segunda-feira, 30 de setembro de 2013

LACTITOL: um laxante osmótico eficaz





INTRODUÇÃO

Constipação é uma queixa clínica de alta prevalência e é um grande estorvo para a qualidade de vida dos indivíduos afetados por este transtorno, desde um ponto de vista social como também profissional. Vários estudos epidemiológicos no mundo ocidental relatam que a prevalência da constipação alcança até cerca de 20% da população geral (1). Muito embora existam inúmeras causas de patologias orgânicas que provocam constipação, na imensa maioria dos casos trata-se de um transtorno funcional. Recentemente, a American College of Gastroenterology (ACG) (2) recomendou uma maior abrangência na definição da constipação: “Trata-se de evacuação não satisfatória caracterizada por pouca frequência e de difícil eliminação de fezes. Entende-se por difícil eliminação quando ocorre esforço, dor, dificuldade, evacuação incompleta e fezes endurecidas.” A ACG também definiu o significado de constipação crônica, a qual se caracteriza pela presença destes sintomas por pelo menos 3 meses. O tratamento tradicional da constipação inclui uma maior ingestão de líquidos e de fibras alimentares que funcionam como agentes formadores de fezes de consistência pastosa. Apesar da existência de alguns ensaios controlados que confirmam a eficácia desta proposta terapêutica, essas medidas tradicionais geralmente resultam ineficientes (3). Elas fracassam no objetivo de normalizar o hábito intestinal em até 40% dos pacientes e, muitas vezes, acabam por exacerbar outros sintomas, tais como dor abdominal, distensão e/ou flatulência (4).



Neste grupo de pacientes, que não responde de forma satisfatória ao tratamento tradicional, está plenamente indicada a utilização de laxantes osmóticos, posto que estes são comprovadamente efetivos e seu uso a longo prazo não acarreta efeitos adversos indesejáveis.

LACTITOL e Lactulose são dissacarídeos sintéticos que funcionam plenamente como laxantes osmóticos. Dentre estes, o LACTITOL devido ao seu sabor mais palatável é melhor tolerado e, portanto, mais eficaz do que a Lactulose (5).

LACTITOL: PROPRIEDADES FARMACODINÂMICAS

LACTITOL (Beta-galactosideo-sorbitol) é um açúcar-álcool. Por se tratar de um dissacarídeo sintético não é digerido no tubo digestivo, posto que não há um enzima específico (dissacaridase) capaz de produzir a sua hidrolise. Desta forma, portanto, permanece intacto nas porções superiores do intestino delgado exercendo efeito osmótico, arrastando água consigo, até alcançar o intestino grosso. Nos cólons, o LACTITOL torna-se disponível para a fermentação bacteriana por meio de um processo anaeróbico o que resulta na formação de gases (CO2, H2 e CH4) e ácidos orgânicos de cadeia média, tais como lático, acético e fórmico (6). No caso dos gases não serem aproveitados pelas bactérias, estes são absorvidos para a circulação sistêmica e, então, são excretados pela respiração ou mesmo nas fezes. Os ácidos orgânicos funcionam como partículas osmoticamente ativas, provocam aumento do volume fecal e estimulam o movimento peristáltico. Por esta razão, as fezes tornam-se de consistência mais pastosa devido ao aumento do conteúdo hídrico.

ENSAIOS CLÍNICOS NA POPULAÇÃO PEDIÁTRICA

Pitzalis e cols. (7), realizaram um estudo comparativo constituído por 51 crianças, com idades que variaram de 8 meses a 16 anos, com constipação crônica funcional entre LACTITOL (Grupo A) e Lactulose (Grupo B) por um período de 30 dias. Neste período de tempo ocorreu um aumento na frequência das evacuações estatisticamente significante após o tratamento com LACTITOL ou Lactulose (p= 0,001). Entretanto, ao se comparar os pacientes entre os Grupos A e B, estes últimos apresentaram maior frequência de dor abdominal (p= 0,005) e flatulência (62% vs. 32%) (p= 0,001). Além disso, os pacientes tratados com LACTITOL referiram que este produto mostrava-se mais palatável e por esta razão houve uma melhor adesão ao tratamento, em comparação com o grupo tratado com Lactulose. Martino e cols. (8), investigaram um grupo de 39 crianças que sofriam de estase intestinal, e que foram tratadas com LACTITOL ou Lactulose, de forma randomizada durante 15 dias. Os resultados mostraram que as crianças tratadas com LACTITOL apresentaram uma comprovada eficácia terapêutica, melhor tolerabilidade e adesão ao tratamento do que aquelas tratadas com Lactulose.

