Prólogo
Em um passado não muito remoto, mais
especificamente na década de 1980 (Fagundes Neto U, Viaro T e Patrício FRS.
Enteropatia induzida por intolerância às proteínas do leite de vaca e dasoja:
critérios diagnósticos. Revista Paulista de Medicina 105; 166-71, 1987)
publiquei um artigo a respeito da minha experiência sobre alergia Alimentar.
Naquela ocasião, em minha casuística aproximadamente 80% dos pacientes
apresentavam manifestações clínicas compatíveis com Síndrome de Má Absorção,
caracterizada por diarreia crônica, perda de peso, parada do ritmo de
crescimento e importante agravo do estado nutricional (Figuras 1-2-3-4-5).
Figura 1- Paciente portador de Enteropatia por Alergia Alimentar no momento da primeira consulta. Notar o agravo nutricional caracterizado por visível emagrecimento, hipotonia e hipotrofia da musculatura do abdome e dos membros inferiores.
Figura 1- Paciente portador de Enteropatia por Alergia Alimentar no momento da primeira consulta. Notar o agravo nutricional caracterizado por visível emagrecimento, hipotonia e hipotrofia da musculatura do abdome e dos membros inferiores.
Figura 2- Resultado dos testes de avaliação da função digestivo-absortiva no grupo de pacientes com Enteropatia por Alergia Alimentar evidenciando nítido comprometimento em relação aos valores normais.
Figura 3- Diferentes graus de atrofia vilositária nos pacientes portadores de Enteropatia por Alergia Alimentar inclusive alguns deles apresentando atrofia vilositária sub-total como mostrada na figura da biópsia do intestino delgado.
Figura 4- Evidente recuperação da função digestivo-absortiva e morfológica do intestino delgado após a introdução de dieta à base de fórmula de hidrolisado protéico extensivamente hidrolisada.
Figura 5- Paciente da figura 1 após a recuperação clínica e nutricional.
Os 20% restantes dos pacientes apresentavam manifestações de Colite, caracterizada por sangramento retal de maior ou menor monta, porém sem significativa repercussão sobre o estado nutricional. Entretanto, passadas aproximadamente 3 décadas, os casos de Alergia Alimentar com manifestação de Síndrome de Má Absorção praticamente desapareceram, por outro lado, emergiram de forma impressionante os casos de Colite. Qual a razão para que houvesse essa radical mudança no caráter clínico da Alergia Alimentar permanece sem uma clara resposta convincente. No entanto, sabe-se que uma vasta gama de enfermidades alérgicas e autoimunes vem sofrendo significativas modificações nas suas formas de apresentação, e ao que tudo indica, fenômenos epigenéticos (influência do meio ambiente sobre a carga genética) têm uma parcela bastante importante de responsabilidade nestas mudanças de comportamento, que estão sendo descritas em todas as partes do universo. Em consonância com as alterações observadas nas formas de apresentação da Alergia Alimentar passo a descrever um dos múltiplos aspectos interessantes desta entidade clínica, cuja incidência tem aumentado globalmente, ou seja, a apresentação de Colite Alérgica em 2 grupos familiares distintos de primos entre si, o que para mim evidencia mais uma nuance de caráter específico, ou seja, um significativo componente de herança genética envolvendo esta enfermidade.
Figura 3- Diferentes graus de atrofia vilositária nos pacientes portadores de Enteropatia por Alergia Alimentar inclusive alguns deles apresentando atrofia vilositária sub-total como mostrada na figura da biópsia do intestino delgado.
Figura 4- Evidente recuperação da função digestivo-absortiva e morfológica do intestino delgado após a introdução de dieta à base de fórmula de hidrolisado protéico extensivamente hidrolisada.
Figura 5- Paciente da figura 1 após a recuperação clínica e nutricional.
Os 20% restantes dos pacientes apresentavam manifestações de Colite, caracterizada por sangramento retal de maior ou menor monta, porém sem significativa repercussão sobre o estado nutricional. Entretanto, passadas aproximadamente 3 décadas, os casos de Alergia Alimentar com manifestação de Síndrome de Má Absorção praticamente desapareceram, por outro lado, emergiram de forma impressionante os casos de Colite. Qual a razão para que houvesse essa radical mudança no caráter clínico da Alergia Alimentar permanece sem uma clara resposta convincente. No entanto, sabe-se que uma vasta gama de enfermidades alérgicas e autoimunes vem sofrendo significativas modificações nas suas formas de apresentação, e ao que tudo indica, fenômenos epigenéticos (influência do meio ambiente sobre a carga genética) têm uma parcela bastante importante de responsabilidade nestas mudanças de comportamento, que estão sendo descritas em todas as partes do universo. Em consonância com as alterações observadas nas formas de apresentação da Alergia Alimentar passo a descrever um dos múltiplos aspectos interessantes desta entidade clínica, cuja incidência tem aumentado globalmente, ou seja, a apresentação de Colite Alérgica em 2 grupos familiares distintos de primos entre si, o que para mim evidencia mais uma nuance de caráter específico, ou seja, um significativo componente de herança genética envolvendo esta enfermidade.
