio de várias reações químicas.

O hidrogênio combina-se com moléculas transportadoras de hidrogênio (NAD), formando NADH + H+, ou seja, NADH2 (Figura 1).

Figura 1- Processo da glicólise

No caso das células musculares estriadas, a fermentação ocorre no citosol e inicia-se com a glicólise, isto é, a quebra de glicose em duas moléculas de piruvato. Percebe-se, portanto, que inicialmente esse processo é semelhante à respiração celular. O piruvato recebe elétrons H+ provenientes da enzima aceptora de hidrogênio (NADH) e transforma-se em ácido láctico, que posteriormente é eliminado pela célula. Quando o ácido pirúvico é transformado em ácido láctico, dizemos que ocorreu uma fermentação láctica. A fermentação láctica é comum em células musculares quando submetidas a um esforço intenso e prolongado.

O piruvato pode também se transformar em álcool e CO2, que também são posteriormente eliminados. A substância a ser produzida depende do organismo em que o processo ocorre, mas quando se transforma em álcool, a fermentação é chamada de alcoólica.

Tanto na fermentação alcoólica quanto na láctica o NADH doa seus elétrons e é convertido em NAD+ (Figura 2).
Figura 2- Esquema que ilustra o processo das fermentações láctica e alcoólica a partir da glicose.

Diferentemente do ser humano, na indústria alimentícia a fermentação láctica é realizada pela utilização de bactérias, protozoários e fungos, para a produção de iogurte, coalhada e queijos. No caso da fermentação alcoólica, esta é usualmente realizada por leveduras e bactérias, sendo bastante explorada economicamente pela indústria, principalmente para a fabricação de alimentos como o pão, bolos e bebidas, tais como a cerveja, o vinho e os destilados.

É importante enfatizar que o rendimento da fermentação é bastante pequeno quando comparado ao da respiração aeróbica (Figura 3). 

Figura 3- Representação esquemática da respiração aeróbica.

Enquanto que no processo de fermentação são obtidas apenas 2 moléculas de ATP, na respiração aeróbica, há um saldo final muito maior, de 38 ATP (Figura 4).


Figura 4- Quadro comparativo entre a produção de energia na reação de fermentação e na respiração aeróbica.

Curiosidade: Quando o ser humano está praticando exercícios físicos extenuantes, frequentemente pode sentir dor muscular, que também é chamada de fadiga muscular. Isso ocorre porque as células musculares não recebem a quantidade necessária de oxigênio para realizar a respiração aeróbica e, então, passam a quebrar glicose de forma anaeróbia, produzindo ácido láctico. O acúmulo desse ácido faz com que as pessoas sintam dor muscular (Figura 5).
Figura 5- Representação esquemática da reação de fermentação láctica no músculo estriado submetido a grande esforço e exaustão.

A fermentação láctica nas células musculares é um processo que ocorre de forma alternativa, frente a situações em que o organismo não realiza respiração aeróbica. Este processo é considerado um artifício metabólico de curto prazo, que é ativado quando o organismo é submetido a um intenso esforço físico em condições de baixa oxigenação muscular. 

De acordo com Pasteur, tanto a velocidade da fermentação quanto a quantidade total de glicose por ela consumida eram muitas vezes maiores em condições anaeróbicas do que sob condições aeróbicas. O chamado efeito Pasteur ocorre porque o rendimento em ATP da glicólise, sob condições anaeróbicas (2 ATP por molécula de glicose) é muito menor do que a obtida na oxidação completa da glicose até o CO2 e H2O, sob condições aeróbicas (36 a 38 ATP por molécula de glicose). Portanto, para produzir a mesma quantidade de ATP, é necessário consumir perto de 18 vezes mais glicose em condições anaeróbicas do que em condições aeróbicas.

Vale ressaltar que a desvantagem anaeróbia em relação à aeróbia, consiste não somente na quantidade de ATP, mas aos efeitos fisiológicos causados. Em decorrência a extensos períodos de atividade fermentativa (exercícios físicos prolongados), as células musculares passam a acumular uma concentração muito elevada de ácido láctico, prejudicando o funcionamento da célula. 

Entre os efeitos provocados em defesa do metabolismo, o organismo passa a sentir dor e fadiga muscular, causada por uma contração arrítmica (gradativa ou repentina) atuando como sinal de alerta, induzindo o fim da atividade para o repouso e o restabelecimento da capacidade fisiológica do órgão (Figura 6).
Figura 6- Produção de lactato no músculo.

