quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Hiperplasia Nodular Linfóide (Parte I)

Tatiana Furlan Berreta Fornaro & Ulysses Fagundes Neto

Introdução

A Hiperplasia Nodular Linfoide (HNL) do íleo terminal e colo tem sido reconhecida, desde longa data, como uma resposta da mucosa a estímulos inespecíficos, na maioria das vezes infecciosos e, consequentemente, tem sido descrita como um fenômeno fisiopatológico durante a infância. No entanto, mais recentemente, a HNL também tem sido descrita associada a alergia à proteína do leite de vaca (APLV) e à imunodeficiência.

O tecido linfoide distribui-se na lâmina própria da mucosa intestinal, ao longo de todo o tubo digestivo, apresentando maior concentração a partir do íleo terminal, local em que se formam as placas de Peyer. O número e o tamanho das placas de Peyer aumentam progressivamente durante a vida fetal, porém, nos 3 primeiros anos de vida ocorre um crescimento mais rápido. Na puberdade o aumento continua a ocorrer, porém, em menor escala, e após esse período, há um progressivo declínio das placas de Peyer (Figura 1).

  Figura 1- Visão de uma placa de Peyer em microscopia óptica comum, médio aumento, localizada na lâmina própria da mucosa ileal.

Fisiopatologia

A patogênese da HNL é desconhecida, mas está comumente relacionada a precursoras de células plasmáticas, devido a um defeito de maturação durante o desenvolvimento de linfócitos B, a fim de compensar o funcionamento inadequado do tecido linfoide intestinal.

A HNL pode estar associada a infecções por vírus, bactérias, infestações parasitárias (principalmente giardíase) e hipersensibilidade alimentar, assim como pode estar presente nos casos de Doença Inflamatória Intestinal, e também pode ser um fator de intussuscepção intestinal recorrente.

A HNL pode estar presente como causa de sangramento oculto do trato gastrointestinal, acarretando anemia ferropriva refratária a tratamento de reposição de ferro, porém sua prevalência ainda não foi estabelecida. Um estudo realizado por Lee et al, no qual foram investigadas 17 crianças com sangramento retal, estas apresentaram à videolaparoscopia as seguintes causas, a saber: 8 Divertículo de Meckel, 2 duplicações intestinais, 2 HNL, 1 enterite vascular e 4 exames normais.

Manifestações Clínicas

A HNL pode se manifestar clinicamente associada aos seguintes sinais e sintomas: diarreia, diarreia com sangue, sangramento retal, dor abdominal, palidez cutânea e anemia ferropriva resistente ao tratamento de reposição de Ferro.

Colón et al., em 1991, estudaram 147 crianças com diagnóstico de HNL, sendo 58% meninos, com idades que variaram de 3 meses a 16 anos. Neste grupo, 58% (85) dos pacientes apresentavam queixa de dor abdominal recorrente, dentro de um período que variava de 2 a 12 meses, com localização periumbilical, em aperto, sem irradiação, e que não cedia com as evacuações.

A presença de sangue nas fezes foi a segunda causa mais frequente, aparecendo em 32% (47) das crianças, sob distintas formas, tais como, desde laivos de sangue até mesmo sangue vermelho–vivo que podia ser de forma isolada ou às vezes misturados com muco, ao final das evacuações. Vale ressaltar que destas 47 crianças que apresentaram sangue nas fezes, 24 delas não se queixavam de dor abdominal.

Um outro estudo realizado por Penna et al, em 1993, ao investigar 14 crianças, cujas idades variaram entre 8 meses e 12 anos, foram observados os seguintes sintomas: enterorragia em 71,4%, diarreia em 35,7%, distensão abdominal em 14,2% e encoprese em 14,2% delas.

Diagnóstico

A suspeita diagnóstica baseia-se na história clínica dos pacientes e é confirmada por meio da utilização de investigação laboratorial subsidiária, cuja prioridade de realização deve obedecer aos critérios clínicos segundo o discernimento do profissional atuante em cada caso.

Estão disponíveis os seguintes testes diagnósticos: 

Exames laboratoriais:

Hemograma
Velocidade de Hemossedimentação
Ferro sérico
Ferritina sérica
Pesquisa de sangue oculto nas fezes
Pesquisa de parasitas nas fezes

Exame de Imagem:

O teste radiológico indicado é o enema opaco com a utilização da técnica do duplo contraste. Este exame permite visualizar uma falha de enchimento da mucosa colônica, devido à presença de imagens arredondadas e algumas umbilicadas, representadas como áreas hipertransparentes. As lesões podem ser segmentadas ou difusas que chegam a forrar toda a mucosa do colo (Figura 2).

Figura 2- Enema opaco de duplo contraste evidenciando formações umbilicadas com falha de preenchimento do contraste caracterizando os nódulos linfoides hiperplasiados.


Endoscopia Digestiva Alta e Colonoscopia:

A observação visual permite identificar lesões polipóides sésseis, com umbilicação central, diferenciando-as dos pólipos verdadeiros. As lesões caracterizam-se por pequenas tumorações, com áreas centrais pálidas ou com sangramento, cujo diâmetro varia entre 1 e 7 mm (Figuras 3-4).
 
 Figura 3- Visão endoscópica da mucosa ileal evidenciando os nódulos linfoides hiperplasiados.

Figura 4- Visão endoscópica mais detalhada dos nódulos linfoides hiperplasiados.

Cápsula endoscópica: está indicada para avaliação do íleo terminal, nos casos em que o acesso se mostra inacessível pelos aparelhos endoscópicos.

Histopatologia:

A investigação histopatológica em material obtido por biópsia reveste-se na mais importante ferramenta diagnóstica para caracterizar a existência da HNL.

O exame à microscopia óptica comum mostra folículos linfáticos hiperplásicos, com infiltração linfocitária perifolicular, centros germinativos aumentados em tamanho e com intensa atividade mitótica. Há alongamento dos folículos mucosos de células B devido à hiperplasia do centro folicular, e o revestimento intestinal epitelial não mostra alterações (Figuras 5-6).

Figura 5- Visão à microscopia óptica comum em aumento médio de vários nódulos linfoides localizados na lâmina própria da mucosa ileal.
  

Figura 6- Visão à microscopia óptica comum em grande aumento de vários nódulos linfoides localizados na lâmina própria da mucosa ileal.

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