Introdução
Colite é uma
designação genérica para caracterizar processos inflamatórios, de distintas
etiologias, que afeta o intestino grosso acarretando lesões microscópicas
características, não necessariamente associadas a alterações macroscópicas
(Figura 6) (1).
Figura 6- Biópsia retal caracterizando Colite, no caso por Alergia Alimentar, com solução de continuidade do epitélio retal, aumento significativo do infiltrado inflamatório na lâmina pr´pria, diminuição do conteudo de muco das glândulas crípticas e presença de abscesso críptico, pela presença de neutrófilos polimorfonucleares no interior da crípta.
As principais causas de colite na infância abrangem um grupo heterogêneo de etiologias, a saber: infecciosa, parasitária, alérgica, enfermidade inflamatória e enfermidade autoimune (2).
Figura 6- Biópsia retal caracterizando Colite, no caso por Alergia Alimentar, com solução de continuidade do epitélio retal, aumento significativo do infiltrado inflamatório na lâmina pr´pria, diminuição do conteudo de muco das glândulas crípticas e presença de abscesso críptico, pela presença de neutrófilos polimorfonucleares no interior da crípta.
As principais causas de colite na infância abrangem um grupo heterogêneo de etiologias, a saber: infecciosa, parasitária, alérgica, enfermidade inflamatória e enfermidade autoimune (2).
Alergia alimentar é uma reação adversa aos
alimentos mediada por mecanismos imunológicos, IgE mediados ou não. Colite
Alérgica, também denominada proctocolite eosinofílica induzida por alimentos (3),
é um tipo de alergia que pertence ao grupo de hipersensibilidade alimentar não
mediada por IgE. O mecanismo fisiopatológico ainda não foi totalmente
identificado, porém, sabe-se que envolve a presença de linfócitos CD8, bem como
linfócitos do tipo TH-2 e infiltrado eosinofílico em todas as camadas da mucosa
colônica (4). Além disso, a presença de células de memória circulantes
reveladas por testes positivos de transformação linfocítica sugere o
envolvimento de células T na patogênese desta entidade, associada à secreção de
fator de necrose tumoral α pelos linfócitos ativados (5).
O começo da
enfermidade se dá nos primeiros meses da vida, mais freqüentemente no primeiro semestre, sem provocar agravos de monta
sobre o estado nutricional (6), mas em
alguns casos devido à sensibilização intra-útero pode ocorrer manifestação
clínica dentro das primeiras semanas (7).
A manifestação clínica mais florida e frequente
é a ocorrência de cólicas, de intensidade variável, acompanhada de sangramento
retal misturado às fezes, na maioria das vezes sob a forma de diarréia
sanguinolenta e eliminação de quantidade significativa de muco (8). Por outro
lado, em algumas ocasiões o sangramento retal pode não ser macroscopicamente
visível. Usualmente, as lesões são circunscritas ao colon distal e a
colonoscopia revela mucosa hiperemiada, com a presença de múltiplas pequenas
ulcerações com grande fragilidade vascular e sangramento espontâneo à passagem
do colonoscópio (9). A análise histológica evidencia, na imensa maioria dos
casos, infiltração eosinofílica, com mais de 20 esosinófilos por campo de
grande aumento, a qual pode atingir todas as camadas da mucosa colônica,
inclusive o epitélio superficial, podendo também haver a presença de abscessos
crípticos e hiperplasia nodular linfóide (10,11).
No presente trabalho relatamos casos de colite
alérgica em lactentes, primos entre si, pertencentes a 2 grupos familiares
distintos.
Casuística e Métodos
Foram
estudados 5 lactentes menores de 6 meses de idade, média de 4 meses, 3 do sexo
masculino, pertencentes a 2 grupos familiares distintos (Gráficos 1 e 2), encaminhados
ao Instituto de Gastroenterologia Pediátrica de São Paulo para investigação de
queixa de diarréia sanguinolenta e respectivo seguimento obedecendo protocolo
de investigação clínica previamente estabelecido.
A avaliação clínica inicial
foi realizada sempre pelo mesmo profissional na qual inclua a obtenção da
história e a realização do exame físico, bem como os dados antropométricos de
peso e comprimento. O acompanhamento clínico de longo prazo foi realizado pelos
profissionais.