Isso ocorre à medida em que o excesso de ácido láctico se difunde para o fígado, onde é convertido em ácido pirúvico e posteriormente em glicose armazenada na forma de glicogênio, sendo a conversão denominada de gliconeogênese (Figura 7).


Figura 7- Esquema da gliconeogênese.

Por outro lado, no que diz respeito à fermentação alcoólica os seres humanos têm se beneficiado deste processo milhares de anos por meio da utilização de leveduras para produzir pão, cerveja e vinho, mas somente passaram a ter conhecimento da intimidade desta reação a partir dos últimos duzentos anos.
fermentação alcoólica, também conhecida como fermentação do etanol, é a via anaeróbia realizada por leveduras, na qual açúcares simples são convertidos em etanol e dióxido de carbono (Figura 8).
Figura 8- Representação da equação de produção do etanol.

Em alguns casos a fermentação é usada para modificar um material cuja transformação seria difícil ou muito cara, caso fossem escolhidos métodos químicos convencionais. A fermentação é sempre iniciada por enzimas que atuam como catalisadores naturais que provocam uma mudança química sem serem afetados por isto.
Os produtos da fermentação têm sido usados desde a antiguidade. Habitantes das cavernas descobriram que a carne envelhecida tem um sabor mais agradável que a carne fresca. Vinho, cerveja, e pão são tão velhos quanto a agricultura, e inclusive, foram encontrados pães nas pirâmides egípcias construídas há milhares de anos (Figura 9).
Figura 9- Produção do pão.
O queijo, que envolve a fermentação do leite, é outro alimento muito antigo e sua fabricação na China e no Japão era conhecida há milhares de anos. O valor medicinal de produtos fermentados é conhecido desde longa data. Os chineses usavam coalho de feijão-soja mofado para curar infecções de pele há 3.000 anos. Os nativos da América Central tratavam feridas infectadas com fungos.
O conhecimento íntimo da química das fermentações é uma ciência nova que ainda está em suas fases mais iniciais. É a base dos processos industriais que convertem matérias-primas como grãos, açúcares e subprodutos industriais em muitos produtos sintéticos diferentes. Cepas cuidadosamente selecionadas de mofos, leveduras e bactérias são usadas para estas transformações.
As primeiras plantas industriais a utilizar a tecnologia da fermentação foram as fábricas de cerveja. No entanto, foi somente no final do século XIX e início do século XX que essa tecnologia passou a ser gradativamente utilizada, tanto na indústria de bebidas e de alimentos, como na indústria química. A indústria química, nos primórdios do século XX, principiou a produção de solventes orgânicos. No início da I Guerra Mundial as necessidades de produzir acetona, composto orgânico importante para a produção de explosivos, estimularam substancialmente a pesquisa no potencial da tecnologia de fermentação.
Em 1923, Pfizer inaugurou a primeira fábrica para a produção de ácido cítrico por via fermentativa. O processo envolvia a fermentação utilizando o fungo Aspergillus niger, por meio do qual o açúcar era transformado em ácido cítrico.
Foi em uma descoberta casual que um funcionário de um mercado encontrou um melão embolorado por uma linhagem de Penicillium, a qual podia prosperar quando cultivada em tanques fundos com aeração, e que produzia duzentas vezes mais penicilina que o bolor de Fleming cultivado em meio sólido.

O progresso da fermentação prossegue a passadas largas. A cada ano novos produtos são incorporados à lista de produtos derivados da fermentação. Várias vitaminas são produzidas pelo emprego de etapas de fermentação em sua síntese (vitamina B-2 a riboflavina, vitamina B-12 a cianocobalamina e a vitamina C o ácido ascórbico).
Alguns dos bioprocessos mais interessantes são as desidrogenações e hidroxilações específicas do núcleo esteróide. Essas transformações são vias econômicas utilizadas na obtenção da cortisona, um potente agente anti-inflamatório e seus derivados.
O ácido cítrico é uma das muitas substâncias químicas produzidas por micro-organismos. É usado em limpadores de metal, bem como trata-se de um preservativo de alimentos, além de ser também um agente capaz de conferir melhor palatabilidade aos alimentos. O ácido cítrico é responsável pelo sabor azedo das frutas cítricas. Poderia ser obtido delas, mas necessitaria muitos milhares de frutos para produzir a mesma quantidade de ácido cítrico obtida pela fermentação do melado com o mofo do Aspergillus niger.
Na Tabela 1 estão listados os tipos de fermentação conhecidos.
Tabela 1- Tipos de Fermentação

