Prof.
Dr. Ulysses Fagundes Neto
A renomada revista JPGN
publicou o artigo intitulado “Characterization
of Eosinophilic Esophagitis in Infants and Toddlers”,
de Suzanna
Hirsch e cols, em julho de 2023, que
abaixo passo a resumir em seus principais aspectos.
INTRODUÇÃO
A
Esofagite Eosinofílica (EEo) trata-se de uma enfermidade crônica imune-mediada
caracterizada por eosinofilia esofágica e sintomas de disfunção esofágica. As
manifestações clínicas da EEo são bastante variadas e são diferentes entre as crianças
maiores e os adultos. As clássicas apresentações da EEo nos adultos e nas
crianças maiores incluem disfagia ou impactação alimentar, enquanto nas
crianças de menor idade podem se apresentar com dor abdominal, vômitos ou
dificuldades na alimentação. Além disso, os pacientes menores podem apresentar
sintomas extra intestinais, tais como: tosse, sibilos, ou ronquidão, embora a
relação causal entre EEo e doença respiratória permaneça incerta. Há uma
crescente produção de pesquisas relacionadas à EEo nas crianças, entretanto os
estudos existentes incluem poucos lactentes e pré-escolares com idades menores
de 2 anos, e poucos estudos têm investigado especificamente as manifestações clínicas
e o tratamento da EEo neste grupo pediátrico.
Os
objetivos do presente estudo foram os seguintes, a saber:
1)
Caracterizar as apresentações
gastrointestinais e respiratórias da EEo nas crianças menores de 2 anos de
idade e,
2)
Avaliar a resposta clínica e histológica no
tratamento dessas crianças.
MÉTODOS
Foi
realizada uma análise retrospectiva nas crianças menores de 2 anos de idade
diagnosticadas como portadoras de EEo. A EEo foi definida pela presença de ≥ 15
eosinófilos por campo de grande aumento em pelo menos 1 biópsia esofágica. Os
dados dos pacientes foram revisados levando-se em consideração os seguintes
dados: idade, sexo, sintomas presentes, comorbidades, emprego passado e
presente de supressão ácida, histórico dietético e restrições, e estudo vídeo
fluoroscópico para a deglutição e avaliação de aspiração. Os achados
endoscópicos mais salientes tais como: edema, exsudatos, sulcos, anéis, estenose
e erosões ou úlceras foram pesquisados. Os achados histológicos foram
analisados incluindo a contagem de eosinófilos em todos os níveis esofágicos.
DESFECHOS
Os
arquivos dos pacientes foram revisados levando-se em consideração as
endoscopias de seguimento, os resultados foram anotados e os pacientes foram
classificados como segue:
1)
Remição da EEo, contagem de eosinófilos
<15 ou
2)
Persistência da EEo, pico >15.
Os
tratamentos da EEo em cada momento das endoscopias foram anotados e estes
incluíam o uso de inibidor de bomba de próton (IBP), esteroides ingeridos e
restrições dietéticas. A maioria dos pacientes recebeu uma combinação de
tratamentos.
Considerando-se
os tratamentos recebidos, no momento de cada endoscopia, os pacientes foram
considerados como Respondedores ou Não Respondedores a cada
combinação dos tratamentos. Respondedores (definido como pico de
eosinófilos <15) foram os pacientes que alcançaram remição histológica e Não
Respondedores (definido como pico de eosinófilos >15) foram os pacientes
que mantiveram mais de 15 eosinófilos por campo de grande aumento.
RESULTADOS
Características
dos pacientes
Foram
identificadas 42 crianças menores de 2 anos de idade no momento do diagnóstico
da EEo, cujas características clínicas estão demonstradas na Tabela 1.
Tabela 1- Características demográficas dos
pacientes ao ingressar no estudo
A
idade média dos pacientes foi de 1,3±0,4 anos, e o mais jovem tinha 5 meses. O
sintoma mais frequentemente apresentado foi dificuldade na alimentação (67%), a
qual foi caracterizada por engasgo ou tosse durante a alimentação (60%) ou
dificuldade na progressão dos alimentos sólidos (43%). Nenhum paciente
apresentou relato de impactação alimentar.
