Tratamento
O tratamento da Colite Alérgica baseia-se estritamente
na eliminação do alergeno da dieta do paciente. Enquanto o paciente estiver
recebendo uma dieta baseada em apenas um determinado alimento, como geralmente
ocorre com os lactentes menores de 6 meses, seja fórmula láctea ou fórmula de
soja, torna-se facilmente identificável qual a proteína que deve ser retirada
da dieta. Entretanto, quando a dieta do paciente passa a ser mais variada já
tendo ocorrido a introdução de outros alimentos, a identificação do alergeno
pode ser uma tarefa extremamente difícil de ser exercida com sucesso. Portanto,
quanto mais diversificada for a dieta de um paciente que se suspeita ser
portador de AA mais trabalhoso será
identificar um ou mais agentes alergênicos. Por esta razão, estrategicamente,
deve-se sempre restringir ao máximo o número e a variedade dos alimentos
empregados na dieta do paciente, porém, é imperioso que se tome todo o cuidado
para não provocar alguma deficiência nutricional.
Nesta circunstância o
paciente deve receber única e exclusivamente uma dieta hipoalergênica, ou seja,
uma fórmula à base de hidrolisado protéico extensivamente hidrolisado durante
um período não inferior a 12 semanas, podendo inclusive prolongar-se até o
final do primeiro ano de vida dependendo do critério do médico assistente. É
esperado que as manifestações clínicas desapareçam dentro das próximas 48 horas
depois da introdução da fórmula hipoalergênica. Caso os sintomas persistam ou
reapareçam dentro de alguns dias após a introdução da fórmula hipoalergênica,
deve-se suspeitar de intolerância à fórmula à base de hidrolisado protéico.
Apesar das proteínas serem extensivamente hidrolisadas nas fórmulas à base de hidrolisado
protéico disponíveis no mercado, ainda assim apresentam em sua composição
pequenas frações peptídicas que podem desenvolver estímulo antigênico. Tem sido
nossa experiência pessoal, aliada à experiência internacional, que cerca de 10 a 15% dos pacientes podem
desenvolver intolerância às fórmulas à base de hidrolisado protéico. Ao se
suspeitar ou mesmo se caracterizar a ocorrência de intolerância à fórmula à
base de hidrolisado protéico, deve-se substituí-la para uma fórmula à base de
mistura de amino-ácidos, a qual não tem qualquer estímulo antigênico, visto que
este tipo de fórmula é desprovida de frações peptídicas potencialmente
alergênicas (23).
Após o sexto mês de vida
devem ser introduzidos novos alimentos, porém, sempre com a devida precaução de
evitar a utilização de leite de vaca e derivados, bem como produtos contendo
soja. A introdução desses novos alimentos deve ser feita de forma gradual para
que se possa ter uma observação criteriosa da sua tolerabilidade por parte do
paciente.
Como esta enfermidade tem
caráter transitório, no final do primeiro ano de vida pode-se realizar um teste
de desencadeamento com fórmula láctea. O desencadeamento deve ser realizado sob
supervisão médica, posto que, embora muito raramente, pode ocorrer choque
anafilático caso o paciente ainda seja alérgico ao leite de vaca.
Lactente em Aleitamento Natural
Como já foi referido
anteriormente o leite humano pode ser veículo de transporte de proteínas
estranhas, potencialmente alergênicas, e desta forma, indiretamente, provocar
manifestações de Colite Alérgica.
Entretanto, é de fundamental importância que NÃO seja suspenso o Aleitamento
Materno, e SIM tratar de eliminar da dieta da mãe o suposto alergeno.
Inicialmente deve-se eliminar o leite de vaca e seus derivados, bem como a soja
e todos os produtos industrializados que contenham estas substâncias na dieta.
Após a eliminação destes alimentos a sintomatologia deve regredir
significativamente, ou mesmo desaparecer dentro das próximas 48 horas. Caso a
sintomatologia persista deve-se pensar que outros alimentos, além dos
anteriormente referidos, também podem estar envolvidos como causa da alergia.
Nem sempre é fácil detectar qual ou quais outros alimentos podem estar
perpetuando as manifestações clínicas, porém, deve-se buscar à exaustação o
possível alergeno por meio da elaboração de diários da alimentação da mãe, na
tentativa de se estabelecer uma relação causa-efeito. Aproveito este tema para
fazer a descrição da minha experiência pessoal com outro alergeno além do leite
de vaca e da soja, através do relato de um caso.