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

ALLERGIC PROCTOCOLITIS IN INFANTS: analysis of the evolution of the nutritional status


Ludmilla S CAMARGO, Jonas AC SILVEIRA, José AAC TADDEI and Ulysses FAGUNDES-NETO

RESUMO

Objetivo: Avaliar a evolução antropométrica de lactentes com proctocolite alérgica (PA) no momento do diagnóstico e 1 a 6 meses da intervenção nutricional. Métodos: Coorte retrospectiva de lactentes com diagnóstico de PA acompanhados no Instituto de Gastroenterologia Pediátrica de São Paulo (IGASTROPED), Brasil. Os dados foram obtidos a partir dos prontuários de lactentes atendidos ambulatorialmente, coletando-se informações acerca do diagnóstico clínico, conduta terapêutica e dados antropométricos. A intervenção terapêutica foi caracterizada pela manutenção do aleitamento materno exclusivo com dieta de exclusão materna de seis alérgenos (AME-DEM) ou uso de fórmulas hipoalergênicas (FHA). Resultados: Dos 44 lactentes diagnosticados com PA, 23 eram do sexo feminino. A mediana de idade dos lactentes foi de 3,5 meses no momento da admissão e de 6 meses após a intervenção. A queixa clinica principal foi hematoquezia associada ou não a outros sintomas da PA. A análise da evolução antropométrica quando relacionada às dietas nos dois momentos da investigação não demonstrou diferença estatisticamente significante. Conclusão: A vigência da PA não provocou agravo do estado nutricional dos lactentes e apesar de diferentes intervenções nutricionais, os lactentes se mantiveram dentro do canal de crescimento e ocasionou o desaparecimento total dos sintomas clínicos. Além disso, destaca-se o papel benéfico do AME-DEM no processo de manutenção do estado nutricional do lactente.
Palavras chave: Colite, aleitamento materno, hipersensibilidade a leite, nutrição do lactente.

Introduction

Food allergy (FA) is an adverse reaction to food mediated immune mechanisms and may be the type IgE mediated, not IgE mediated and even the mixed form (1,5). The actual prevalence of FA is still unknown and any kind of protein food can trigger an allergic reaction. However, most of the food allergies cases is generated for a food group, and about 90% of the following food allergens are recognized: cow milk, egg, wheat, soy, corn, peanut, fish, seafood ​​and almonds (13).

Allergy to cow's milk protein (CMPA) occurs on a larger scale, which affects about 2% to 7% of infants in the first months of life, in this group age, the immune system is not fully yet developed to inflammatory response (11). Whereas food usually included in the diet of infants, replacing breastfeeding is cow's milk, this food is the main allergen directly connected to FA (6,2).

Allergic proctocolitis (AP) is a type of food allergy in a group of food hypersensitivities not IgE mediated, also called eosinophilic proctocolitis. The AP pathophysiological mechanism has not fully identified, but it is known that involves the presence of CD8 and TH-2 type cells and eosinophil infiltration in all mucosal layers. Moreover, the presence of current memory cells revealed by testing positive lymphocyte transformation suggests the involvement of T cells in the pathogenesis of AP, associated with the secretion of alpha tumor necrosis factor by activated lymphocytes. Everything suggests that genetic factors exert important role in the expression of FA, since a high incidence of atopy history in the families of children with allergy proctocolitis have been described (8).

AP commonly affects infants in the first months of life. It is a transitory disease, which in most cases disappears around the first year of life. The primary cause is the cow´s milk protein and / or soybean associated with breastfeeding, as we know that the diet of breastfeeding act directly in infant feeding.

The clinical manifestations are recurrent and the main complaints are diarrhea, blood in the stool (hematochezia), cramps, intense irritability and difficulty breastfeeding (7).

Considering that, the clinical manifestations can be a potential nutritional disorder factor and the limited information available in the literature (12), the present study aims to analyze the anthropometric evolution of infants with allergic proctocolitis (AP) at diagnosis and 1 to 6 months of nutritional intervention with monthly evaluation intervals.

