segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O Feliz Renascimento do Aleitamento Materno: além do fator nutricional e da proteção constitui-se também numa real declaração de amor (5)

Resultados

Características sócio-econômicas-educacionais dos pais
Do grupo inicial das 70 gestantes elegíveis para o estudo foi possível realizar o acompanhamento até o final do primeiro ano dos seus filhos em 48 delas. As idades das mães variaram de 17 a 35 anos, com média de 29,9+/-5,7 anos, e com relação aos pais as idades variaram de 19 a 54 anos, média de 29,5+/-6,5 anos.

Quanto à paridade, 11 (22,9%) eram primíparas, 9 (18,8%) secundíparas e 28 (58,3%) apresentavam 3 ou 4 paridades. Com relação ao tipo de parto, 28 (58,3%) tiveram parto vaginal e 20 (41,7%) sofreram parto cesariana.

Com relação ao grau de instrução das mães, 4 (8,3%) eram analfabetas, 44 ((1,7%) haviam recebido educação formal durante período de tempo variável (não superior ao ensino fundamental) e 14 (29,2%) exerciam atividade profissional extra-domiciliar. Quanto aos pais, 2 (4,2%) eram analfabetos, e 46 (95,8%) haviam recebido algum grau de educação formal (apenas 4 deles haviam completado o ensino médio); todos eles exerciam algum tipo de atividade profissional.

Características clínicas dos filhos ao nascimento e tipo de alimentação recebida
Das 48 crianças acompanhadas durante o primeiro ano de vida, 22 (45,8%) eram do sexo feminino, e a média do peso ao nascimento foi de 3.145+/-352 gramas, variando de 2.580 a 4020 gramas.

O crescimento pondero-estatural das crianças que receberam aleitamento natural exclusivo até o sexto mês de vida mostrou-se perfeitamente superponível (percentil 50) a aquele determinado pelo estudo de Murahovischi e cols., em São Paulo, com crianças de nível sócio-econômico elevado recebendo aleitamento natural exclusivo (Jornal de Pediatria 63: 1-23, 1987) (Gráficos 1- 2- 3 & 4).


Gráfico 1- Crescimento em comprimento dos meninos (percentil 50)


Gráfico 2- Crescimento em comprimento das meninas (percentil 50).

Gráfico 3- Ganho ponderal dos meninos (percentil 50).

Gráfico 4- Ganho ponderal das meninas (percentil 50).

Com relação ao tipo de aleitamento 32 receberam aleitamento natural a partir do nascimento e 16 receberam aleitamento artificial (Figuras 1 & 2).


Figura 1- Reunião rotineira das mães e seus filhos com nossa equipe de trabalho.


Figura 2- Dra. Fátima Lindoso coordenando uma das reuniões rotineiras com as mães e seus filhos.

O ganho ponderal dos lactentes que receberam aleitamento exclusivo por tempo prolongado foi significativamente maior nos períodos referentes aos 4, 5, 6 e 7 meses de idade, tanto para o sexo masculino quanto para o sexo feminino, quando comparado com o ganho ponderal dos lactentes em aleitamento artificial nos mesmos intervalos de idade. Após o sétimo mês de vida, porém, apesar do ganho de peso dos lactentes amamentados exclusivamente ao seio ter sido em valor absoluto superior aos dos seus pares em aleitamento artificial a diferença não se mostrou estatisticamente significativa (Gráficos 5 & 6).


Gráfico 5- Análise comparativa das curvas de ganho ponderal entre as diferentes formas de amamentação, natural x artificial.

Gráfico 6- Análise comparativa das curvas de ganho ponderal entre as diferentes formas de amamentação, natural x artificial (meninos).

O crescimento em estatura dos lactentes em quaisquer dos dois regimes de alimentação não mostrou diferenças estatisticamente significantes ao longo dos 12 meses de acompanhamento (Gráficos 7 & 8).


Gráfico 7- Análise comparativa das curvas de crescimento em comprimento entre as diferentes formas de amamentação, natural x artificial (meninos).


Gráfico 8- Análise comparativa das curvas de crescimento em comprimento entre as diferentes formas de amamentação, natural x artificial (meninas).