CONCLUSÃO

Esses estudos demostram que o LACTITOL em virtude de apresentar maior palatabilidade, menor frequência de efeitos colaterais indesejáveis (flatulência e dor abdominal) e propiciar maior adesão ao tratamento, deve ser considerado um laxante osmótico altamente útil no tratamento da constipação crônica funcional.


Referências Bibliográficas

1)      Spinzi, Giancarlo et al. Constipation in the Elderly: Management Strategies. Drugs & Aging 1. 2009;26:469-474.

2)      Drost J e Harris L. Diagnosis and management of chronic constipation. JAAPA 2006;19:24-31.

3)      Faruqui A e Joshi C. Lactitol: a review of its use in the treatment of constipation. Int J Recent adv Pharm Res 2012;2:1-5.

4)      Francis CY e Whorwell PJ. Bran and irritable bowel syndrome: time for reappraisal. Lancet 1994;344:39-40.

5)      Thompson WG. Laxatives: clinical pharmacology and pratical use. Drugs 1980;19:49-58.

6)      Schiller LR. Review article: the terapy of constipation. Aliment Pharmacol Ther 2001;15:749-763.

7)      Pitzalis G, Deganello F et al. Lactitol in chronic idiopathic constipation in children. Pediatr Med Chir 1995;17:223-6.

8)      Martino AM, Pescue F et al. The effects of lactitol in the treatment of intestinal stasis in childhood. Minerva Pediatr 1992;44:319-23.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

ONDANSETRONA no combate aos vômitos na Diarreia Aguda: uma nova indicação de um tradicional antiemético (2)



ENSAIOS CLÍNICOS DA ONDANSETRONA NA DIARREIA AGUDA

Fedorowicz e cols. (11), em 2011, realizaram uma revisão sistemática na base de dados da Cochrane sobre os efeitos antieméticos da ONDANSETRONA na redução dos vômitos na diarreia aguda em crianças e adolescentes. Foram incluídos 7 estudos envolvendo 1.020 participantes e os autores concluíram que a ONDANSETRONA, administrada por via oral, reduziu significativamente a frequência dos vômitos, a necessidade de rehidratação intravenosa e de internação hospitalar em comparação com o grupo placebo.



O uso da ONDANSETRONA na diarreia aguda foi primeiramente relatado por Cubeddu e cols. (12), em 1997, em um estudo realizado para avaliar a eficácia deste antiemético em comparação com a metoclopramida.  Esses autores verificaram que as taxas de fracasso terapêutico foram significativamente menos frequentes com a ONDANSENTRONA (17%) do que com a metaclopramida (42%).

Yimaz e cols. (13), em 2010, realizaram um ensaio clínico randomizado, duplo cego placebo-controlado, para investigar o potencial efeito benéfico da ONDANSETRONA oral no tratamento dos vômitos na diarreia aguda. No Serviço de Urgência, durante as primeiras 8 horas de observação a proporção de pacientes que ainda apresentava vômitos foi de 21,8% no grupo ONDANSETRONA contra 66,7% no grupo placebo, cujas diferenças entre os grupos mostraram-se estatisticamente significantes.


Ao cabo de 24 horas a proporção de pacientes que ainda apresentavam vômitos foi de 10,9% no grupo ONDANSETRONA e 72,2% no grupo placebo, cujas diferenças mantiveram significância estatística. Os autores concluíram que a administração de comprimidos de desintegração oral em crianças com diarreia aguda e vômitos tiveram uma diminuição significativa de ambos, episódios de vômitos e taxas de hospitalização.



Freedman e cols. (14), em 2012, publicaram uma investigação retrospectiva em crianças internadas por diarreia aguda e vômitos no Hospital for Sick Children, Toronto, Canadá, de Julho de 2003 a Junho de 2008, com o objetivo de avaliar se o uso da ONDANSETRONA em comprimidos de dissolução oral apresentava uma correspondente diminuição na administração da rehidratação intravenosa e no tempo de internação. Durante o período de 5 anos do estudo, ocorreu uma redução significativa no uso da rehidratação intravenosa de 26% no período pré-intervenção para 14% no período pós-intervenção.