Methods

During the period of January 2010 to December 2013 were attended consecutively and prospectively, 44 infants under nine months of age of both gender, with a confirmed diagnosis of allergic proctocolitis in Pediatric Gastroenterology Institute of São Paulo (IGASTROPED). In the first and for the role clinical followed all patients were attended by the same practitioner (UFN).

Within this context of patients, we had 21 boys and 23 girls.

Diagnostic criteria

All patients on the first inquiry presented complaining of hematochezia (bright red blood mixed with the stool) associated with other symptoms such as diarrhea, irritability, cramps and food refusal.

Laboratory examination

Were submitted all patients to the following tests: blood count, stool culture for research pathogens, retoscopia or colonoscopy and rectal biopsy.

Morphological assessment of the rectal mucosa was performed according to the standard of Diaz et al (7), namely: Alteration of the surface epithelium, abnormal glandular architecture, mucous content of glands infiltrate the lamina propria, lymphoid nodules, presence of granulomas, parasites, fungi, cytomegalovirus inclusion bodies and other viral inclusions.

The diagnosis of allergic proctocolitis was confirmed using standard of Fiocchi et al (9), namely: Presence of rectal bleeding in an infant; exclusion of infectious causes of colitis; symptoms disappear after exclusion milk and dairy products from the diet of the mother and/or child.

Anthropometric measurements

Was collected the weight and length data at the time of diagnosis and 6 months of nutritional intervention with monthly intervals for evaluation. Weight (kg) was determined by electronic scale and length measured by wooden stadiometer. For the assessment of nutritional status analysis was performed based on the z-score weight for age, height for age, weight for height and body mass index (BMI), with the aid of Anthro program version 3.2.2 (2011) (15), for children up to 5 years and classified according to the World Health Organization (WHO) (3) for each respective index.

Nutritional intervention

1) Patients in exclusive breastfeeding (EBF): the mother was submitted to exclusion diet (MED) of the six major internationally recognized allergens, namely: cow's milk and dairy products, soy, fish and seafood, egg, and wheat derivatives and dried fruits (peanuts, walnuts, almonds, cashews, cocoa and hazelnuts), throughout the intervention period.

2) Patients on artificial feeding: exclusive use of hypoallergenic formulas (HF), such as extensively hydrolysed proteins formulas (HF-EHP) or basic amino acid mixture (HF-BAA).

Statistical Analysis

In the descriptive analysis of the categorical variables were presented as absolute numbers and frequencies, while continuous variables as median and interquartile range (IQR). Inferential analyzes were conducted with as outcome variable the difference among the z-scores of the anthropometric indices between admission and after the intervention. However, since the data of these variables were not normally distributed by the Shapiro-Wilk adhesion test. 

Additionally, we tested the difference of these same variables in relation to the type of diet (AME-DEM vs. FHA) using the Mann-Whitney test, but was not found difference statistically significant, which was the basis for the analysis without this stratification.
All analyzes were conducted using Stata / IC 12.0 (Stata Corp LP, College Station, TX, USA) (14).

Ethical aspects

The study was approve by the Ethics and Research of the Federal University of São Paulo-UNIFESP / Hospital São Paulo, (n ° 749894).  In the study, copies of the Consent and Informed (IC) to their legal guardian were given for all patients included.

Results

Clinical characteristics

Table 1 shows the general characteristics of the studied group. Of the 44 patients, 23 (52%) were female.


The main clinical manifestation that led to the suspicion of allergic proctocolitis was hematochezia (present in all patients), been unique and exclusive in 13 (29.5%) infants and associated with other symptoms in 31 (70.5%) infants. The most common symptoms associated with hematochezia were severe cramping, irritability, diarrhea, regurgitation, eczematous dermatitis and hard stools.

When we look for the feeding in the admission period 32 (73%) infants were exclusively breastfeeding, 7 (16%) partially hydrolyzed formula (FPH) and 5 (11%) making use of formula milk (FL). After nutrition intervention, 39% of patients remained in EBF-MED feeding, 54% extensively hydrolyzed proteins formulas (HF-EHP), 7% use basis of amino acid mixture of formula (HF-BAA) (Table 1).

