A
consolidação da tradição em Pesquisa: Expandindo
as fronteiras do “Tratado de Tordesilhas” da ciência (parte 1)
1- A associação Clínica, Microbiologia e
Biologia Celular: uma feliz proposta de
trabalho que resultou em vultosa produção do conhecimento de alta qualidade
Já no ano seguinte de haver retornar de
Buenos Aires, aonde havia realizado minha especialização em 1973, estabeleci um
estreito vínculo com a Disciplina de Microbiologia chefiada pelo Prof. Luiz
Rachid Trabulsi. Prof. Trabulsi era um pesquisador de grande prestigio,
internacionalmente reconhecido como uma das maiores autoridades mundiais no
campo das enterobactérias, em especial no que dizia respeito às cepas
enteropatogênicas de Escherichia coli.
Este agente enteropatogênico conhecido sob a designação abreviada de EPEC era
um dos mais importantes agentes causadores de diarreia aguda em lactentes
provenientes de famílias de baixa renda, especialmente dentro do primeiro ano
de vida, e também em unidades neonatais devido ao alto grau de contaminação
cruzada transmitida pelas mãos dos profissionais de saúde, ao manusearem os
recém-nascidos, decorrente da higienização inadequada. As cepas de EPEC eram
altamente virulentas, causavam persistência da diarreia associada a
intolerâncias alimentares e altas taxas de mortalidade. Este era o panorama
mais frequentemente vivenciado em nossas enfermarias de Pediatria naqueles anos
e representavam um enorme desafio a ser enfrentado para o manejo exitoso desses
casos. Em virtude dos interesses comuns que ambas as áreas do conhecimento
encerravam, da minha parte a atuação como clínico e a do Prof. Trabulsi, a
Microbiologia, nos levaram à produção de um ciclo virtuoso. De fato, esta
associação foi se tornando cada vez mais intensa e resultou na criação do
“Clube da Flora”, em fevereiro de 1975. A finalidade primordial deste relacionamento
foi a de estabelecer uma colaboração recíproca entre os docentes de ambas as
Disciplinas, com o objetivo precípuo de discutir e aprofundar os conhecimentos
sobre os agentes enteropatogênicos e suas repercussões fisiopatológicas sobre o
hospedeiro. No período compreendido entre 1977 e 1994 foram publicados 17
trabalhos em revistas indexadas, fruto desta profícua associação. A
materialização desta comunhão de esforços está definitivamente selada nos
inúmeros trabalhos de investigação, publicados nos mais importantes periódicos
de pesquisa nacionais e internacionais, tais como: Jornal de Pediatria, Revista
Paulista de Pediatria, Revista Paulista de Medicina, Arquivos de
Gastroenterologia, Brazilian Journal of Medicine and Biology Research, Revista
do Instituo de Medicina Tropical de São Paulo, entre as nacionais; Malnutrition
in Chronic Infantile Diarrhea, Bacterial Diarrheal Diseases, Revista Médica do
Chile e Infection and Immunity, entre as internacionais. Além disso, há também
que se considerar as várias teses de Mestrado e Doutorado resultantes este
trabalho associativo, a saber: Tânia Viaro, Lenora Gandolfi Schimitz, Marly de
Almeida Pedra, Aristides Schier Cruz, Arelis Lleras e Eriberto Fernandez
Jaramillo, teses de Mestrado; Fernando
Fernandes, Maria Ceci do Vale Martins e Lenora Gandolfi Schimitz, teses de
Doutorado. Concomitantemente aos ganhos científicos oriundos destes novos
conhecimentos adquiridos, pudemos acima de tudo, pois era essa a meta
primordial, oferecer os melhores cuidados assistenciais aos nossos pacientes,
que ficaram comprovados pela drástica diminuição das taxas de mortalidade e
também pelo menor tempo de duração da enfermidade (Figura 1).
Figura 1- Da esquerda para a direita
Eriberto Fernandez, Prof. Trabulsi e eu em Valdivia, Chile, em 1992, durante um
Simpósio sobre Agentes Enteropatogênicos.
Infelizmente, em um dado momento ocorreu a
aposentadoria do Prof. Trabulsi, e aí pareceria que a colaboração com a
Disciplina de Microbiologia estaria sob o risco de findar. Entretanto, para
minha alegria, não foi o que ocorreu, aliás, não somente não findou como
inclusive se aprofundou, e, além disso, agregou-se mais uma colaboração de
inestimável valor, pois envolveu também o setor da Microscopia Eletrônica. Foi
a partir de 1994 que entraram nesta estória duas profissionais extremamente
competentes e profundamente comprometidas com a produção do conhecimento.
