Prof. Dr. Ulysses Fagundes Neto
A
renomada revista Gastroenterology publicou um artigo de revisão, em
março de 2025, intitulado “Intestinal Permeability in Disorders of Gut–Brain
Interaction: From Bench to Bedside”, de
Madhusudan Grover e cols., que abaixo passo a resumir em seus principais
aspectos.
Tratamentos
disponíveis com o objetivo de fortalecer a barreira de permeabilidade intestinal
nos transtornos da interação cérebro-trato digestivo (TI TDC)
Há uma
série de medidas terapêuticas, tais como: dietas, farmacológicas, e
comportamental que se admite exercerem efeitos benéficos sobre os sintomas dos
pacientes portadores de TI TDC, por meio do fortalecimento da permeabilidade
intestinal e da função da barreira mucosa. (Tabela 1 – Figura 3).
DIETA:
Uma
grande proporção de pacientes portadores de TI TDC, incluindo, a Síndrome do
Intestino Irritável (SII), dispepsia funcional (DF) e constipação, tratam seus
sintomas relacionados aos alimentos por meio de modificações da dieta. O
tratamento dietético, como por exemplo, utilizando dietas ricas em fibra, baixos
teores de gordura e baixas concentrações em FODMAPs, podem trazer alívio dos
sintomas por meio de múltiplos mecanismos inclusive por uma melhoria da função
da barreira mucosa.
FIBRA:
Seres
humanos produzem apenas um limitado número de enzimas para digerir
principalmente amido, porém, a microbiota intestinal produz milhares de
diversas enzimas que podem despolimerizar e fermentar os polissacarídeos da
dieta transformando-os em ácidos graxos de cadeia curta, os quais os seres
humanos podem absorver e utilizar porque eles fornecem energia para as células
epiteliais, regulam a produção de muco, melhoram a função da barreira
intestinal e reduzem a inflamação intestinal. Fibra solúvel, tal como, Psyllium,
demonstrou-se ser eficaz na SII e na constipação idiopática. A fibra solúvel
aumenta o conteúdo de água nas fezes pela fermentação da massa bacteriana e
reduz o tempo de trânsito. A fibra solúvel exerce seu efeito positivo nos
pacientes portadores TI TDC fortalecendo a integridade da camada de muco pelo aumento
da produção dos ácidos graxos de cadeia curta em consequência da fermentação da
fibra pela microbiota intestinal. Os ácidos graxos de cadeia curta fortalecem o
metabolismo celular e regulam a função neuro imune, a qual produz efeitos
protetivos para a barreira intestinal e aumentam a permeabilidade paracelular.
GORDURA
ALIMENTAR:
O aumento
da ingestão de gordura tem sido associado com o aumento dos sintomas na SII.
Uma dieta de longo prazo com alto teor de gordura, contendo ambas as gorduras,
saturadas e insaturadas, correspondendo a pelo menos a 35% das calorias, pode
prejudicar a integridade da barreira intestinal por vários mecanismos. O
consumo em excesso de gordura na dieta provoca uma alteração na expressão das
proteínas das junções firmes dos enterócitos. Uma dieta elevada em gordura
aumenta a síntese de sal biliar e reduz sua reabsorção, o que pode aumentar a
permeabilidade intestinal por meio do aumento do estresse oxidativo da célula epitelial,
apoptose e inflamação com alteração da estrutura da microbiota intestinal. Além
disso, uma dieta rica em gordura induz o desequilíbrio entre as citocinas pro- inflamatórias
e anti-inflamatórias, a qual aumenta as taxas das citocinas que destroem a
barreira intestinal, diminui os níveis das citocinas formadoras da barreira
intestinal e provocam inflamação.
FODMAPs:
Uma
série de estudos têm demostrado alta eficácia de uma dieta com baixo teor de
FODMAPs na SII e na DF. Os FODMAPs são constituídos por carboidratos de cadeia
curta, pouco digerível e pouco absorvível, que podem desencadear sintomas em
pacientes com TI TDC. Admite-se que o aumento dos sintomas digestivos
provocados pelos FODMAPs ocorre devido ao aumento do conteúdo de água, gás
colônico e distensão colônica provocados pela fermentação bacteriana. Estes
fenômenos desencadeiam respostas alteradas na região do cérebro envolvida com
os estímulos viscero-sensoriais.