Table 2 presents analyzes comparing the nutritional status evaluated in two periods (at the time of diagnosis and after dietary intervention). When performed analysis of pre and post intervention type seeing the difference between the median, it was observed that after the intervention infants gained weight and height in a statistically significant, approaching more  to the normal reference parameters defined by WHO for healthy children (3).


It is important to say that using both forms of treatment (EBF-MED and HF)  the infants maintained satisfactory progress of the anthropometric indicators and disappearance of signs and symptoms in all patients.

Discussion

The present research demonstrated that to assess the anthropometric evolution of infants with allergic proctocolitis at both times (admission and after intervention), there were no significant differences towards gender, clinic complaining of rectal bleeding and weight loss. These observations are consistent with those described by Lozinsky and Morais (10), in a review article shows that patients often do not have weight loss or impairment of the general state or changes of palpation of the abdomen (10). These observations point out the importance of nutritional monitoring of these children, since it is know that some manifestations that affect the gastrointestinal tract may implicate in the development of nutritional status of infants (4). Aguiar et al. using similar methodology employed in the present study, evaluated 214 children diagnosed with CMPA, the mean age was 3 months and they found that 49.5% of patients with clinical manifestations presented impairment of the digestive system simultaneously with other systems, such as respiratory and the skin. In the same study, they found 34.6% of patients with allergic colitis and when analyzed the nutritional status by ZBMI was identified thinness at 12.9%, 67.8% in normal weight, overweight risk in 15.2% and overweight at 4.1% (2). In accordance to the presented by the review study, we did not find statistically significant differences in relation to nutritional status before and after nutritional intervention by analyzing the parameters only.

Pereira et al. shows similar findings in a study involving 20 infants diagnosed with allergic proctocolitis, as result of the CMPA. In this study 70% of patients were eutrophic, however, the nutritional parameters was measure using the Gomez criteria (11).

It is important to say that studies which demonstrate the effects of nutritional therapy in the development of infants has emphasized the use of hydrolyzed formulas, soy-based formulas and exclusion diets as forms of treatment (2, 16, 11). Yonamine et al. followed 168 infants with CMA to evaluating nutritional status, which were separate into two groups, namely: a received soy-based formula and other receive extensively hydrolysed formula. The authors concluded that both treatments promote good evolution of nutritional status according to the Finnish reference standards, and that the choice of formula depends on the patient's tolerance and how much its cost. The retrospective observational study of a Spanish group got the same result as the form of treatment, noting that other food allergies such as eczema and wheezing appear frequently and can be negative for nutritional status(16).

According to the Academy of Breastfeeding Medicine (1), allergic proctocolitis was one of the topics mentioned for creating the protocol for diseases that can compromise breastfeeding, suggesting not to only excluded cow's milk, but the other allergens (soy, peanut, egg, corn, wheat, strawberry) as well from the maternal diet, so that following the elimination diet the symptoms should disappear (10).

In our research compared the difference between the median of pre nutritional status parameters and post-intervention, we observed a statistically significant improvement compared to the z-score of H/A and W/A pointing the efficacies of both forms of treatment, exclusive breastfeeding with maternal exclusion diet and hypoallergenic formulas.

One limitation of this study that we can say is about sample size for more evidences and comparison. However, allergic proctocolitis is not a highly prevalent disease, and with no frequent diagnosis (17), so the sample of 44 infants with a diagnosis of allergic proctocolitis is enough for clinical analysis and obtaining high value information.

Conclusion

Finally, we can conclude that allergic proctocolitis did not induce damage of the nutritional status of infants who receive proper nutrition intervention, if the diagnosis performed early with effective forms of treatment, will provide the infant to maintain the growth channel and complete disappearance of symptoms. Furthermore, it highlights the beneficial role of breastfeeding with maternal diet exclusion in the nutritional maintenance process of infants, a practice that has proved highly effective in the treatment of allergic proctocolitis. Thus, the incentive for mothers to perform the elimination diet and continue breastfeeding should be increased, providing not only a good nutritional status, but also strengthen the "bond mother and child" in such a particular situation such as allergic proctocolitis ; in addition, the introduction of hypoallergenic formulas, may represent expensive or unaffordable for many families.

Acknowledgment

The Federal University of São Paulo and the Pediatric Gastroenterology Institute of São Paulo (IGASTROPED) by all documents necessary for research. CAPES (Higher Education Personnel Improvement Coordination) granted the scholarship.

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