quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Refluxo Gastroesofágico e Doença do Refluxo Gastroesofágico: como estabelecer o diagnóstico diferencial (4)

Complicações da Doença do Refluxo gastro-Esofágico

Neste capítulo abordaremos as principais complicações da Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRG) (vide figura 1 para visualizar o aspecto normal da mucosa do esôfago).
Figura 1- Visualização endoscópica da mucosa do esôfago de aspecto normal.

A mais frequente complicação da DRG é sem dúvida a Esofagite de Refluxo (ER), ou seja, a inflamação da mucosa do esôfago causada pela presença constante de material ácido proveniente do estômago e que leva à sensação de queimação retro-esternal. Esta inflamação pode apresentar diferentes nuances de intensidade, as quais dependem de uma série de circunstâncias, tais como, frequência e tempo de duração dos episódios de refluxo, tempo de existência dos sintomas e mesmo da sensibilidade da mucosa do esôfago à exposição ácida (o que é uma variação individual). A evidência mais direta da existência da ER se dá por meio da realização da endoscopia digestiva alta, posto que durante a execução deste procedimento o examinador, já pode de imediato, identificar através do equipamento óptico as mais diversas graduações de intensidade do processo inflamatório, o qual se caracteriza pela presença de erosões na mucosa esofágica (vide figuras 2 e 3). Há, porém, um debate entre os diferentes especialistas da área quanto à necessidade ou não da realização do exame histológico obtido por biópsia para se estabelecer o diagnóstico de certeza da ER.
Figura 2- Visualização endoscópica da mucosa do esôfago evidenciando esofagite de moderada intensidade.
Nos adultos, a frequência e a intensidade dos sintomas da DRG apresentam, de uma maneira geral, boa correlação com a gravidade da lesão esofágica. Na Pediatria, em um estudo realizado no Canadá, em 2006, no qual foram avaliadas 127 crianças e adolescentes de 1 a 17 anos de idade que sofriam da DRG, e que foram submetidos à avaliação endoscópica, a prevalência e a intensidade de anorexia e/ou recusa alimentar foi significantemente maior naqueles que apresentavam ER em relação a aqueles que não apresentavam lesão da mucosa esofágica. Por outro lado, estudo realizado nos EUA, em 2005, em lactentes (portanto, em crianças menores de 1 ano de idade) as manifestações sintomáticas não foram suficientemente válidas para se prognosticar a existência de ER. Desta forma, o que se pode afirmar, no presente estágio dos conhecimentos, é que não é possivel prognosticar com maior grau de acurácia a intensidade da lesão da mucosa esofágica em pacientes pediátricos quando apenas nos baseamos nos sintomas.


Figura 3- Visualização endoscópica da mucosa do esôfago evidenciando esofagite de intensa gravidade.
Em uma minoria dos casos a DRG pode acarretar uma diminuição do lúmen do esôfago (estreitamento do conduto esofágico), a qual se denomina Estenose Esofágica (vide figura 4). Este estreitamento, que se dá por edema e pela substituição de tecido esofágico por tecido fibroso (portanto inelástico) impede, em um estágio inicial, a passagem de alimentos sólidos causando disfagia persistente. Disfagia progressiva pode levar inclusive à dificuldade de deglutir líquidos o que sem dúvida é um sinal de alarme e que deve ser cuidado com urgência. De qualquer forma, o estreitamento esofágico provocado pela DRG deve ser distinguido de outras possíveis causas, tais como por exemplo, ingestão de soluções cáusticas, ou mesmo, uma outra doença recentemente descrita denominada Esofagite Eosinofílica. Portanto, nestes casos impõe-se a realização de endoscopia com estudo histológico da mucosa do esôfago, obtida por biópsia, para se determinar a causa do estreitamento.

Figura 4- Visualização endoscópica da mucosa do esôfago que revela um evidente estreitamento da sua luz (estenose esofágica).

Outra possível complicação da ER é o que se denomina esôfago de Barret (vide figura 5). Embora esta complicação seja muito menos frequente em pacientes pediátricos em relação ao que se observa em pacientes adultos, ela soe ocorrer em crianças e adolescentes. Por exemplo, em um estudo realizado no Canadá, em 2007, metaplasia esofágica (presença de células de outro órgão na mucosa esofágica; neste caso presença de células características do estômago ou intestino delgado) foi observada em 10% das crianças que sofriam da DRG grave, e, em metade delas ocorreu a presença de células caliciformes (estas células, que são produtoras de muco, o qual recobre a superfície da mucosa intestinal para lhe conferir proteção contra as agressões do meio ambiente, são típicas da mucosa do intestino), portanto, tipicamente do intestino delgado, o que caracteriza de forma inconteste a existência de esôfago de Barret. É de fundamental importância frisar que esôfago de Barret é uma lesão pré-cancerosa, e, portanto, deve ser tratada com total atenção.


Figura 5- Visualização endoscópica da mucosa do esôfago evidencaindo a existência de esôfago de Barret (lesão pré-cancerosa).
No nosso próximo encontro iremos abordar os mais recentes e avançados métodos diagnósticos do Refluxo Gastroesofágico.

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