Freqüência dos processos mórbidos e suas relações com o tipo de aleitamento
Os processos mórbidos ocorridos com os lactentes foram registrados ao longo do primeiro ano de vida e agrupados de acordo com o tipo de patologia apresentada, a saber:

A) Patologias do trato respiratório: resfriado comum, otite média aguda, bronquiolite, bronquite e broncopneumonia.
B) Patologias do trato gastrointestinal: diarréia aguda e diarréia persistente.

A freqüência dos episódios de resfriado comum, bronquite e diarréia aguda foi significativamente maior nas crianças que receberam aleitamento artificial em comparação com aquelas que receberam aleitamento natural (Gráficos 9- 10 & 11).
Gráfico 9- Frequência de episódios de resfriado comum entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.

Gráfico 10- Frequência dos episódios de diarréia aguda entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.

Gráfico 11- Frequência dos episódios de bronquite entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.

Por outro lado, a freqüência dos episódios de otite média, broncopneumonia e diarréia persistente ainda que tenha sido maior no grupo que recebeu aleitamento artificial não revelou significância estatística em relação aos lactentes que receberam aleitamento natural (Gráficos 12- 13 & 14).
Gráfico 12- Frequência dos episódios de diarréia persistente entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.

Gráfico 13- Frequência dos episódios de otite média entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.


Gráfico 14- Frequência dos episódios de broncopneumonia entre os grupos de acordo com o tipo de aleitamento.

Este programa de incentivo ao aleitamento natural exclusivo por tempo prolongado evidenciou claramente, assim como outros programas implantados em outras comunidades de baixo nível sócio-econômico e desprovidas dos benefícios do saneamento básico, no Brasil e em outros países, ser um fator de contribuição para a redução das taxas de morbidade nos lactentes, devido à inquestionável proteção conferida pelo leite materno contra as infecções mais prevalentes que costumam ocorrer em situações de altas taxas de contaminação ambiental, como é nitidamente o caso da favela Cidade Leonor.

Conclusões

A implantação de um programa de incentivo ao aleitamento natural exclusivo em uma comunidade de favelados mostrou-se perfeitamente viável, desde que realizado com o devido planejamento, o forte engajamento de todo o pessoal pertencente à equipe de trabalho, bem como contar com condições adequadas de infra-estrutura para a execução do projeto. Deve-se sempre iniciar o processo de educação para a prática do aleitamento natural com grande antecedência ao nascimento da criança (idealmente deveria fazer parte rotineira do currículo escolar ainda durante a adolescência para ambos os sexos), posto que a futura mãe, e de preferência também o futuro pai, necessita estar firmemente convencida da importância de tal prática, e, ao mesmo tempo, estar suficientemente segura e confiante de que será capaz de alcançar seu objetivo. Eliminar possíveis mitos e tabus freqüentemente existentes na população em geral é a tarefa inicial prioritária para que posteriormente se torne possível proporcionar as informações corretas sobre os benefícios do aleitamento natural, e, assim ter a garantia de que as mesmas serão devidamente assimiladas, sempre deixando um amplo espaço aberto para discussões e esclarecimentos que se façam necessários.

É importante ter-se em mente que a prática do aleitamento natural não corrige as deficiências de um meio ambiente contaminado devido a inexistência de saneamento básico, funciona, porém, durante sua vigência, como um fator de proteção contra as agressões tão comuns presentes nestas comunidades socialmente desfavorecidas. Portanto, o uso do leite humano evita que as condições ambientais adversas já se façam sentir em um período extremamente precoce da vida, quando o ser humano apresenta maior vulnerabilidade às agressões infecciosas do meio ambiente. Entretanto, é necessário enfatizar que o leite materno protege a criança apenas durante o período em que está sendo ofertado e, que, portanto, não deixa memória imunológica duradoura.
A solução dos graves transtornos causados pela contaminação ambiental foge totalmente do escopo dos profissionais de saúde que provêm assistência direta à população. Trata-se, na verdade, de um problema de saúde pública que somente pode ser solucionado com uma firme vontade política de se implantar uma rede de saneamento básico adequada de extensão abrangente a toda população, bem como proporcionar condições dignas de moradia e trabalho para toda a sociedade.

Para uma leitura mais profunda sobre o tema recomendo a leitura do livro “Enteropatia Ambiental: uma conseqüência do fracasso das políticas sociais e de saúde pública” de minha autoria e publicado pela editora Revinter.

No nosso próximo encontro mostrarei um interessante estudo desenvolvido no Brasil a respeito de particularidades do aleitamento natural publicado em importante revista internacional de difusão universal.

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