segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Esofagite Eosinofílica: Manejo Dietético por meio da utilização de Dietas de Eliminação (1)

Introdução

Está definitivamente estabelecido que tem ocorrido um significativo aumento no diagnóstico da Esofagite Eosinofílica (EE) em todo oglobo terrestre com exceção do continente africano. As manifestações clínicas apresentam grande variabilidade que incluem desde aversão alimentar e desnutrição em lactentes e pré-escolares, a vômitos crônicos e dor abdominal em escolares, e dor abdominal, disfagia e impactação dos alimentos em adolescentes. Complicações, tais como estenose esofágica, tem sido descritas em crianças e adultos. Fibrose sub-epitelial esofágica, uma precursora da estenose, que pode afetar de forma significativa a qualidade de vida dos pacientes com EE, tem sido descrita em crianças com disfagia. O mecanismo da fibrose sub-epitelial está diretamente relacionado com a eosinofilia e, portanto, a eliminação desta complicação pode resultar em sua reversão. Recentes evidências obtidas a partir de pacientes que apresentam EE de longa duração demonstram que a persistência dos sintomas, a despeito da resolução da inflamação esofágica aguda por meio do uso de drogas anti-inflamatórias, ocorre devido a uma deficiência funcional do esôfago em virtude da existência de um prolongado período de inflamação não anteriormente detectado. Por esta razão, a identificação e a eliminação de antígenos alimentares específicos que provocam inflamação da mucosa esofágica oferecem uma ótima perspectiva para a manutenção sustentada da remissão histológica.

No número de Agosto do Journal of Pediatric Gastroenterology and Nutrition (JPGN) de 2011 há um excelente artigo “Invited Commentary” escrito por Philip E. Putman, do Children’s Hospital Medical Center, Cincinnati, Ohio sobre este tema tão atual e que desperta enorme interesse (JPGN 53; 129-30). A seguir reproduzo os principais tópicos abordados pelo autor.

Artigo

Nesta última década tem sido reconhecido um significativo aumento da prevalência da EE tanto na população adulta quanto na pediátrica. Inicialmente, uma série de casuísticas descreveram as manifestações clínicas, endoscópicas e histológicas desta entidade clínica. Em 2007, um grupo multidisciplinar de experts (Gastroenterology 2007; 133: 1342-63) elaborou o primeiro consenso de recomendações para o diagnóstico e tratamento da EE, o qual foi atualizado em Abril de 2011 (J Allergy Clin Immunol). Esses documentos oferecem informações detalhadas a respeito do diagnóstico e das opções do manejo terapêutico, mas não fornecem um algoritmo para o manejo individualizado para pacientes em longo prazo.

O conceito diagnóstico atual é que EE trata-se de um processo inflamatório crônico imunologicamente mediado, restrito ao esôfago, o qual na maioria das vezes é desencadeado pela exposição a antígenos alimentares. A exclusão destes antígenos alimentares agressores resulta na remissão da enfermidade, e a reexposição acarreta sua recidiva. Considerando-se que o número e a natureza dos alergenos da dieta desencadeadores da EE apresentam uma grande variabilidade entre os diferentes indivíduos, não é possível propor um tipo padrão de dieta que atenda à todas as necessidades, de tal forma que possa de uma maneira geral, eliminar os antígenos agressores e, ao mesmo tempo, assegurar uma nutrição adequada para atender aos requerimentos dietéticos necessários para todas as idades. A substituição da dieta rotineira pela utilização de uma fórmula não alergênica à base de mistura de aminoácidos atende este desafio, porém seu alto custo, sua baixa palatabilidade, as consequentes dificuldades psicossociais, a cronicidade do processo patológico e a frequente necessidade da utilização de alimentação por sonda naso-gástrica representam grandes desafios para as famílias dos respectivos pacientes.

Uma alternativa para contornar o problema do uso das dietas alimentares no manejo dietético da EE foi a proposta da então denominanda "dieta de eliminação de seis alimentos". Em 2006, Kagalwalla e cols. (Clin Gastroenterol Hepatol 2006; 4: 1097-102), estudaram o impacto desta dieta, a qual eliminava simultaneamente os seguintes alimentos: leite, ovo, trigo, soja, peixe/frutos do mar e amêndoas, sem levar em consideração os resultados dos tradicionais testes alérgicos. Aproximadamente 75% das crianças apresentaram remissão da EE durante o período em que estes alergenos foram evitados. A vantagem gritante deste tipo de dieta sobre a dieta elementar se dá pela preservação de uma porção significativa da dieta rotineira, a qual pode ser completada nutricionalmente quando apropriadamente manipulada por nutricionistas. Caso ocorra o sucesso terapêutico fica bem estabelecido que os alimentos agressores estão presentes no grupo de alergenos alimentares supra citados. Para se saber quais antígenos são os verdadeiros provocadores da inflamação deve-se então reintroduzí-los na dieta de forma individual seguindo-se pela realização de biópsias endoscópicas, ao menos que uma recidiva dos sintomas seja tão notória que requeira a imediata eliminação deste alergeno da dieta. Desta forma um número relativamente pequeno de endoscopias seria necessário para completar o processo desde a retirada inicial dos alergenos da dieta até ser alcançada uma dieta definitivamente aceitável, o que contrastaria com um número de biópsias endoscópicas que seriam necessárias caso toda a alimentação rotineira fosse suspensa durante a utilização da dieta elementar.

Kagalwalla e cols. (J Pediatr Gastroenterol Nutr 2011; 53: 145-9), estabeleceram a frequência na qual alergenos isoladamente foram responsáveis pela inflamação eosinofílica após a reintrodução dos mesmos. As características clínicas dos pacientes estão descritas na Tabela 1.
Antígenos alimentares únicos foram identificados em 26 (72%), 2 alergenos em 3 (8%) e 3 alergenos em 3 pacientes (8%), como está demostrado na Figura 1.
Os antígenos alimentares mais comumente identificados foram: leite de vaca 25/34 (74%), trigo 8/31 (26%), ovo 4/24 (17%), soja 3/29 (10%) e amendoim 1/17 (6%) (Figura 2).

 O leite de vaca foi o alimento que mais frequentemente causou EE. Em relação aos outros 4 alimentos, o leite de vaca mostrou-se 8 vezes mais causador de EE em comparação com o trigo, 14 vezes mais frequente em comparação com o ovo, 24 vezes mais frequente em comparação com a soja e 43 vezes em comparação com o amendoim, conforme está demonstrado na Tabela 2.

O fato de que os pacientes tivessem reagido a 2 ou mais alergenos alimentares é a razão que justifica a remoção de todos os 6 alimentos alergênicos simultaneamente no início do tratamento dietético. Caso esses alimentos tivessem sido eliminados um a um, nenhuma das crianças que se mostrou intolerante a mais de um alergeno, apresentaria remissão dos sintomas porque haveria sempre, embora de forma alternada, a presença de pelo menos um alimento alergênico na sua dieta. Em conclusão a reintrodução seriada de alimentos de forma individualizada, após a indução da remissão histológica com a eliminação dos 6 alimentos supostamente alergênicos da dieta, permitiu identificar o alergeno alimentar específico causador da EE.

No nosso próximo encontro continuarei a expor este interessante artigo sobre tão relevante tema, a EE.

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