Relato de um caso da experiência pessoal
Tratava-se de um
recém-nascido de 15 dias de vida em aleitamento natural exclusivo que atendi
com queixa de diarréia sanguinolenta. Era o segundo filho de uma mãe
extremamente cuidadosa que já havia amamentado com sucesso seu primeiro filho
durante 6 meses sem quaisquer intercorrências. Afora a queixa de várias
evacuações sanguinolentas durante 2 dias o paciente apresentava-se em excelente
estado geral, ativo, sem qualquer sinal clínico de toxemia que pudesse sugerir
infecção intestinal. A primeira suspeita foi de Colite Alérgica, comprovada por biópsia retal, e a infecção
colônica foi afastada por cultura de fezes que resultou negativa para
crescimento de microorganismos enteropatogênicos. Como o recém-nascido não
havia tido contato prévio com leite de vaca considerei que tivesse havido
sensibilização intra-útero e recomendei que a mãe eliminasse da sua dieta leite
de vaca e derivados, bem como soja e produtos contendo soja. A recuperação
clínica deu-se em 48 horas após o início da dieta da mãe, e houve total
regressão dos sintomas. Entretanto, após 15 dias do início da dieta de
eliminação que a mãe estava sendo submetida, o lactente retornou para consulta,
e naquela ocasião a mãe referiu que a diarréia sanguinolenta havia recaído 2
dias atrás. A mãe assegurava que estava cumprindo a dieta à risca, sem qualquer
transgressão, nem mesmo inadvertidamente. Como se tratava de uma pessoa com a
qual eu já vinha tendo um longo contato e era sabedor do seu zelo para com os
filhos, dei crédito absoluto à sua informação, principalmente depois de haver
insistido exaustivamente na possibilidade de detectar alguma transgressão
alimentar, a qual sempre foi negada. Naquele momento, ao acreditar na
informação da mãe passei a enfrentar um dilema científico, posto que então,
obrigatoriamente, outro alimento estaria envolvido na gênese dos sintomas.
Seguindo um velho aforismo da Pediatria, de que não se deve levantar da cadeira
para examinar o paciente sem que se tenha uma boa presunção diagnóstica,
continuei a interrogar a mãe sobre seus hábitos alimentares de forma ainda mais
detalhada, em especial perguntando-lhe que possíveis alimentos não
rotineiramente utilizados ela poderia ter ingerido. Depois de um longo
interrogatório ela se lembrou que na noite anterior ao segundo sangramento intestinal
do filho ela teve um enorme desejo de comer bala de côco, e fez o marido sair
de casa para comprar a guloseima. Assim que o marido chegou em casa trazendo um
pacote de bala de côco ela ingeriu todas as balas rapidamente. Mais ainda,
contou-me que o mesmo fato havia ocorrido na noite anterior ao primeiro
episódio do sangramento intestinal. Avançamos na quase descoberta da possível
causa da alergia, porém, algo permanecia obscuro, como explicar o primeiro
episódio, posto que alergia se manifesta após uma sensibilização prévia, salvo
existir algum tipo de sensibilização cruzada. Por este motivo, não me dei por
satisfeito e continuei o interrogatório, agora retrocedendo à gravidez, e aí o
mistério se elucidou. Uma noite, já nas últimas semanas de gestação a mãe
sentiu um enorme desejo de comer bala de côco, e pediu ao marido que fosse
comprar a guloseima, a qual ela novamente ingeriu todo um pacote em poucas
horas. Agora sim tudo tinha uma explicação perfeitamente científica: durante a
gestação o feto foi sensibilizado intra-útero, portanto, já havia tido o
primeiro contato com o alergeno, na segunda vez teve o processo alérgico
desencadeado e na terceira vez foi um verdadeiro teste de provocação positivo
para Colite Alérgica à bala de côco.
Vale a pena referir que a
mãe continuou amamentando seu filho, tendo eliminado mais um alimento da dieta,
de forma exclusiva até o sexto mês de vida sem qualquer outra intercorrência.
Como se pode depreender desta experiência é necessário investigar todos os
detalhes da dieta da mãe para termos sucesso na conduta alimentar, e persistir
na recomendação da prática do aleitamento natural exclusivo por tempo
prolongado. Outras experiências com outros alergenos alimentares também já
foram por mim vivenciadas, mas me detenho neste exemplo por ser ele o mais
significativo.
Referência Bibliográfica
Referência Bibliográfica
23. Sichere, S. H. e cols., J Pediatr 2001; 138:
688-93.
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