Testes de Investigação Diagnóstica
Os pacientes foram submetidos à seguinte
investigação diagnóstica:
1-
Hemograma;
2- Cultura de fezes para pesquisa de agentes enteropatogênicos; 3-
Parasitológico de fezes; 4- Retoscopia ou Colonoscopia; 5- Biópsia retal
Avaliação da Morfologia da Biópsia Retal
A avaliação da morfologia da mucosa retal foi
realizada de acordo com os critérios de Diaz e cols. (12), a saber: os
fragmentos de tecido foram submergidos em solução de formalina 10% e, posteriormente,
incluídos em parafina e corados com a técnica da hematoxilina-eosina. Foram
avaliados os seguintes elementos microscópicos: epitélio superficial,
arquitetura das glândulas crípticas, infiltrado celular da lâmina própria e
nódulos linfóides. Foi realizada a contagem de eosinófilos para cada camada da
mucosa retal de acordo com os critérios de Winter e cols. (13).
Critérios Diagnósticos de Alergia ao Leite de
Vaca
O diagnóstico de colite alérgica foi caracterizado
clínica e histologicamente de acordo com os critérios de Walker Smith (14) e Fiocchi
e cols. (15), a saber:
1- Presença de sangramento retal em um lactente
com desenvolvimento pondero-estatural adequado;
2- Exclusão de causas infecciosas de colite;
3- Desaparecimento dos sintomas após eliminação
do leite de vaca e derivados da dieta da criança e/ou da mãe.
Foi obtido consentimento por escrito dos pais
para a realização dos exames.
Referências Bibliográficas
1- Lloyd-Still JD, Green OC. Clinical scoring system for chronic
inflammatory bowel disease in children. Dig Dis Sci 1979; 24: 620-4.
2- Grand R, Homer D. Inflammatory bowel disease in childhood
and adolescence. Ped Clin
North Am 1975; 22: 835-50.
3- Lake AM.
Food-Induced Eosinophilic Proctocolitis. J Pediatr Gastroenterol Nutr 2000; 30:
58-60.
4- Eigenmann PA. Mechanisms of food allergy. Pediatr Allergy Immunol
2009; 20: 5-11.
5-
Chung HL, Hwang JB, Park JJ,
Kim SG. Expression of transforming growth factor β1, transforming growth factor
type I and II receptors, and TNF-α in the mucosa of the small intestine in
infants with food protein–induced enterocolitis syndrome. J All Clin Immunol
2002; 109: 150-4.
6-
Lake AM. The Polymorph in red is no
Lady. J Ped Gastroenterol Nutr 1994; 19:4-6.
7-
Faber MR, Rieu P, Semmekrot BA, Van Krieken JH, Tolboom JJ, Draaisma JM –
Allergic colitis presenting with the first hours of premature life. Acta Paediatrica
2005; 94: 1514-1515.
8-
Behjati S, Zilbauer M, Heuschkel R, Philips A, Salvestrini C, Torrente F, Bates AW. Defining
Eosinophilic Colitis in children: Insights from a retrospective case series. J
Pediatr Gastroenterol Nutr 2009; 49:
208-15.
9-
Ozde RD, Bines J, Leichtner AM, Goldman H, Antonioli DA. Allergic proctocolitis in infants: A prospective clinicopathologic
biopsy study. Human Pathol 1993; 24: 668-74.
10-
Collins MH. Histopathology associated with eosinophilic gastrointestinal
diseases. Immunol Allergy Clin N Am 2009; 29: 109–117.
11- Turunen S, Karttunen TJ, Kokkenen
J. Lymphoid nodular hiperplasia and cow’s milk hypersensitivity in children
with chronic constipation. J Pediatr 2004; 145: 606-11.
12-
Diaz NJ, Patricio FS, Fagundes-Neto U. Allergic colitis: clinical and
morphological aspects in infants with rectal bleeding. Arq Gastroenterol 2002;
39:260-7.
13- Winter HS, Antonioli DA, Fukagawa
N, Marcial M, Goldman H. Allergy-related proctocolitis in infants: diagnostic
usefulness of rectal biopsy. Mod Pathol 1990; 3:5-10.
14- Walker-Smith JA. Diagnostic criteria for
gastrointestinal food allergy in childhood. Clin Exp Allergy 1995; 25:20-2.
15- Fiocchi A, Brozek J, Schunemann H e cols. World Allergy
Organization: diagnosis and rationale for action against cow’s milk allergy
guidelines – Pediatr Allergy Immunol 2010; 21 (Suppl 21): 1-125.
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