Índice
Endoscópico
O
índice endoscópico mostrou-se anormal em 30 pacientes (71%) e normal em 12
pacientes (29%). As anormalidades incluíram edema da mucosa (20/42 – 48%),
sulcos (20/42 – 48%), exsudatos (17/42 – 41%) e erosões (1/42 – 1%). Não foram
identificados anéis ou estenoses. Do ponto de vista histológico o pico médio de
eosinófilos foi de 50pcga com a variação de 30 a 100pcga (Figura 1).
Figura 1- Alterações nas contagens dos eosinófilos no momento inicial e na primeira biópsia de seguimento.
Resposta
Sintomática
Todos
os pacientes apresentaram melhoria clínica em pelo menos 1 sintoma no primeiro
seguimento. Houve uma significante redução de todos os sintomas durante o
seguimento em comparação com os dados iniciais (Figura 2).
Figura 2- Porcentagem de pacientes com sintomas pré e pós-tratamento.
Seguimento
longitudinal
O
número de respondedores e não respondedores para cada tratamento ou combinação
de tratamentos e endoscopias de seguimento estão demonstrados na Figura 3.
Figura
3- Proporção de pacientes que alcançou remissão histológica após o tratamento.
Houve
um significativo efeito positivo no tipo de tratamento em relação à resposta
histológica e as melhores respostas observadas foram as combinações
dieta/esteroides ou dieta/inibidor de bomba de próton e a pior resposta
observada foi o uso isolado com inibidor de bomba de próton.
CONCLUSÕES
Em
resumo, este estudo demonstra que lactentes e pré-escolares portadores de EEo
são mais frequentemente do sexo masculino, com forte história pessoal e
familiar de atopia, e frequentemente apresentam dificuldades alimentares,
vômitos ou sintomas respiratórios. EEo neste grupo etário pode mimetizar outros
diagnósticos gastrointestinais frequentes, tais como refluxo, alergia à
proteína do leite ou aspiração. Enquanto a maioria dos pacientes demonstrou
melhoria clínica com os tratamentos padrões, utilizando-se uma combinação de
dieta/esteroide ou dieta/IBP, sendo estes os mais efetivos, a lesão endoscópica
é considerável e as respostas histológicas não podem ser mantidas a longo
prazo. Futuras pesquisas prospectivas serão de grande utilidade para avaliar os
desfechos terapêuticos e o curso da enfermidade neste grupo etário de crianças mais
jovens.
MEUS
COMENTÁRIOS
Este
é um dos primeiros estudos que definem os aspectos clínicos e endoscópicos da
EEo em lactentes e pré-escolares, e, ao mesmo tempo, avalia a resposta ao
tratamento neste grupo etário de pacientes. Considerando que os sintomas são
inespecíficos neste grupo etário, é importante compreender suas mais frequentes
manifestações clínicas, e manter um alto índice de suspeição para a EEo quando
estes sintomas estão presentes. Diferentemente dos pacientes maiores, nos quais
as apresentações clássicas incluem disfagia e impactação dos alimentos, os mais
frequentes sintomas nestes pacientes mais jovens são dificuldades na
alimentação, vômitos, tosse e sibilos. Vale ressaltar que estes pacientes
geralmente não têm agravo do seu estado nutricional, na grande maioria dos
casos.
Outro
aspecto que chamou a atenção neste estudo é que a avaliação endoscópica se
revelou aparentemente normal em 29% dos pacientes, o que salienta a necessidade
de incluir na rotina a análise histológica.
Os
tratamentos dietéticos costumam variar intensamente, tanto quanto as alterações
das fórmulas e quanto as restrições de alimentos sólidos. No presente estudo 40%
dos pacientes foram tratados apenas com restrição dietética, enquanto 71% deles
que foi tratado com uma combinação de restrição dietética e IBP ou esteroides
apresentou remissão histológica.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
1) Suzanna Hirsch e cols. JPGN 2023; 77:86-92.
2) Lyles JL e cols. J Allergy Clin Immunol 2021;147:244-54.
3) KeLes MN e cols. Dysphagia 2023;38:474-82.
4) Witmer CP e cols. JPGN 2018;67:610-5.
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