GLUTAMINA:
A
glutamina é um aminoácido essencial que possui um importante efeito sobre a
sinalização celular, detoxificação da amônia e homeostase básica. Uma série de
estudos demonstraram que deficiência de glutamina pode acarretar aumento da
permeabilidade da membrana e sua suplementação pode restaurar a permeabilidade
intestinal após uma lesão intestinal, como pode ocorrer na SII-D pós
gastroenterite.
FÁRMACOS
Antagonistas
dos receptores de histamina 1 (H-1)
O aumento
do número de mastócitos e sua ativação tem sido estudados em pacientes com SII
e DF. Este achado acarreta aumento da permeabilidade colônica e agrava os
sintomas da diarreia. Os mastócitos também contribuem para o aumento da
sensibilidade visceral periférica e da dor abdominal pela liberação de
histamina. Terapêuticas tendo como alvo a redução da ativação dos mastócitos têm
demonstrado a capacidade de diminuir os sintomas do TI TDC. Cetotifeno é um fármaco
estabilizador dos mastócitos com propriedades antagonistas a H-1, que inibe a
degranulação dos mastócitos e a liberação da triptase, histamina e citocina.
LUBIPROSTONE
É um
derivativo da prostaglandina E1 que ativa os canais de cloro tipo 2 dando como
resultado o aumento da passagem de água e cloro para o lúmen intestinal. LUBIPROSTONE,
portanto, é uma droga eficaz para o tratamento da SII-C e da constipação
idiopática crônica.
TENAPANOR
Essa
droga tem sido demonstrada capaz de reduzir a dor abdominal e a constipação em
pacientes portadores da SII-C. Além disso, previne a resposta de
hipersensibilidade visceral, normaliza a excitabilidade neuronal sensorial colônica,
e reduz a excitabilidade dos neurônios sensoriais do gânglio da raiz dorsal
colônica.
Conclusões
As evidências das
acumulações fisiopatológicas sugerem que a permeabilidade intestinal contribui
para os sintomas dos TI CTD, tais como a SII e a DF. Entretanto, os resultados
dos testes de permeabilidade devem ser interpretados com precaução porque
diferentes aspectos da função da barreira intestinal são acessados, porém não a
totalidade deles – especialmente os biomarcadores não invasivos – estão
apropriadamente validados. Atualmente, nenhum teste disponível desempenha um
papel relevante na prática clínica. Para se designar um teste de permeabilidade
intestinal como um biomarcador clínico, um número maior de estudos é necessário
para desenvolver valores normativos. Além disso, estudos da fisiopatologia em
seres humanos são necessários para determinar de que maneira as alterações na
barreira contribuem para outros mecanismos, tais como: alterações na
sensibilidade visceral, função motora, respostas imunes e a sinalização trato
digestivo-cérebro. Uma série de atitudes, tais como, dietéticas, farmacológicas
e comportamentais podem trazer efeitos benéficos sobre os sintomas da TI CTD,
pelo menos em parte fortalecendo a permeabilidade intestinal e a função de
barreira da mucosa. Portanto, a inclusão de investigações sobre a função da
barreira intestinal em novos estudos no tratamento da TI CTD, trarão melhores
compreensões do papel da função da barreira intestinal. Além disso, novas
drogas com efeito mais direto sobre a barreira intestinal poderão propiciar
novas esperanças para os pacientes portadores de TI CTD e outras patologias
relacionais com a barreira intestinal.
Referências
Bibliográficas
1- Mars RAT e cols. - Cell 2020;182:1460-1473
2- Zuo L. e cols.- Cell Mol Gastroenterol Hepatol 2020;10:327-3430
3- Vanuytsel T. e cols. – Front Nutr 2021;8:71-79
4- Edwinson AL. e cols. – Nat Microbiol 2022;7:680-694
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