CONCLUSÃO

A análise critica dos trabalhos publicados na literatura, até o presente momento, indicam que o uso da ONDANSETRONA está associada com reduções clinicamente significativas nas taxas de vômitos, da necessidade da rehidratação intravenosa e consequente tempo de permanência nos serviços de urgência e nas taxas de internação hospitalar. A incorporação dos comprimidos de dissolução oral da ONDANSETRONA no arsenal terapêutico na diarreia aguda apresenta avanços indiscutíveis nos desfechos clínicos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1) Casteel H, Fiedorek S. Oral rehydration therapy. Pediatr Clin North Am 1990;37:294-309.

2) American Academy of Pediatrics, Provisional Committee on Quality Improvement, Subcommittee on Acute Gastroenteritis. Practice parameter: the management of acute gastroenteritis in young children. Pediatrics. 1996;97:424-436.

3) Gavin N, Merrick N et al. Efficacy of glucose-based oral rehydration therapy. Pediatrics. 1996;98:45-51.

4) Albano F, Bruzzese E et al. Antiemetics for children with gastroenteritis: off-label but still on in clinical pratice. J Pediatr Gastroenterol Nutr 2006;43:402-4.

5) Kwon KT, Rudkin SE et al. Antiemetic use in pediatric gastroenteritis: a national survey of emergency physicians, pediatricians, and pediatric emergency physicians. Clin Pediatr (Phila) 2002;41:641-52.

6) Milburn W. Toxic effects of metoclopramide (review). Pediatr Rev. 1992; 13:117.

7) Freedman SB, Sivabalasundaram V et al. The treatment of pediatric gastroenteritis: a comparative analysis of pediatric emergency physicians practice patterns. Acad Emerg Med 2011;18:38-45.

8) Currow D, Noble P et al. The clinical use of ondansetron. Med J Aust. 1995;162:145-149.

9) Nahata MC, Hui LN et al. Efficacy and safety of ondansetron in pediatric patients undergoing bone marrow transplantation. Clin Ther 1996;18:466-476.

10) Figg W, Graham C et al. Ondansetron: a novel antiemetic agent. South Med J. 1993;86:497-502.

11) Fedorowicz Z, Jagannath VA at al. Antiemetics for reducing vomiting related to acute gastroenteritis in children and adolescents. Cochrane Database Syst Rev 2011;9:CD005506.

12) Cubeddu LX, Trujillho LM et al. Antiemetic activity of ondansetron in acute gastroenteritis. Aliment Pharmacol Ther 1997;11:185-91.

13)  Yilmaz HL, Yildizdas RD el al. Clinical trial: oral ondansetron for reducing vomiting secondary to acute gastroenteritis in children – a double-blind randomized study. Alimentary Pharmacology & Therapeutics 2010;31:82-91

14) Freedman SB, Tung C et al. Times-series analysis of ondansetron use in pediatric gastroenteritis. JPGN 2012;54:381-386.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

ONDANSETRONA no combate aos vômitos na Diarreia Aguda: uma nova indicação de um tradicional antiemético (1)



INTRODUÇÃO

                           
Diarreia aguda é uma das causas mais frequentes de doenças infecciosas na infância e é responsável por altas taxas de atendimentos em Serviços de Urgência e de internações hospitalares em crianças menores de 5 anos, em todo o globo terrestre. Para confirmar a assertiva anteriormente enunciada, reconhece-se que a diarreia aguda é a causa de mais de 1,5 milhão de consultas ambulatoriais anualmente nos EUA e, responsável por 13% de todas as internações hospitalares entre as crianças menores de 5 anos (1). Trata-se de uma enfermidade potencialmente autolimitada, porém, os riscos de desidratação e de morte causados pelas perdas hidro-eletrolíticas nas fezes e nos vômitos trazem grande preocupação médica e, portanto, devem ser tratadas com o devido rigor (2) (Figura 1).