Tratam-se das Professoras Isabel Scaletsky e Edna Haapalainen, a primeira
Microbiologista, discípula do Prof. Trabulsi, e a segunda expert em Biologia Celular. A partir desta nova composição eu pude
voltar a exercer meus conhecimentos de biologia celular que estavam inativados
desde que eu havia assumido a chefia do Serviço de Pediatria do Hospital
Umberto Primo, por absoluta falta de tempo. Esta associação tornou-se ainda
mais profícua que a anterior, posto que passamos a utilizar conjuntamente os
recursos da investigação clínica, da microbiologia e da biologia celular.
Passamos a trabalhar de forma integrada em busca de desvendar as interações dos
agentes enteropatogênicos isolados dos nossos pacientes com diarreia aguda e
persistente, especialmente as diferentes cepas enteropatogênicas de Escherichia coli com seus respectivos
mecanismos fisiopatológicos de ação sobre o hospedeiro. Este empenho
associativo gerou, no período compreendido entre 1995 e 2011, 35 trabalhos de
alto valor de impacto, que resultou em publicações científicas nos mais
prestigiosos periódicos da área, nacionais e internacionais, tais como: Revista
da Associação Médica Brasileira, Arquivos de Gastroenterologia, Revista
Paulista de Pediatria, Brazilian Journal of Medical and Biological Research,
Brazilian Journal of Microbiology, entre as nacionais; Acta Paediatrica,
Infection and Immunity, Journal of the American College of Nutrition, Journal
of Clinical Microbiology, Lancet, Pediatrika,
Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition, Emerging Infectious
Diseases, The Journal of Infectious Diseases, FEMS Microbiology Letters, entre
as internacionais. Além disso, estas pesquisas também propiciaram a realização
de teses de Mestrado e Doutorado de alunas de pós-graduação, sob minha
orientação, a saber: Jacy Alves Braga, Jairo Cesar dos Reis, Cleide de Holanda
Fernandes, Célia Regina Moreira, Sandra Martini Costa, Carlos Alberto Garcia
Oliva, Jacira Omena Torres de Oliveira, teses de Mestrado; Cláudia Regina
Nunes, Jairo Cesar dos Reis, Jacy Alves Braga, Célia Regina Moreira e Carlos
Alberto Garcia Oliva, teses de Doutorado.
Ainda em colaboração com a Profa.
Scaletsky, tivemos a oportunidade de desenvolver um extenso trabalho de campo
para a pesquisa de agentes enteropatogênicos nas comunidades indígenas da etnia
Guarani que habitam ao longo de todo nosso litoral de norte a sul, desde Angra
dos Reis até a ilha do Cardoso, durante todo o ano 1996 (Figuras 2-3).
Figura 2- Profa. Isabel Scaletsky com o
material de investigação no porta malas do meu carro, no início da nossa
jornada no alto da serra de Angra dos Reis.
Figura 3- Vista do alto da serra do Mar na
região de Angra dos Reis.
As aldeias dos Guaranis localizam-se em
áreas de preservação ambiental, a maioria delas encontra-se no sopé da serra do
Mar, aonde as reservas indígenas foram edificadas, totalmente cercadas pela
imponência deste magnífico maciço da natureza, que proporciona um esplendoroso
espetáculo representado pela exuberância da flora da Mata Atlântica, e com uma
visão privilegiada da costa litorânea (Figuras 4-5-6-7-8-9).
Figura 4- Profa. Isabel ao adentrar a
reserva indígena, área de preservação ambiental.
Figura 5- Vista desde a aldeia indígena de
Angra dos Reis.
Figura 6- Um pouco da vegetação típica da
Mata Atlântica.
Figura 7- Uma casa indígena e atrás a
exuberância da Mata Atlântica.
Figura 8- Encontro com habitantes da
aldeia de Angra dos Reis na sala de aula, aonde são ensinados português e
guarani.
Vista das outras aldeias da etnia Guarani existentes ao longo do nosso litoral por nós visitadas, em Ubatuba, Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe (Figuras 9-10-11-12-13-14).
Figura 9
Figura 10
Figuras 11 (A e B)
Figura 12
Figura 13
Figura 14