Desde a década de 1970, a recomendação terapêutica prioritária inclui a utilização de soluções de rehidratação oral (SRO) para os casos de desidratação leve e moderada. Vale ressaltar que o sucesso da implantação da terapia de rehidratação oral (TRO), de abrangência universal, foi considerado pela Organização Mundial da Saúde como o maior avanço terapêutico do século XX (3) (Figura 2).



Entretanto, para que a TRO possa ser efetivamente utilizada é necessária a interrupção dos vômitos, os quais geralmente encontram-se associados ao processo diarreico. Apesar das normas de conduta, de uma maneira geral, contraindicarem o emprego de antieméticos, estes medicamentos são frequentemente utilizados nos tratamentos de emergência da diarreia aguda pelos profissionais da saúde (4). De fato, de acordo com pesquisas realizadas com médicos norte-americanos, cerca de 61% deles tendem a prescrever antieméticos durante a operacionalização da TRO caso entendam ser necessário este procedimento. Uma pesquisa compreendendo 593 médicos, das seguintes especialidades: Pediatria Geral, Medicina de Urgência e Pediatras de Medicina de Urgência também revelou que 72% deles que já haviam prescritos antieméticos como terapêutica para os vômitos na diarreia aguda, mostravam-se propensos a usá-los para prevenir um agravamento da desidratação, porém, a preocupação mais comum desses profissionais da saúde referia-se aos potenciais efeitos colaterais dos referidos antieméticos (5). Os antieméticos são usualmente prescritos na tentativa de diminuir a frequência dos vômitos e, assim, aumentar a eficácia da TRO. Entretanto, os potenciais benefícios dos antieméticos comumente prescritos (metoclopramida e dimenidrinato) devem sempre ser levados em comparação quanto aos seus possíveis efeitos adversos, tais como, letargia, irritabilidade, reações distônicas e sintomas extrapiramidais causados pelos antagonistas da dopamina, como é o caso da metoclopramida (6). Esses efeitos colaterais podem inviabilizar o sucesso da TRO e acarretar a necessidade da terapia de rehidratação intravenosa, o que aumenta os riscos para o paciente, prolonga o tempo de internação e eleva significativamente os custos do tratamento. Por outro lado, a disponibilidade de um antiemético com boa tolerabilidade, de uso pela via oral e desprovido de efeitos colaterais indesejáveis, pode ser um fator primordial para auxiliar no êxito da TRO. Elimina-se assim a necessidade da utilização da via intravenosa e consequentemente evita-se a internação hospitalar devido à desidratação. Neste sentido, a Academia Americana de Medicina de Urgência em Pediatria indicou a ONDANSETRONA como o antiemético de escolha para o tratamento dos vômitos durante um episódio de diarreia aguda (7) (Figura 3).






ONDANSETRONA

A emese é um processo complexo envolvendo várias regiões anatômicas, receptores e neurotransmissores. A estimulação destas regiões do vômito é mediada por neurotransmissores, tais como, serotonina, dopamina, opiáceos, colina e histamina, e o bloqueio desses receptores presume-se ser o mecanismo de ação dos antieméticos. Receptores da serotonina (subtipo 5-HT3) são encontrados em altas concentrações, tanto no sistema nervoso periférico como no central, especialmente na zona deflagradora do quimiorreceptor (ZDQ). Mais de 80% da serotonina 5-HT3 do organismo está contida nas células enterocromafins da mucosa gastrointestinal na área dos nervos vagais aferentes (8). Os vômitos na diarreia aguda surgem provavelmente como resultado de uma lesão da mucosa intestinal causada por um agente enteropatogênico, viral ou bacteriano, que deflagra a liberação de serotonina das células enterocromafins, as quais irão agir através de receptores sobre os nervos vagais aferentes. Estes nervos estimulam o centro do vômito e a ZDQ induzindo o surgimento dos vômitos. A ONDANSETRONA é um antagonista dos receptores da serotonina 5-HT3, desprovida de atividade antagonista da dopamina e, portanto, não causa sintomas extrapiramidais (9) (Figura 4).



Desde o seu lançamento para uso clínico em 1991, tem sido largamente recomendada para o tratamento e a prevenção de náuseas e vômitos (10). A posologia do uso da ONDANSETRONA deve ser de 0,2mg/kg de peso a cada 8 horas por meio de comprimidos de dissolução oral.